sábado, 24 de agosto de 2019

DAS ESCOLAS ENCERRADAS


No DN de hoje encontra-se um trabalho sobre a evolução do número de escolas em nos últimos anos. Considerando, educação pré-escolar, 1º, 2º e 3º ciclos do ensino básico e o secundário, com base em dados do Relatório “Educação em Números 2019”, da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, desde 2000/2001 até 2017/2018 foram encerrados 8697 estabelecimentos, de 14 533 passaram para 5836.
A justificação é sempre atribuída à quebra da natalidade mas parece-me caro que importa considerar as opções em matéria de políticas educativas. Aliás, o número de estabelecimentos de ensino particular tem subido ainda que ligeiramente, o que é interessante considerar. Algumas notas.
Muitas das questões que se colocam em educação, como noutras áreas, independentemente da reflexão actual, solicitam algum enquadramento histórico que nos ajudem a melhor entender o quadro temos no momento. Durante décadas de Estado Novo, tivemos um país ruralizado e subdesenvolvido. Em termos educativos e com a escolaridade obrigatória a ideia foi “levar uma escola onde houvesse uma criança”. Tal entendimento minimizava a mobilidade e a abertura sempre evitadas. No entanto, como é sabido, os movimentos migratórios e emigratórios explodiram e o interior entrou em processo de desertificação o que, em conjunto com a decisão de política educativa referida acima, criou um universo de milhares de escolas, sobretudo no 1º ciclo, com pouquíssimos alunos. Como se torna evidente e nem discutindo os custos de funcionamento e manutenção de um sistema que admite escolas com 2, 3 ou 5 alunos, deve colocar-se a questão se tal sistema favorece a função e papel social e formativo da escola. Creio que não e a experiência e os estudos revelam isso mesmo. Parece pois ajustada a decisão de em muitas comunidades proceder a uma reorganização da rede.
É também verdade que muitas vezes se afirma que a “morte da escola é a morte da aldeia”. No entanto, creio que será, pelo menos de considerar, que os modelos de desenvolvimento económico e social promovem a litoralização e desertificação do interior. Apostas políticas erradas não contrariam este processo, antes pelo contrário, promovem-no fechando os equipamentos sociais, incluindo as escolas, uma das formas evidentes de fixação das pessoas. Cria-se assim um ciclo sem fim, as pessoas partem, fecham-se equipamentos, as pessoas não voltam ou continuam a partir.
A este movimento de reorganização da rede escolar e fechamento de escolas associou-se uam outra opção política de risco, a construção dos centros educativos e da constituição de mega-agrupamentos, que criou situações em que as dimensões e características são fortemente comprometedoras da qualidade, com potenciais riscos e consequências conhecidos e estudados, os mega-agrupamentos tendem a produzir mega-problemas.
É também verdade que menos escolas e agrupamentos e direcções unipessoais tornam também mais fácil o controlo político de um sistema ainda altamente centralizado apesar da retórica de autonomia. Este controlo é, naturalmente, uma tentação de sempre de qualquer poder.
De há muito que se sabe que um dos factores mais contributivos para o insucesso, absentismo e problemas de disciplina escolar é o efectivo de escola. Não é certamente por acaso, ou por desperdício de recursos, que os melhores sistemas educativos, lá vem a Finlândia outra vez, mas também os Estados Unidos ou o Reino Unido procurando a requalificação da sua educação, optam por estabelecimentos educativos que não ultrapassam a dimensão média de 500 alunos. Sabe-se, insisto, de há muito, que o efectivo de escola está mais associado aos problemas que o efectivo de turma, ou seja, simplificando, é pior ter escolas muito grandes que turmas muito grandes, dentro, obviamente dos limites razoáveis. É certo que o ME, sobretudo a partir de Maria de Lurdes Rodrigues e com Nuno Crato, fez o pleno, aumenta o número de alunos por escola e o número de alunos por turma o que leva à “dispensa” de professores. O processo de redução do número de alunos por turma foi iniciado e está em curso ainda que com alguma timidez.
É reconhecido que escolas muito grandes, com a presença de alunos com idades muito díspares, são potenciadoras do risco de insucesso escolar e exclusão, absentismo, problemas de indisciplina e outros problemas de natureza comportamental como bullying apesar do esforço de professores, técnicos, funcionários, alunos e pais. A este cenário ainda se junta com regularidade a insuficiência de recursos de diferentes tipologias.
Acresce que são conhecidos casos de distâncias grandes entre a residência dos miúdos e os centros escolares, levando que devido à difícil gestão dos transportes escolares, os miúdos passem tempos sem fim nos centros escolares, experiência que não é fácil, sobretudo para os miúdos mais pequenos.
Em síntese, parece-me razoável que algumas escolas, sobretudo do 1º ciclo, tenham sido encerradas mas o recurso a critérios burocratizados e administrativos, como a análise simples do número de alunos, levou a situações de sério compromisso da qualidade da educação e mesmo da qualidade de vida de muitos alunos.
Seria fundamental a coragem e a visão para outros caminhos até porque parece verificar-se alguma recuperação demográfica devida à subida na taxa de natalidade que desejamos confirmada e continuada, bem como a um aumento de crianças de famílias emigrantes.

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