No Público encontra-se um
trabalho interessante sobre as mudanças na configuração das famílias. Em 2016
17.1% dos bebés nasceram sem que os pais coabitem. Esta situação não parece
decorrer de motivos como emigração mas de uma opção para alguns casais, manter
relações “estáveis e duradoras” mas vivendo em casas separadas constituindo na
expressão da demógrafa Maria João Valente Rosa, as “famílias solitaristas”.
Esta opção é já mais frequente noutras paragens sob a designação “living apart
together”.
Como se tem vindo a verificar a
parentalidade deixou de se associar ao casamento, 52% dos bebés nascem fora do
casamento e, parece, começa a não estar associada à partilha da mesma casa.
São regulares na imprensa as
referências às emergentes e diferentes dinâmicas de constituição, organização e
funcionamento dos “novos” agregados familiares acentuando as alterações
observadas, algumas das quais desencadeando enorme discussão, como é o exemplo
da co-adopção por casais homossexuais em que se misturam valores e ciência para
sustentar diferentes entendimentos.
No entanto, do meu ponto de
vista, quase sempre me parece que as diferentes abordagens não valorizam, por
vezes nem referem, um aspecto que entendo relevante e que considero dos mais
complexos desafios sociais que actualmente enfrentamos, a educação familiar, ou
seja, o que é, o que deve ser, como deve ser a educação familiar em contextos altamente
diferenciados e em mudanças permanentes.
Esta minha questão releva do
entendimento de que independentemente da configuração a família, a educação
familiar, é um bem de primeira necessidade para todas as crianças.
A verdade é que as enormes
alterações que temos vindo a constatar no universo das famílias implicam uma
séria reflexão sobre as suas implicações e impacto na educação familiar. O
paradigma clássico, a família educativa e a escola instrutiva, mudou
substantivamente o que não significa, obviamente, a alienação do papel
educativo da família, mas sim atentar nas novas qualidades que esse papel vai
assumindo, parafraseando Camões.
Desde logo porque, por questões
de logística e funcionalidade, o tempo familiar para as crianças encolheu de
forma dramática, os miúdos passam tempos infindos na escola sob um princípio a
que até o MEC se lembrou de chamar de forma infeliz “Escola a tempo inteiro”.
As famílias expressam uma enorme dificuldade em compatibilizar o que ainda
entendem ser o seu papel educativo com a pressa e o pouco tempo que assumem ter
para o realizar. Tenho conhecido dezenas de pais que se sentem culpados e
fragilizados por entenderem que não têm a disponibilidade de tempo e atitude
que julgam necessária para os filhos. Esta culpa e fragilidade é, com
frequência, a base inconsciente que impede alguns pais de serem consistentes e
firmes na definição de regras e limites imprescindíveis às crianças, pois
“temem estragar” o pouco tempo que têm com elas devido a um eventual conflito.
Uma outra questão prende-se com o
modo e a dificuldade que muitos pais me referem sentir quando lidam com as
crianças em situação de “duas famílias” mesmo em separações não litigiosas e
com níveis de agressividade por vezes inquietantes. Mais uma vez, as inseguranças
e algum sentimento de culpa estão presentes e contribuem para embaraços que
levam os pais a pedir alguma ajuda. Como sempre digo, é preferível uma boa
separação a uma má família, mas alguns pais sentem-se inseguros para construir
cenários de educação familiar com qualidade quando têm a guarda das crianças
repartida.
Tem vindo a crescer o número de
situações de casais que apesar de separados continuam a coabitar o mesmo espaço
ou que nem sequer assumem a separação, criando uma situação de "casados
por fora" e "descasados por dentro", poderá implicar, quando
existem filhos, algumas ansiedades e inquietações nos pais sobre a forma de
lidar com um contexto em que aparentemente existe uma família, quando na
verdade já são duas com uma ou mais crianças entre elas.
As crianças são resilientes e
acomodam melhor eventuais dificuldades quando estão com adultos que delas
cuidam e lhes dedicam afecto.
A experiência mostra, como referi
acima, que a educação familiar se constitui como uma área extremamente
complexa, não existem dois contextos familiares iguais sendo que, para além de
tudo, se trata de um universo extremamente sensível a valores e convicções.
Assim sendo, importa estarmos
atentos e procurar disponibilizar apoios e orientações nas situações em que os
pais revelam e exprimem mais insegurança e dificuldades e que muitas vezes são
fonte de grande sofrimento para todos os envolvidos. Estas situações são bem
mais frequentes e graves do que julgamos.
E envolvem famílias de diferentes
configurações, umas mais “velhas” outras mais “novas”.
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