quarta-feira, 28 de agosto de 2019

DO DESPORTO ESCOLAR


O ME decidiu reforçar o número de créditos horários para que possa ser promovida pelas escolas no incremento da actividade desportiva relativa a diversas modalidades. A decisão traduz-se 200 horas de aulas por semana a usar na prática e desenvolvimento do desporto escolar.
Espero que esta iniciativa seja regulada e avaliada de modo a potenciar o seu potencial impacto pois a necessidade é óbvia. O conhecimento de muitas iniciativas neste universo, o Programa de Promoção do Sucesso Educativo por exemplo, sugere que com demasiada frequência o investimento nestes programas dificilmente terá impacto significativo e consistente no sucesso educativo e algumas das iniciativas acabam a compôr as revistas dos municípios.
Assim, sendo optimista e acreditando na existência de dispositivos de avaliação e regulação do que é e será desenvolvido, julgo que o apoio ao desenvolvimento da prática desportiva no âmbito da actividade escolar é essencial como essencial é também que a actividade desportiva seja um instrumento de educação inclusiva.
Retomo notas já expressas a propósito da divulgação no início de Fevereiro da posição do Conselho Nacional das Associações de Professores e de Profissionais de Educação Física alertando para que boa parte dos alunos do 1 º ciclo, por razões de natureza diversa e apesar de algumas boas práticas e iniciativas, não realiza regularmente actividades de educação física ou desporto.
De entre as múltiplas referências ao comportamento de crianças e adolescentes, uma das mais frequentes talvez seja “Estas crianças não páram” ou algo no mesmo sentido. Na verdade, apesar da frequência da sua utilização, parece-me claramente desajustada pois, de facto, as crianças não se mexem e, também por isso provavelmente ... "não páram".
Segundo o Relatório “Health at a Glance: Europe 2016” em Portugal mais de uma em cada quatro crianças tem excesso de peso. Nas raparigas ultrapassa os 30% e nos rapazes temos 25%.
Acresce que no que respeita à actividade física e considerando a recomendação da OMS de uma hora diária de actividade física aos 11 anos só 16% das raparigas e 26% dos rapazes cumprem e aos 15 anos temos 5% das raparigas e 18% dos rapazes.
Creio ainda de sublinhar que estudos realizados em Portugal mostram que a obesidade infantil, um dos valores mais altos da UE, é já um problema de saúde pública, implicando por exemplo o disparar de casos de diabete tipo II em crianças.
Apesar de parecer uma birra ou teimosia acho sempre importante sublinhar a importância que deve merecer a questão dos hábitos alimentares e o combate ao sedentarismo, sobretudo nos mais novos.
Ainda no que respeita à actividade física, um trabalho da Universidade de Coimbra divulgado em 2013 sublinhava, mais uma vez, o impacto que o sedentarismo tem na saúde das crianças. Este estudo envolveu 17424 crianças entre os 3 e os 11 anos e mostrou a forte relação entre hábitos fortemente sedentários, ver televisão por exemplo, e obesidade infantil e óbvias consequências na saúde e bem-estar dos miúdos.
Um outro trabalho de 2012 da Faculdade de Motricidade Humana envolvendo cerca de 3000 alunos que evidenciava o efeito positivo da actividade física no rendimento escolar para além dos benefícios óbvios na saúde.
De registar ainda que apesar da simpatia do clima somos um dos países com menor prática de actividades de ar livre.
De facto, o quotidiano de crianças e adolescentes está excessivamente preenchido com actividades que solicitam pouca actividade física, numa escola a tempo inteiro em que, apesar de boas práticas que existem, passam horas sem fim em salas com actividades “fantásticas” sempre sentados ou, quase, parados.
Em casa, o cenário é do mesmo tipo só que em frente de um ecrã. Os estudos comprovam que o nível de actividade física de crianças e adolescentes está francamente abaixo do desejável para a sua faixa etária sendo, aliás, mais satisfatório em adultos e também baixo para os idosos. Por outro lado, este é o equívoco a que me referia, instalou-se a “ideia” de que as crianças e adolescentes não páram, são muito activas, até mesmo “hiperactivas” pelo que os desejos de muitos pais e professores é que estejam mais “calmas”, mais “sossegadas” e não tão “activas”, às vezes até se medicam para que se aquietem.
Por isso e de uma vez por todas, que crianças e adolescentes não parem, que as não envolvam e incentivem a actividade sedentária tantas horas por dia e que ajudemos todos pais e comunidades a construir alternativas que sejam atractivas para os tempos dos mais novos.
É uma questão de saúde, física e mental, para crianças e adolescentes e, também, para os adultos que lidam com eles.

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