quarta-feira, 8 de agosto de 2018

DA AVALIAÇÃO


Achei interessante a entrevista do Presidente do IAVE, Hélder Sousa, ao Observador. Aliás, acho até curiosas algumas das afirmações vindas de alguém que é responsável pelo Instituto de Avaliação Educativa.
Algumas notas a propósito de avaliação. Parece consensual o entendimento de que a qualidade em educação se promove, é certo, com a avaliação rigorosa e regular das aprendizagens (externa e interna), naturalmente, mas também com a avaliação do trabalho dos professores, com a definição de currículos e metodologias adequadas, com a estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores eficazes e suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados de organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, sustentadores de uma visão estável para o funcionamento do sistema.
Neste quadro, parece-me pouco prudente afirmar, como o faz o Presidente do IAVE, face ao desempenho dos alunos que “A raiz do problema estará muito mais na forma como o ensino é encarado pelos professores: eu tenho de dar o programa. Têm uma matriz cheia de conteúdos e pensam que têm de passá-la toda aos alunos para cumprir o seu dever.”. Não esta questão, sendo de considerar, não é a raiz do problema. A raiz, as raízes do problema estão a montante da acção do professor, desde logo considerando a visão de escola e educação que a comunidade e as famílias assumem e todo conjunto de aspectos de política educativa.
A avaliação escolar, através de diferentes dispositivos, cumpre três funções essenciais, a certificação, da aquisição de saberes ou de competências por exemplo, a ordenação, os resultados dos alunos dispersam-se por um escala, 0 a 20 ou 0 a 100, e a de regulação, recolher informação que permita identificar fragilidades nos processos de trabalho com vista à sua correcção.
Os exames nacionais, mas também os tão frequentes testes procuram cumprir, sobretudo a primeira e segunda funções, a certificação e a ordenação. Neste cenário surgem as primeiras questões, que competências ou saberes devem ser adquiridos. Não é fácil, antes pelo contrário, que um só exame consiga avaliar o "tudo" que pode ser avaliado, por esta razão, o exame não pode ser o "tudo" em matéria de avaliação.
Não tenho uma posição fundamentalista contra os exames, duvido da sua justificação no 4º ano, mas também tenho a maior das convicções que uma avaliação basicamente centrada em produtos, exames por exemplo, é insuficiente para introduzir mecanismos de correcção eficazes no trabalho de alunos e professores.  Não é por medir muitas vezes a febre, mesmo com um termómetro de boa qualidade, que a febre baixa.
Nesta perspectiva é fundamental a solidez dos dispositivos de avaliação dirigida aos processos, ou seja, recorrer de forma consistente e aprofundada a dispositivos de avaliação formativa. No entanto, este movimento deve assentar numa sólida autonomia de professores e escolas de que ainda estamos longe.
Todos sabemos isto de há muito mas por múltiplas razões continuamos muito presos a dispositivos de natureza mais sumativa que se avolumam no secundário devido ao peso dos resultados dos exames no acesso ao superior algo que, como tanta vezes já escrevi deveria ser repensado como, aliás, também entende o Presidente do IAVE.
Finalmente, parece-me de reafirmar que qualquer debate sobre avaliação escolar solicitará incontornavelmente o envolvimento de outras dimensões como currículos e programas, organização e funcionamento das escolas, designadamente recursos e apoios educativos.

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