Foi divulgada pela Inspecção-Geral da Educação e Ciência a análise ao programa de Apoio Tutorial Específico
relativo ao ano de 17/18.
Alguns dados. Dos potenciais
destinatários, 31.534 alunos do 2.º e 3.º ciclo com duas ou mais
retenções, 26.1% não foram abrangidos, um número superior ao do
ano anterior.
Cerca de 9% dos alunos
destinatários não tiveram autorização dos encarregados de educação para
frequentar o programa (percentagem também superior ao ano anterior) e em várias
escolas verificou-se a opção por outras respostas educativas, como os apoios
pedagógicos, a coadjuvação, ou ofertas educativas específicas como os Cursos de
Educação e Formação e o Programa Integrado de Educação e Formação.
É interessante também registar
que em 2017/2018 o Apoio Tutorial Específico funcionou em 542 escolas, em 53
pela primeira vez, mas 60 escolas que no ano anterior tinham desenvolvido o
programa descontinuaram-no, como agora se diz. A decisão decorreu da ausência
de alunos elegíveis (?) ou porque as direcções entendem que o programa tem
reduzido impacto.
Um aspecto também referido no
relatório da Inspecção-Geral prende-se com a formação dos docentes envolvidos
no programa apesar da formação desenvolvida pelo ME em parceria com a Univ. do
Minho, em 2017/2018 75% dos 2537 professores tutores participantes não tem
formação específica e 34% dos agrupamentos não possuem qualquer docente com formação
área.
Ainda como dificuldade é referido
que apesar de alguma flexibilidade introduzida posteriormente ao início do
programa, o número elevado de alunos por grupo em apoio tutorial específico é
elevado, 46% dos grupos têm mais 10 alunos, o efectivo definido no programa.
Do relatório de 2017/2018,
contrariamente ao de 16/17, não constam dados relativos ao impacto do programa
nos alunos o que seria desejável conhecer.
Algumas notas, começando pela “não
autorização” de 9% dos encarregados de educação da participação dos alunos no
Apoio Tutorial. Não me surpreende este indicador, mostra como em matéria de
envolvimento das famílias, designadamente nos alunos em situação mais
vulnerável, está por fazer. Não creio que se trate de uma recusa intencional,
julgo que se inscreve numa ausência de relação e expectativas face ao percurso
escolar dos filhos. Estas famílias constituem um grupo que designo como o das
famílias que não alcançam a escola e que a escola também não alcança. Para
reverter esta situação necessitamos de recursos e modos de fazer que sustentem
abordagens diferentes.
Os modelos de natureza tutorial,
conforme as boas práticas já existentes em muitas escolas e os estudos
nacionais e internacionais sustentam, são ferramentas sólidas e eficazes para
acomodar e responder a dificuldades de alunos e professores nos processos de
ensino e aprendizagem.
Defendo de há muito dispositivos
desta natureza até como forma de gerir de forma adequada os recurso docentes já
integrados no sistema e que manifestamente podem ser utilizados em programas de
tutoria ou coadjuvação. Aliás, é também interessante o recurso a alunos para
programas de tutoria com vantagens recíprocas, para tutores e para tutorandos.
No entanto, e talvez ajude a
perceber alguns dos resultados menos positivos, o Programa de Tutoria em
desenvolvimento, da forma como está desenhado, quatro horas semanais por
professor tutor para 10 alunos como princípio, e considerando o perfil de
intervenção definido e que julgo adequado, tem evidentes constrangimentos. No
entanto, também já estamos habituados a que o empenho, competência e
profissionalismo da generalidade dos professores minimizem insuficiências que
ninguém estranhará. No entanto, não existem milagres e a negação de dificuldades
ou exercícios de “wishfull thinking” não resolvem os problemas.
Recordemos as funções atribuídas.
a) Reunir nas horas atribuídas
com os alunos que acompanha;
b) Acompanhar e apoiar o processo
educativo de cada aluno do grupo tutorial;
c) Facilitar a integração do
aluno na turma e na escola;
d) Apoiar o aluno no processo de
aprendizagem, nomeadamente na criação de hábitos de estudo e de rotinas de
trabalho;
e) Proporcionar ao aluno uma
orientação educativa adequada a nível pessoal, escolar e profissional, de
acordo com as aptidões, necessidades e interesses que manifeste;
f) Promover um ambiente de
aprendizagem que permita o desenvolvimento de competências pessoais e sociais;
g) Envolver a família no processo
educativo do aluno;
h) Reunir com os docentes do
conselho de turma para analisar as dificuldades e os planos de trabalho destes
alunos
Quem conhece a realidade das
escolas e as problemáticas complexas dos alunos em insucesso, com desmotivação,
desregulação de comportamento, ausência de projecto de vida, falta de
enquadramento e suporte familiar, lacunas graves nos conhecimentos escolares de
anos anteriores, etc., quase sempre presentes e só para referir dimensões
relativas aos alunos, percebe a dificuldade de reverter, para usar um termo em
voga, o seu trajecto escolar.
À luz do que me parece ser um
trajecto de defesa da efectiva autonomia das escolas, preferia que, dando o ME
orientação e a possibilidade de gerir e alocar recursos a estes programas, que
fossem as escolas a organizar os seus programas de tutoria, definindo
destinatários, professores e técnicos envolvidos, tempos de realização e
objectivos a atingir.
Caberia, evidentemente, às
escolas e ao ME a regulação e acompanhamento dos programas e a sua avaliação.
Sabemos, é uma referência comum,
a existência de “constrangimentos” que pesam nos recursos disponíveis sendo que
a formação aqui se constitui como eixo importante como é sublinhada no actual
relatório.
No entanto, mais uma vez e não
esquecendo a necessidade de combater desperdício e ineficácia, é bom recordar
que a qualidade da educação e a promoção do sucesso para todos os alunos não
representam despesa, são investimento.
4 comentários:
Ainda não compreendi a diferença entre apoio tutorial específico do Despacho Normativo n.º 4-A/2016 e apoio tutorial do Decreto-Lei n.º 54/2018. Creio que a dificuldade apontada no apoio tutorial específico, a formação de grupos com 10 alunos por professor-tutor e uma carga horária de 4h desaparece à luz do Decreto-Lei n.º 54/2018, uma vez que não é colocada nenhuma limitação à formação destes grupos em termos do número de alunos e de horas afetas por professor. Assim, optando pela alínea e) apoio tutorial, do art.º 9.º do DL n.º 54/2018, caberá às escolas a possibilidade de gerir e alocar recursos a estes programas de tutoria, definir destinatários, professores e técnicos envolvidos, tempos de realização e objetivos a atingir.
Poderá ser assim ou está a escapar-me alguma informação / legislação / esclarecimento a este propósito?
Olá, do meu ponto de vista e em termos de definição pode criar-se alguma ideia de sobreposição nas medidas o que dada a proliferação legislativa não estranho. No entanto, ao nível dos destinatários existe uma diferença, o Apoio Tutorial Específico é destinado "apenas" a alunos do 2º e 3º ciclo com 2 ou mais retenções.
Boa tarde,
tenho as mesmas dúvidas da D.Isabel.
Será que alguém me poderá esclarecer.
obrigada
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