Aproxima-se o final das férias e,
consequentemente, o início do ano lectivo. As famílias fazem contas, compra-se
como se pode o que é determinado ou desejado pelos miúdos, prepara-se o
material para que tudo esteja em condições,
Recordei-me de que quando
era miúdo, lá muito para trás no tempo, havia algo de obrigatório na mala da
escola, ainda não tinham inventado as mochilas. Era o caderno dos deveres. Para
muitos de nós a escola definia-se pela existência de uma professora e de um
caderno dos deveres. Deve ser conversa de velho mas acho piada a este nome, ao
contrário do que pensava naquela época. Mas era um tempo de deveres, os da
escola e todos os outros. Não era um tempo de direitos, de muitos direitos. E
na escola, salvo algumas excepções só se falava mesmo de deveres e por isso um
caderno dos deveres.
Depois veio uma festa com alguma
turbulência e chegaram os direitos, todos os direitos, acreditava-se, e acabou
o caderno dos deveres. A poeira assentou e, provavelmente por alguma
embriaguez, parece ter-se instalado de mansinho uma ideia de que entrámos numa
época de direitos só de direitos e os deveres passaram a ser olhados como algo
a evitar e de que se foge sempre que se pode.
Actualmente, olhamos à nossa
volta e parecemos divididos em torno dos direitos, os que têm muitos e os que
têm poucos e achamos todos que não temos deveres.
Há quem não tenha o direito ao
trabalho, à habitação, à saúde, à educação e há quem tenha direito à
impunidade, ao que não é seu, ao não cumprimento da lei, são os que eu chamo de
donos do mundo, os que entendem que o dia e as outras pessoas acordam para
satisfação dos seus direitos que foram, claro, por si estabelecidos.
Voltando à escola e não sendo eu
grande defensor dos manuais, creio que o único manual que se justificaria
obrigatório seria um “Caderno dos direitos e dos deveres para construir um
mundo decente”.
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