O Conselho Nacional de Educação aprovou
um conjunto de recomendações ao Governo no sentido de que o processo de “municipalização”
da educação em preparação não minimize ou interfira com a autonomia das escolas apesar do que ainda faltar caminhar nesta matéria. A autonomia das escolas é reconhecidamente uma variável significativa na qualidade dos rocessos educativos.
Esta preocupação expressa pelo
CNE é pertinente e também por aqui tenho manifestado algumas dúvidas sobre o
trajecto que pode vir a ser seguido.
Não conheço as avaliações que
suponho terem sido realizadas a processos de experimentação desenvolvidos em
algumas autarquias.
Por outro lado, são também
conhecidas as reservas que directores e professores e também pais e
encarregados de educação têm manifestado face ao modelo que tem sido anunciado
de “municipalização” que possibilitará que serviços, actividades e/ou
projectos, nomeadamente de administração escolar, papelaria, refeitório,
biblioteca, bem como serviços de apoio educativo, incluindo psicologia ou
desporto escolar, possam ser subcontratados a operadores privados.
O Conselho de Escolas e as
associações de directores bem como os professores temem a diminuição da
autonomia das escolas apesar da retórica da tutela. Recordo uma consulta
promovida em 2015 pela Plataforma Sindical de Professores em que de cerca de 50
mil professores que participaram numa consulta sobre a "municipalização da
Educação", à volta de 43 mil manifestaram-se contra o processo.
Insisto na necessidade de se
considerarem com atenção os resultados de experiências de
"municipalização" realizadas noutros países cujos resultados estão
longe de ser convincentes. A Suécia, por exemplo, está assistir-se justamente a
um movimento de "recentralização" considerando os resultados, maus,
obtidos com a experiência de municipalização.
Por outro lado, o que se vai
passando no sistema educativo português, a falta de regulação eficiente, apesar
de algumas boas práticas, o envolvimento das autarquias nas escolas e
agrupamentos, designadamente em matérias como as direcções escolares, os
Conselhos gerais ou a colocação de funcionários e docentes (nas AEC, por
exemplo) tem mostrado variadíssimos exemplos de caciquismo, tentativas de
controlo político, amiguismo face a interesses locais, etc. O controlo das
escolas é uma enorme tentação. Podemos ainda recordar as práticas de muitas
autarquias na contratação de pessoal, valorizando as fidelidades ajustadas e a
gestão dos interesses do poder.
Assim sendo, talvez seja mesmo
recomendável alguma prudência embora, confesse, não acredite pois não se trata
de imprudência, trata-se de uma visão, de uma agenda.
Ainda nesta matéria e dados os
recursos económicos que se anunciam através das verbas comunitárias para além
dos dinheiros públicos, parece clara a intenção política de aumentar o
"outsourcing", a intervenção de entidades e estruturas privadas que
já existem nas escolas, muitas vezes com resultados pouco positivos, caso de apoios
educativos a alunos com necessidades educativas especiais e do recurso a
empresas de prestação de serviços, (de novo o exemplo das AEC).
Está expressa nos Projectos de
contrato em funcionamento a intenção de contratar a privados a prestação destes
serviços nas escolas, incluindo no universo da inclusão, um modelo ineficaz
pois a intervenção de qualidade e adequada dos técnicos, designadamente de
educação ou psicólogos, depende, evidentemente, da sua pertença às equipas das
escolas e não é compatível com a prestação de serviços por técnicos de fora em
regime de "consulta".
Um modelo deste tipo, estruturas
e entidades privadas a intervir em escolas públicas, só é garantidamente bom
para as entidades a contratar, não, muito provavelmente, para alunos, professores
e escolas. Temo que “municipalização” possa ser um incremento e apoio a um
nicho de mercado.
Finalmente, importa desfazer o
equívoco que referia acima, descentralização não significa municipalização e
importa promover a autonomia o que é diferente. De acordo com o modelo em
desenvolvimento esperemos para perceber mais claramente o que o ME proporá. Conforme
os directores têm referido a autonomia da escola não parece sair reforçada,
antes pelo contrário, passa para as autarquias por delegação de competências do
ME. O imprescindível reforço da autonomia das escolas e agrupamentos não
depende da municipalização como muitas vezes se pretende fazer crer.
Mais uma vez, confundir autonomia
com descentralização traduzida em municipalização é criar um equívoco perigoso
que, entre outras consequências, pode dar alguma cobertura aos negócios da
educação.
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