Não sei exactamente porquê mas tenho um enorme medo a cães, e o meu Faísca sabia disso, abusava como cão esperto que era. Nunca me sinto confortável ao pé de um, grande ou pequeno, com aspecto mansinho ou mais bravo.
Ontem à noite, no cumprimento da responsável e estimulante tarefa de levar o lixo ao contentor, vejo no meu percurso um cão, um cão grande. Ao vê-lo, ainda a uns metros, pensei logo em recuar mas, inspirado certamente pela coragem que está no património genético dos portugueses e que nos predispõe para os grandes feitos, segui o meu caminho. O cão grande, já perto, olhou para mim com um ar tão triste que até me doeu, passou apressado para o outro lado da estrada e correu assustado. De tão triste, não percebeu que me fez mais medo do que alguma vez eu lhe faria a ele.
Tenho a sensação de que a nossa vida contém cada vez mais episódios deste tipo. Gente triste, assustada, que foge de outra gente tão assustada quanto a primeira. Falta perceber se estamos tristes porque temos medo ou se, pelo contrário, temos medo porque estamos tristes. Por vezes ainda fica mais estranho, para combater o medo, maltratamos. Quase sempre os mais vulneráveis, os miúdos, por exemplo.
1 comentário:
Este texto é uma real pedrada no charco. Arrisco dizer que, é uma realidade dolorosamente nacional. Aqui, neste cantinho, onde as Marias e os Maneis do Alentejo ao Douro, abriam as portas de casa como se à própria familia, hoje ignoramo-nos, tememo-nos e vivemos assustadoramente sós.
Enviar um comentário