O inferno voltou para nos
assombrar. Retornou com uma violência brutal que, apesar de todos os riscos que
se mantêm, queríamos acreditar que não se repetiria.
Apesar do inferno de Monchique
creio poder afirmar-se que alguma coisa tem sido ligeiramente diferente esta
época. Tem sido reconhecido alguma evolução nas respostas rápidas e, consequentemente,
nas dimensões atingidas pela maioria das ignições e até nos discursos das
lideranças políticas que revelam maior contenção em usar esta tragédia nas
lutas da partidocracia.
No entanto, há algo a que parece não
haver volta a dar, a forma como boa parte da comunicação social trata esta questão. Não há
tudólogo que não opine de cátedra sobre combate e prevenção incêndios, sobre
gestão da floresta e ordenamento do território, sobre alterações climáticas,
etc.
Continua, sobretudo na imprensa
televisiva, a emissão exaustiva de peças que de forma frequentemente sem pudor,
respeito e competência, a mostrar o "terreno", o "cenário
dantesco", a ouvir "moradores que passaram uma noite em branco",
a ouvir o "senhor comandante dos bombeiros", a referir os "meios
aéreos, dois Canadairs e um Kamov", a ouvir os "responsáveis locais
ou regionais da protecção civil", a gravar despudoradamente imagens de
dor, sofrimento e perda de gente anónima que tendo quase nada, vê arder o quase
tudo. Um filme dramático sempre visto e sem surpresas que este ano tem uma “nuance”
que me tem causado alguma perplexidade, a repetida tentativa de questionar a
eficiência dos profissionais que combatem o fogo, designadamente os bombeiros. Deplorável mas sem surpresa
dada a linha editorial de alguma imprensa.
O poeta falava de um fogo que arde sem se ver, é bonita a
imagem. Mas quando um fogo arde e se vêem os seus efeitos devastadores e dramáticos
não se perdoa a forma como tantas vezes isto é tratado como se fosse um
espectáculo.
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