sábado, 10 de março de 2018

BULLYING E NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS


Num evento ontem realizado em Lisboa dedicado à temática do bullying foi divulgado um estudo realizado em Espanha segundo o qual, entre as crianças com algum tipo de dificuldade (na notícia do Público fala-se de deficiência) as crianças com autismo correm maior risco de ser vítimas de bullying.
Foi divulgado um projecto europeu com o objectivo de prevenir o bullying contra pessoas com necessidades educativas especiais ou deficiência.
Parece claro e é reconhecido nos estudos sobre o bullying que qualquer fragilidade percebida e de qualquer natureza aumenta o risco de ser vítima. O(s) agressor(es) dirigem os seus comportamentos para alvos nos quais percebem algum tipo de fragilidade. É, pois, de registar esta iniciativa mas também sublinhar a necessidade de prevenir e apoiar vítimas e agressores em qualquer circunstância, é uma questão global e causadora de enorme sofrimento.
Diferentes estudos sugerem que em Portugal entre 20 a 30% de adolescentes até aos 13 e os 15 anos já se terá envolvido em episódios de bullying verificando-se com particular preocupação a subida significativa de cyberbullying e também o envolvimento de crianças mais novas.
Sabe-se também que a ocorrência de situações de bullying é bem superior ao número de casos que são relatados. Uma das características do fenómeno, nas suas diferentes formas, incluindo o emergente cyberbullying, é justamente o medo e a ameaça de represálias a vítimas e assistentes que, evidentemente, inibem a queixa pelo que ainda mais se justifica a atenção proactiva e preventiva de adultos, pais, professores ou funcionários.
Este cenário determinaria, só por si, um empenhado investimento em recursos e dispositivos que procurassem minimizar o volume de incidências, algumas das quais de gravidade severa.
Recordo um estudo com uma escala significativa divulgado na Lancet Psychiatry em 2015  evidenciando que o bullying assume impactos negativos mais significativos no bem-estar psicológico dos adolescentes aos 18 anos que maus tratos de adultos sofridos na infância. Mostra ainda que crianças maltratadas na infância são vítimas potenciais de bullying em adolescentes.
Neste contexto e dada a gravidade e frequência com que ocorrem estes episódios é imprescindível que lhes dediquemos atenção ajustada, nem sobrevalorizando, nem tudo é bullying, o que promove insegurança e ansiedade, nem desvalorizando, o que pode negligenciar riscos e sofrimento.
Neste universo importa considerar dois eixos fundamentais de intervenção por demais conhecidos, a prevenção e a intervenção depois dos problemas ocorrerem. Esta intervenção pode, por sua vez e de forma simplista, assumir uma componente mais de apoio e correcção ou repressão e punição, sendo que podem coexistir. Com alguma demagogia e ligeireza a propósito do bullying, as vozes a clamar por castigo têm do meu ponto de vista falado mais alto que as vozes que reclamam por dispositivos de prevenção, intervenção e apoio para além da óbvia punição, quando for caso disso.
O volume de episódios mostra a necessidade de dispositivos de apoio e orientação absolutamente fundamentais para que pais, professores e alunos possam obter informação e apoio. Existem, felizmente, várias iniciativas com um trabalho importante mas apesar da colaboração em projectos nas escolas, estão fora da escola.
A existência de dispositivos de apoio sediados nas escolas, com recursos qualificados e suficientes, a presença de assistentes operacionais com funções de supervisão dos espaços escolares, é, a par de ajustamentos nos modelos de organização e funcionamento das escolas e de uma séria reestruturação curricular, uma tarefa urgente.
Do meu ponto de vista, o argumento custos não é aceitável porque as consequências de não mudar são incomparavelmente mais caras. Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes evidenciam no seu dia-a-dia sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos atenção, seja em casa, ou na escola, espaço onde passam um tempo enorme.
Estes sinais não podem, não devem, ser ignorados ou desvalorizados. O resultado pode ser grave.

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