O estado deplorável a que chegou a nossa desconfiança no sistema de justiça contribuiu, confesso, para que não estivesse convicto do que me parecia ser a única decisão possível, a absolvição, no julgamento do processo que envolvia a peça de teatro "A filha rebelde" em que se discutia a forma como foi abordado o envolvimento do ex-director da PIDE/DGS no assassinato pela polícia política do General Humberto Delgado, situação historicamente comprovada.
A realidade nunca é, no melhor e no pior, a projecção dos nossos desejos apesar de alguns dos líderes políticos se esforçarem profundamente para que a realidade seja aquilo que eles dizem que é a realidade.
Da mesma forma, a história não é o que cada um gostava que fosse, embora os mesmos factos possam merecer leituras diferentes. A análise histórica não é o mesmo que a história. Hoje em dia e relativamente a diferentes episódios ou períodos da história nacional ou internacional, assiste-se com alguma frequência à tentativa de reescrita ou branqueamento de decisões e comportamentos, transformando a subjectividade da análise na verdade, seja lá isso o que for.
Por outro lado, nos limites do respeito pelos direitos individuais, é fundamental garantir a liberdade de expressão e criação que a decisão do tribunal sublinhou. Curiosamente, no caso em apreço, o director da PIDE/DGS tinha, entre outras funções, a de zelar pela ausência da liberdade de expressão, usando para tal missão amplos poderes e diferentes metodologias, incluindo a tortura e a morte.
Neste contexto, acho que deve ser registada a decisão de absolvição agora conhecida.
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