sexta-feira, 19 de agosto de 2011

OS LIMITES NO COMPORTAMENTO NÃO TÊM NADA DE "TEORICAMENTE ESTRANHO"

O Presidente da República interrompeu as suas férias para nos dizer que a proposta de fixar limites constitucionais ao défice orçamental, agora na agenda internacional, é “teoricamente estranha”, “reflecte uma enorme desconfiança dos decisores políticos em relação à sua própria capacidade de conduzir políticas orçamentais correctas”.
Eu sei, sou estúpido, é a economia. No entanto, dada a inimputabilidade que advém da estupidez, uma notas breves. Neste tempo em que a crise económica e as suas consequências mais graves, sobretudo o desemprego, cortes salariais e aumento de impostos se abatem sobre as classes menos favorecidas, aparecem de todo o lado as vozes a clamar pelos sacrifícios e a identificar as medidas redentoras. A crise resultou, parece, de modelos errados e desregulados de desenvolvimento, do endeusamento do mercado, da ganância especulativa dos mercados financeiros com a complacência negligente, cúmplice ou incompetente das diversas entidades de supervisão, nacionais ou internacionais.
Neste contexto, acho de um atrevimento despudorado as opiniões de economistas, ex-ministros das finanças, empresários de "visão" e outros iluminados que tendo sido parte do problema durante décadas, como o caso do Professor Cavaco Silva, vêm agora para a praça pública diariamente exigir sacrifícios e propor medidas que, obviamente, não os atingirão, sabendo sempre o que deve ser feito.
Quando Cavaco Silva refere a desconfiança dos decisores face à sua própria capacidade de decidir bem, podemos imaginar a desconfiança que nós sentimos face a essa mesma capacidade. É que a maioria de nós é justamente quem mais sofre com as consequências dessas decisões.
Neste cenário, estabelecer limites ao défice por via da constituição, não tem nada de “teoricamente estranho”, antes pelo contrário, é a coisa mais prática que se pode pensar. Estabelecemos as regras para as actividades dos miúdos, eles não podem fazer o que lhes passa pela cabeça, como são novinhos e inexperientes, cabe-nos a nós esse papel orientador. Também os políticos, economistas e outros decisores não podem deixar-se entregues a si próprios e às suas ideias.
O resultado está a vista. E, lamentavelmente, ainda não vimos tudo.

3 comentários:

anabela disse...

O génio da banalidade como Saramago o classificou e muito bem no meu ponto de vista, descobriu o facebook e agora acha-se muito modernaço, o mais perigoso é que pensa que pode escrever tudo.

Manuel de Cascais disse...

Caro Zé Morgado, sou Economista, provavelmente de ideias políticas diferentes das suas, mas decidi, com sua vénia, partilhar o seu corajoso e frontal texto no FB, porque não posso deixar de concordar. Cumprimentos

Zé Morgado disse...

Meu caro Manuel de Cascais,
As ideias diferentes, em política ou noutra matéria, desde que nos limites da ética e dos direitos humanos são, por princípio, uma riqueza.