Muitas vezes aqui tenho abordado
a questão dos manuais escolares. Nestas reflexões creio que posso identificar
três pontos essenciais que sintetizo sem hierarquia de importância.
Em primeiro lugar sublinho a
ideia da gratuitidade dos manuais durante a escolaridade obrigatória que é
constitucionalmente gratuita.
Em segundo lugar defendo o
princípio genérico da reutilização por razões de sustentabilidade e custos.
Em terceiro lugar tenho
considerado que o nosso modelo de trabalho, apesar das excepções e das mudanças,
ainda se pode considera excessivamente “manualizado” ou seja, assenta talvez
demais a práticas pedagógicas pouco diferenciadas muito decorrentes de
conteúdos curriculares demasiado extensos, prescritivos e normalizadores. Seria
desejável atenuar a fórmula predominante, o professor ensina com base no manual
o que o aluno aprende através do manual que o pai acha muito importante porque
tem tudo o que professor ensina. Não esqueço no entanto, que variáveis como a natureza e conteúdos curriculares, o número de alunos por turma ou ainda a cultura pedagógica de décadas influenciam este cenário.
Estou convicto de que sem aligeirar o peso do manual no
trabalho em sala de aula os níveis de diferenciação necessários como forma mais
robusta à diversidade dos alunos ficam comprometidos.
No entanto e apesar de continuar
a assumir estes princípios julgo que a particularidade do 1º ciclo merece uma reflexão designadamente
no caso da reutilização.
Nos últimos tempos tivemos referências
na imprensa a expedientes usados pelos pais para “apagar” o rasto que os seus
filhos deixaram nos manuais, a decisão da direcção do agrupamento de S. Julião
da Barra de não pedir a devolução dos manuais aos alunos do 1º ciclo e o ME a “obrigar”
à sua recolha, o Tribunal de Contas a entender que a não reutilização
compromete as contas, sempre as contas da educação que insistem em não dar
certo, etc.
A entrada na escola, no 1º ciclo,
será dos poucos processos que quando correm mal já não é possível voltar atrás
e recomeçar com a esperança de que a coisa vá correr melhor.
Torna-se, pois, essencial que
este processo de entrada na escola seja pensado e orientado, que crie as
rotinas, a adaptação e a confiança em miúdos e em pais, indispensáveis à
aprendizagem bem-sucedida.
É fundamental não esquecer que os
miúdos à entrada na escola não estão todos nas mesmas condições pelas mais
variadas razões, ambiente e experiências familiares, percurso anterior,
características individuais, etc. o que exige desde o início uma atenção
diferenciada que combata a cultura de que devem ser todos tratados da mesma
maneira que alguma opinião publicada e ignorante defende.
Antes de, com voluntarismo e
empenho, se tentar ensinar aos miúdos as coisas da escola é preciso, como
sempre afirmo, dar tempo, oportunidade e espaço para que aprendam a
escola. Depois de aprenderem a escola estarão mais disponíveis para então aprender as coisas da escola.
É neste contexto que julgo que os
manuais deveriam ficar com os alunos, não seriam devolvidos, podendo continuando
a sua produção a permitir que sejam usados como suporte do seu trabalho sem que
este entendimento, comprometa o que disse acima sobre o excesso de peso
pedagógico atribuído ao manual. Acresce ainda que apesar de alguma “disciplinarização”
dos conteúdos curriculares, incluindo o recurso a manuais para cada conteúdo, e
a lógica de ciclo contida na LBSE, a continuidade da relação dos alunos em
diferentes patamares de aprendizagem e desempenho ao longo do ciclo com o
trabalho desenvolvido também aconselharão a que se mantenham os manuais que vão
utilizando.
Esta manutenção terá ainda um
valor de natureza menos tangível, diria afectivo, pois seriam um registo, um
diário de bordo da sua aprendizagem e um instrumento de relação com o trabalho
escolar.
Como é óbvio este entendimento
não belisca a necessidade dor recursos a actividades e materiais diversificados
num já referido modelo de diferenciação pedagógica.
Definitivamente, aos 6, 7 ou 8
anos a relação com os manuais é de natureza diferente da que estabelece em
fases posteriores da escolaridade obrigatória em que a reutilização é bem mais “tranquila”,
por assim dizer.
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