Nos últimos dias têm sido constantes as referências ao impacto que o processo de reivindicação dos professores poderá ter nas aprendizagens dos alunos. Também para abordar esta questão fui contactado por jornalistas da Sábado e do Observador. Uma notas recuperando alguns dos tópicos que abordei..
Sem surpresa e em muitas áreas um
processo que envolve a realização de uma greve terá sempre algum tipo de
impacto, sendo a percepção e valorização desse impacto uma pressão para a
negociação, pressão essa as que entidades em litígio têm de gerir.
No caso mais particular dos
professores, parece claro que não se realizando o número de aulas previsto algum
efeito poderá ter no trajecto imediato dos alunos.
Este efeito potencial é de uma
enorme latitude, estará associado, naturalmente, ao número de aulas não
realizadas, à idade dos alunos, ao seu desempenho escolar e dificuldades existentes,
ao contexto familiar, etc.
Como me parece inevitável, só uma
negociação séria e justa ultrapassará a situação de greve. Tenho para mim que
os padrões éticos, deontológicos e profissionais dos professores, técnicos e
assistentes levarão a que seja realizado um esforço que minimize eventuais
fragilidades associadas ao tempo sem aulas que, repito, serão muito
diferenciadas.
Por outro lado, também me parece
que tem sido menos referido o impacto de décadas de políticas públicas de educação que
terão impacto na "ensinagem" e, por consequência, na aprendizagem.
Uma classe profissional maltratada,
desvalorizada socialmente e profissionalmente, sem estabilidade e perspectivas
de carreira, cansada e envelhecida e com quadros de mal-estar preocupantes mais dificilmente consegue manter e desenvolver o esforço necessário ao ensinar. Este
cenário, também pode ter impacto nas aprendizagens, mas é menos referido, por
um lado porque os números do sucesso retratam uma realidade que nem sempre nos
parece “real” e, mais uma vez, o sentido ético, deontológico e profissional dos
professores leva-os, na sua esmagadora maioria, a “dar o litro” na sua parte, a
ensinagem.
Ao falar de impacto na “ensinagem”,
tal como de impacto da aprendizagem, também se deverão considerar dimensões
como recursos disponíveis, humanos (continuam a faltar professores, técnicos e auxiliares), digitais
num tempo em que se proclama a transição digital como “a via”, dispositivos de
apoio suficientes e competentes, climas de escola pouco amigáveis e
envolventes, uma asfixiante burocracia plataformizada e submersa numa pressão
grelhadora que não tem fim e consome tempo e esforço com um retorno baixo na “ensinagem”
e, claro, na aprendizagem.
É tudo isto que está em jogo, é
tudo isto que urge repensar.
Não podemos dissociar a
aprendizagem bem-sucedida da “ensinagem” competente, valorizada, reconhecida, apoiada,
atractiva.
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