Num evento ontem realizado em
Lisboa dedicado à temática do bullying foi divulgado um estudo realizado em
Espanha segundo o qual, entre as crianças com algum tipo de dificuldade (na
notícia do Público fala-se de deficiência) as crianças com autismo correm maior
risco de ser vítimas de bullying.
Foi divulgado um projecto europeu
com o objectivo de prevenir o bullying contra pessoas com necessidades
educativas especiais ou deficiência.
Parece claro e é reconhecido nos
estudos sobre o bullying que qualquer fragilidade percebida e de qualquer
natureza aumenta o risco de ser vítima. O(s) agressor(es)
dirigem os seus comportamentos para alvos nos quais percebem algum tipo de
fragilidade. É, pois, de registar esta iniciativa mas também sublinhar a necessidade de prevenir e apoiar vítimas e agressores em qualquer circunstância, é uma questão global e causadora de enorme sofrimento.
Diferentes estudos sugerem que em
Portugal entre 20 a 30% de adolescentes até aos 13 e os 15 anos já se terá
envolvido em episódios de bullying verificando-se com particular preocupação a
subida significativa de cyberbullying e também o envolvimento de crianças mais
novas.
Sabe-se também que a ocorrência
de situações de bullying é bem superior ao número de casos que são relatados.
Uma das características do fenómeno, nas suas diferentes formas, incluindo o
emergente cyberbullying, é justamente o medo e a ameaça de represálias a
vítimas e assistentes que, evidentemente, inibem a queixa pelo que ainda mais
se justifica a atenção proactiva e preventiva de adultos, pais, professores ou
funcionários.
Este cenário determinaria, só por
si, um empenhado investimento em recursos e dispositivos que procurassem
minimizar o volume de incidências, algumas das quais de gravidade severa.
Recordo um estudo com uma escala
significativa divulgado na Lancet Psychiatry em 2015 evidenciando que o bullying assume impactos
negativos mais significativos no bem-estar psicológico dos adolescentes aos 18
anos que maus tratos de adultos sofridos na infância. Mostra ainda que crianças
maltratadas na infância são vítimas potenciais de bullying em adolescentes.
Neste contexto e dada a gravidade
e frequência com que ocorrem estes episódios é imprescindível que lhes
dediquemos atenção ajustada, nem sobrevalorizando, nem tudo é bullying, o que
promove insegurança e ansiedade, nem desvalorizando, o que pode negligenciar
riscos e sofrimento.
Neste universo importa considerar
dois eixos fundamentais de intervenção por demais conhecidos, a prevenção e a
intervenção depois dos problemas ocorrerem. Esta intervenção pode, por sua vez
e de forma simplista, assumir uma componente mais de apoio e correcção ou
repressão e punição, sendo que podem coexistir. Com alguma demagogia e
ligeireza a propósito do bullying, as vozes a clamar por castigo têm do meu
ponto de vista falado mais alto que as vozes que reclamam por dispositivos de
prevenção, intervenção e apoio para além da óbvia punição, quando for caso
disso.
O volume de episódios mostra a
necessidade de dispositivos de apoio e orientação absolutamente fundamentais
para que pais, professores e alunos possam obter informação e apoio. Existem,
felizmente, várias iniciativas com um trabalho importante mas apesar da
colaboração em projectos nas escolas, estão fora da escola.
A existência de dispositivos de
apoio sediados nas escolas, com recursos qualificados e suficientes, a presença
de assistentes operacionais com funções de supervisão dos espaços escolares, é,
a par de ajustamentos nos modelos de organização e funcionamento das escolas e
de uma séria reestruturação curricular, uma tarefa urgente.
Do meu ponto de vista, o
argumento custos não é aceitável porque as consequências de não mudar são
incomparavelmente mais caras. Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil
dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes evidenciam
no seu dia-a-dia sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos atenção, seja
em casa, ou na escola, espaço onde passam um tempo enorme.
Estes sinais não podem, não
devem, ser ignorados ou desvalorizados. O resultado pode ser grave.
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