Curiosamente, estamos em plenas
férias escolares e no JN encontra-se uma peça sobre algo que muitas vezes aqui
tenho abordado, o tempo que as crianças passam na escola.
De uma forma geral, os
participantes no trabalho entendem que o tempo passado na escola é excessivo e,
também consensualmente, as opiniões inclinam-se para a necessidade de
diversificar as actividades desenvolvidas durante o tempo passado na escola.
Sabemos como os estilos de vida
actuais colocam graves dificuldades às famílias para assegurarem a guarda das
crianças em horários não escolares. A resposta tem sido prolongar a estadia dos
miúdos nas instituições escolares alimentando o que considero um equívoco, o
estabelecimento de uma visão de “Escola a tempo inteiro” em vez de “Educação a
tempo inteiro”.
Para além da reflexão sobre o que
acontece nesse tempo e tal como se verifica noutros países, seria imperioso que
se alterassem aspectos como a organização do trabalho, verificada em muitos
países, que minimizassem as reais dificuldades das famílias recorrendo, por
exemplo e quando possível, a tele-trabalho ou à diferenciação nos horários de
trabalho que em alguns sectores e profissões é possível.
Acontece que de acordo com o que
está definido legalmente a estadia na escola dos alunos no ensino básico pode atingir bem mais de 40 horas semanais se os pais necessitarem,
considerando horário curricular, AEC e componente de apoio à família.
É preciso o um esforço enorme, equipamentos e recursos humanos qualificados para que não se corra o risco de transformar a
escola numa “overdose” asfixiante para muitos miúdos.
É verdade que existem boas
práticas neste universo mas também todos conhecemos situações em que existe a
dificuldade óbvia e esperada de encontrar recursos humanos com experiência e
formação em trabalho não curricular. Acresce que boa parte das escolas, como é
natural, têm os seus espaços estruturados (e por vezes saturados) sobretudo para salas de aula. Espaços
para prática de actividades desportivas ou de ar livre, expressivas,
biblioteca, auditórios, etc., etc., a existirem dificilmente poderão ser
suficientes para uma ocupação da população escolar alternativa à sala de aula. Esta questão é também relevante no que respeita à qualidade e adequação da resposta a alunos com necessidades especiais.
Este obstáculo acaba por resultar
na réplica de actividades de natureza escolar com baixo ou nulo benefício e um
risco a prazo de desmotivação, no mínimo.
Por outro lado, tanto quanto o
tempo excessivo de estadia na escola merece reflexão o risco e as implicações
da natureza muitas vezes “disciplinarizada” desse trabalho, ou seja, organizado
por tempos, de forma rígida próxima do currículo escolar.
A enorme latitude de práticas que
se encontra actualmente, desde o muito bom ao muito mau, sustenta que também
neste aspecto os dispositivos de regulação devam ser robustos e eficientes.
Recordo que em muitas circunstâncias as AEC são desenvolvidas por entidades
externas à escola pelo que importa assegurar a responsabilidade da escola e a
sua autonomia.
Na verdade, embora compreendendo
a necessidade da resposta seria desejável que, tanto quanto possível se minimizasse
o risco de em vez de tentarmos estruturar um espaço que seja educativo a tempo
inteiro com qualidade, preenchido na escola ou em espaços e equipamentos da
comunidade, assistirmos à definição de uma pesada agenda de actividades que
motiva situações de relação turbulenta e reactiva com a escola.
Ao escrever estas notas lembrei-me que em 2007 participei num debate sobre as AEC na Vidigueira em que uma professora
presente referiu um episódio elucidativo. Nesse ano e na sua escola tinha sido preparado um espaço para as crianças jogarem futebol. Um dos seus alunos fez a
seguinte observação. “Quando eu tinha tempo para brincar não tinha um campo.
Agora tenho um campo e não tenho tempo para jogar”.
Os miúdos andavam mal habituados
é o que é. Então a escola é sítio para jogar à bola mesmo havendo campo? Não, a
escola é para trabalhar. No mínimo, 7 horas por dia. No mínimo.
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