Leio no Público que o ME colocou na plataforma de atribuição
dos manuais um conjunto de recomendações sobre o excesso de peso que muitos
crianças e adolescentes carregam nas mochilas. A campanha iniciada tem como
designação “Mochila Leve”.
As orientações recuperam os conteúdos da recomendação
aprovada em 2017 por unanimidade no Parlamento na sequência de uma petição
subscrita por mais de 50000 cidadãos. “Só” passaram 2 anos pelo que folgo com a preocupação
agora assumida pelo ME com o fardo que os miúdos põem diariamente às costas.
São contempladas medidas como o estabelecimento de
dispositivo de homologação das mochilas e das condições ergonómicas mais
adequadas, a definição de salas fixas para cada turma, para evitar que as
crianças tenham de carregar as mochilas durante os intervalos, a instalação de
cacifos, a possibilidade dos materiais escritos, manuais, por exemplo, livros
serem produzidos com um papel com uma gramagem mais leve ou a utilização
gradual dos recursos digitais incluíam-se na recomendação aprovada em 2017.
Eu sei que nem toda gente concorda que a vida de muitos
miúdos se traduz num fardo bem pesado mas a verdade é que diferentes estudos
sugerem que cerca de sete em cada dez crianças transportam às costas um peso superior
ao aconselhado pela OMS, 10% do seu peso corporal.
Como já escrevi a propósito de outras matérias, existem
muitas matérias que não deveriam ser objecto de legislação, o bom senso deveria
bastar mas assim não é, aguardemos que as campanhas e recomendações contribuam
para minimizar a situação que para algumas crianças é mesmo pesada.
Como é óbvio, pelas suas implicações e riscos, imediatos e a
prazo, para a saúde dos miúdos, esta questão deve merecer a atenção de pais e
educadores no sentido de a minimizar, embora, por outro lado, o seu transporte
configure um exercício físico que disfarça a ausência de espaços e equipamentos
adequados em muitas das nossas escolas e combata uma infância sedentarizada, a
troco, é certo, de uma coluna castigada. Nada é perfeito, dir-se-á com algum
cinismo.
No entanto, aproveitando o espaço e o tempo de reflexão agora
criados talvez também fosse útil olhar de uma forma mais alargada para o peso
excessivo que muitas crianças carregam nas suas costas.
As mochilas escolares serão apenas um dos carregos, por
assim dizer, mas existem outros que temo ficarem fora deste conjunto de
recomendações e nos quais insisto.
Estou a pensar no peso da pressão para que sejam excelentes.
Estou a pensar no peso da pressão para que sejam o que não
são e da pressão para que não sejam o que são.
Estou a pensar no peso da pressão de viver demasiado só.
Estou a pensar no peso da pressão que leva a que, por vezes,
só gritando e agitando-se se façam ouvir.
Estou a pensar no peso da pressão de não conhecer o caminho
e sentir-se perdido.
Estou a pensar no peso da pressão de actividades sem fim e,
às vezes, sem sentido.
Estou a pensar no peso da pressão do depressa e bem.
Estou a pensar no peso da pressão para sejam diferentes e na
pressão para que sejam iguais.
Estou a pensar na pressão da exclusão e do insucesso.
Estou a pensar na pressão dos que são vitimizados por outros
que também sendo vítimas se escondem na agressão.
Estou a pensar no peso da pressão causada por famílias
demasiado distantes ou por famílias demasiado próximas ou ainda por famílias
ausentes.
Na verdade, há miúdos que carregam o mundo às costas.
Entende-se as preocupações dos professores, pediatras, psicólogos,
ortopedistas, outros especialistas e de muitos de nós com a coluna dos miúdos.
Não, não é uma visão romântica ou eduquesa, trata-se do bem-estar de crianças e adolescentes.
Não, não é uma visão romântica ou eduquesa, trata-se do bem-estar de crianças e adolescentes.
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