domingo, 8 de dezembro de 2019

DO DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOS DOCENTES


Gostei de ler o texto de João Ruivo, “O que pensamos e o que fazemos”.
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Porém, o "processo de cretinização técnico-burocrático" do trabalho docente permanece, no substancial, inalterável. Resultado: a lucidez demasiado disciplinar e especializada conduz, invariavelmente, à cegueira no que respeita à apreciação do global, do geral e da diferença.
Neste processo evolutivo, é certo que a ciência substituiu a religião quanto à construção do discurso pedagógico. Todavia, novas formas de misticismo afloraram sempre que, no terreno institucional, se procedeu à aceitação dos poderes, aliados aos saberes, como meios únicos de legitimação de uns e dos outros.
Para que a Escola entre numa via de transformação positiva, revela-se essencial aceitar alguns desafios. Desde logo, importa nivelar o estatuto da "pedagogia oficial" com o do "conhecimento prático" dos docentes. Depois, exige-se o rápido reconhecimento da maioridade dos profissionais do ensino. Reconhecimento que propicie a conquista da autonomia para pensar o próprio pensamento, autonomia para reflectir sobre o conhecimento elaborado, autonomia para construir novo pensamento com base no conhecimento e na maturação da própria acção docente.
No fundo, encontramo-nos perante um desafio, lançado aos "práticos", para que conquistem, dentro das escolas, todas as possibilidades que lhes permitam a elaboração de conhecimento, através do qual sustentem e teorizem essa mesma prática.
(…)
De facto, as mudanças rápidas e significativas nas sociedades actuais têm também implicações na educação e nas escolas, na sua organização, autonomia e direcção, no que ensinam (educam), como ensinam (educam), a quem ensinam (educam), como avaliam, etc. etc.
Neste contexto de permanente movimento também se coloca a questão do desenvolvimento profissional dos docentes.
Na sequência das mudanças legislativas mais recentes designadamente no que se refere ao currículo e flexibilidade curricular e do novo regime da educação inclusiva parece viver-se mais um ciclo de formação desencadeado pela tutela e em assente, mais uma vez na “inovação”, numa “nova escola” na “mudança de paradigma" e, obviamente, no que isto exige de novas práticas e até, parecem pensar alguns, porque não novos professores. Bom, mas aqui não há volta a dar, são os que temos e, portanto, toca a formar.
Por razões óbvias não me pronuncio sobre a qualidade da imensa oferta disponível, não deixo, no entanto, de me surpreender com o surgimento de tantos especialistas e na produção de tantas e tão diversificadas ferramentas de criação de “novas práticas”, “novos olhares”, “novas abordagens”, “novas …”.
Temo o risco de uma intoxicação séria que complique e burocratize ainda mais o já instável clima escolar na linha do que João Ruivo afirma.
Acresce que também fora do âmbito das iniciativas do ME parte do que sido feito, apesar do excelente trabalho de alguns centros de formação, escolas e mesmo municípios, parece ser de natureza avulsa, dependente dos financiamentos e, sobretudo, associada ao “modismo”, ao que parece estar na moda ou "promovida" no âmbito da “inovação” ou no âmbito de uma “mudança de paradigma”, ou da criação de uma "nova escola", etc.
Por outro lado, a forma como tem vindo a ser considerado, ou não, o impacto da valorização profissional na carreira dos docentes ou mesmo um movimento de “desprofissionalização”, também contribui para algum trajecto errático neste contexto.
Devo afirmar que desde há muitos anos colaboro em inúmeras iniciativas no âmbito da formação de professores em diferentes formatos e duração pelo que me sinto envolvido directamente nesta questão e certamente também comprometido com as questões que aqui coloco. 
Acresce ainda que no que conheço melhor, o universo da chamada educação inclusiva, e como já repetidamente afirmei, temos o hábito de encharcar a legislação em doutrina quando deveria centrar-se basicamente em princípios, procedimentos, recursos e regulação. Assim, prolifera a oferta de pacotes de formação sobre o desenho universal da aprendizagem, a abordagem multinível e outros modelos que, não passam disso mesmo, modelos pelo que não deveriam estar na legislação. Se verificarmos nos canais mais habitualmente usados para a sua divulgação, a oferta formativa, organizada por problemáticas de alunos, por ferramentas didácticas, por modelos ou programas de intervenção professores ou famílias, a oferta é inesgotável e muitas vezes “vendida” como a solução. Parece-me claro que a dispersão e quantidade da oferta, só por si, não é garante da sua qualidade.
A teoria, os conceitos, as metodologias e didácticas fazem parte da formação inicial e entram na formação contínua como ferramentas de resposta e de actualização da mesma aos problemas e necessidades dos docentes que, naturalmente, vão sofrendo ajustamentos.
Voltando à minha experiência já longa na formação de docentes, sinto que o que de mais estimulante e, desculpem a imodéstia, mais positivo me pareceu, foi trabalhar com professores de uma escola ou agrupamento durante algum tempo, um ano lectivo, a propósito de algumas problemáticas emergentes da sua prática e reflectir sobre como tentar lidar com ela, com o muito que já sabemos e é feito e com o muito que podemos vir a experimentar, avaliar e saber.
Parece-me claramente necessária uma reflexão global sobre o desenvolvimento profissional nos seus diferentes aspectos.

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