sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

"DESPROFISSIONALIZAÇÃO" DOCENTE. SERÁ?


O ME estabeleceu a possibilidade de que professores de Inglês, Francês, Alemão ou Espanhol possam dar aulas de Português no 3.º ciclo e secundário desde que tenham feito um “estágio pedagógico” nesta área. Também a disciplina de Inglês poderá ser assegurada por professores de Português, Francês, Alemão e Espanhol e a de Geografia por professores de História. Finalmente, a disciplina de TIC pode ser leccionada por qualquer docente que tenha frequentado uma acção de formação nesta área.
Parece claro que a existência de muitos alunos sem aulas em diferentes disciplinas é um problema complicado e que exige resposta.
Parece também claro que a negligência incompetente com que a questão do número de professores necessário ao sistema contribui para a situação criada. Os dados demográficos, a composição dos grupos disciplinares e as necessidades das escolas constituem informação conhecida.
Parece ainda claro que a narrativa dos professores a mais, globalmente, não passava disso mesmo, uma narrativa.
Finalmente, parece claro que a opção seguida levanta algumas inquietações em linha com o que aqui já tenho abordado a propósito de um risco emergente de “desprofissionalização” dos docentes. Esta “desprofissionalização” pode ir acontecendo através de medidas desta natureza, mas também através da timidez na promoção da autonomia das escolas associada aos efeitos da "municipalização” em curso ou projectos de intervenção nas escolas realizados em “outsourcing”.
Deve dizer-se que este movimento não é de agora e não começou por cá. Tem vindo a fazer o seu caminho em diferentes sistemas emergiu na década de 80 sob a designação de “deskilling” promovendo concepção “empobrecida”, diria “embaratecida”do professor e da sua função. Nesta visão, os docentes cumprem ordens e programas, não têm que fazer escolhas, possuir conhecimento aprofundado, solidez nas metodologias, valores éticos e morais, etc. Seria suficiente uns burocratas a papaguear aulas para grupos de alunos "normalizados" com base num currículo prescritivo e no manual.
Os professores serão basicamente “entregadores de conteúdos”, (content delivers na formulação original), outros burocratas a medir saberes ou a desvalorização da avaliação interna e externa e uns outros ainda a construir fórmulas de gestão num qualquer serviço centralizado ou com um modelo que apesar de “descentralizado” não atribui, de facto, autonomia robusta às escolas cujo modelo de governação é parte desta equação.
Definitivamente, este não pode ser o caminho. A “desprofissionalização” pode tornar os professores mais “baratos” mas o nosso futuro será mais caro por pior qualidade, um professor de … é muito mais que um técnico de …
Todas as necessárias mudanças na educação só podem ocorrer e ser bem-sucedidas com o envolvimento e valorização dos professores, das suas competências mas também, naturalmente, com a sua avaliação.

Sem comentários: