domingo, 11 de novembro de 2018

DO ENSINO DOMÉSTICO

O Expresso deste fim-de-semana apresenta um trabalho sobre uma matéria que poucas vezes merece atenção na agenda da educação, o designado ensino doméstico ou individual e que julgo merecer algumas considerações breves.
Regista-se a subida significativa de crianças e jovens nesta situação, ensino doméstico ou individual (assegurado por docente habilitado), de 63 em 2012/2013 para 909 em 2017/2018.
Por outro lado refere-se a intenção do ME de alterar a regulamentação desta resposta. Do que é conhecido consta:
Contrariamente à situação actual que apenas exige a informação à escola da área de residência, os pais deverão apresentar um pedido de autorização à direcção da escola da área de residência que o poderá recusar sem que se conheçam os critérios que informarão a decisão.
Passará a ser exigido o grau de licenciatura ao encarregado de educação da criança quando até agora se exigia a detenção do nível de escolaridade do ciclo acima do que é frequentado pela criança ou jovem.
Será ainda exigido um ““protocolo de colaboração” entre a escola e a família “que contemple as aprendizagens essenciais e os temas obrigatórios a ser lecionados no respetivo ano de escolaridade e as formas de acompanhamento do que a criança ou jovem vai aprendendo, incluindo a calendarização “de sessões presenciais a realizar na escola de matrícula com o aluno e o encarregado de educação”. Pelo menos duas vezes por ano, a família terá de apresentar um portefólio que reúna os trabalhos desenvolvidos com o estudante.”, lê-se no Expresso.
Tal como acontece actualmente, os alunos nesta situação realizarão provas de equivalência à frequência no final de cada ciclo e os exames nacionais. Os seus resultados determinarão a transição como noutras modalidades de frequência.
Parece-me de referir que nesta modalidade, ensino doméstico ou individual, existem diferentes tipologias desde situações educativas em contexto familiar mais restrito até à criação de espaços de natureza alternativa onde em grupos muito pequenos e acompanhadas por profissionais as crianças realizam as actividades educativas e de aprendizagem. A peça do Expresso mostra algumas situações.
É reconhecido que esta opção por parte de algumas famílias, para além de algumas razões de natureza logística menos significativas, radica em dimensões como a recusa ou reserva das famílias relativamente aos conteúdos curriculares centralizados e massificados gerados pela escolaridade obrigatória e universal, entendimento que também se associa por vezes a convicções religiosas, um quadro de valores e visão de educação ou de sociedade desejando algo de diferente para os seus e também a uma apreciação menos positiva dos ambientes escolares e dos seus eventuais impactos nas crianças e adolescentes.
É clara a legitimidade das opções familiares embora se saiba que em alguns países não é permitida e conheço e valorizo experiências positivas que acontecem neste universo. Aliás, quer por razões de legitimidade, quer por razões, aqui sim, relativas à liberdade de educação, ou de sustentação científica, tenho alguma dificuldade em atender aspectos como o pedido de autorização ao director da escola da área da residência para mais desconhecendo os critérios de decisão ou a exigência dirigida ao nível de escolaridade do encarregado de educação.
Dito isto e agora em nome da liberdade de opinião algumas notas.
A melhor forma de proteger a liberdade de educação é uma fortíssima cultura de qualidade, rigor e exigência na escola pública e uma acção social escolar eficaz e oportuna.
Só a educação e a rede pública de qualidade podem promover equidade e igualdade de oportunidades.
Só a educação e a rede pública de qualidade podem ser verdadeiramente inclusivas e receber todos os alunos.
Só a educação e rede pública pode chegar a todos os territórios educativos e a todas as comunidades.
Só a educação e rede pública de qualidade promovem mobilidade social em circunstâncias de equidade no acesso.
Não cabe neste espaço uma análise mais profunda mas no que respeita ao ensino doméstico ou individua parece-me que apesar de ser um exercício de liberdade é uma resposta a que muitas famílias não poderão aceder pelo que retomo a importância de assegurar a qualidade da resposta que acolhe todos.
Por outro lado julgo que devem ser ponderadas questões como a densidade e natureza da rede social experienciada pelas crianças e adolescentes, a diversidade de actividades, o desempenho e contacto com diferentes papéis e diferentes contextos, a autonomia, os “limites” na acção didáctica (não educativa) dos pais que leva à necessidade de “orientadores” também conhecidos por “professores” embora num contexto físico diferente do mais habitual.
Por outro lado, o ensino doméstico ou individual tem como horizonte temporal toda a escolaridade obrigatória? Os ciclos iniciais, o ensino básico por exemplo? Pode incluir o superior?
Termino reafirmando o reconhecimento da resposta e da qualidade com que pode ser assegurada mas não posso deixar de dizer que apesar de tudo o que conheço de positivo e de menos positivo a minha opção continua a ser a escola pública exigindo que ela cumpra com qualidade e para todos a sua imprescindível função.

1 comentário:

Maria Teresa Santos disse...

Sem dúvida alguma que só com investimento no ensino público e qualidade na colocação dos docentes se pode contribuir para equipas pedagógicas estáveis em estreita colaboração com as comunidades educativas dos alunos.