O Banco de Portugal divulgou no seu Boletim Económico um trabalho sobre a relação entre o trajecto escolar dos filhos e o estatuto económico e nível de escolarização dos pais. O trabalho foi realizado com dados do Instituto nacional de Estatística de 2019 e do “EU Statistics on Income and Living Conditions”, do Eurostat, de 2021.
Apesar do aumento significativo do nível de escolarização nos
últimos anos os indicadores mostram que apenas cerca de 10% dos filhos de
famílias pobres e com pais com escolaridade até ao 9º chegam ao ensino superior.
O conjunto dos dados apurados sustenta a forte associação entre estatuto
económico e escolarização das famílias e o percurso escolar dos filhos. Nada de
novo, desde que se realizam este tipo de estudos esta relação é evidenciada.
Também sabemos que isto é tanto mais evidente quanto maiores
são os níveis de desigualdade nas comunidades. Em Portugal verifica-se ainda um dos maiores
fossos entre ricos e pobres da União Europeia pelo que a relação entre os
níveis escolar e salarial dos pais e os dos filhos é ainda mais forte. O
trabalho agora apresentado vem, mais uma vez, confirmar a realidade que
conhecemos, a enorme dificuldade da escola de promover mobilidade social, ou
seja, o nível de escolaridade dos pais marca de forma excessiva o nível
atingido pelos filhos. Apesar de alguma evolução, a situação sempre assim foi,
ainda me lembro de quando era pequeno, haver quem se admirasse dos meus pais,
um serralheiro e uma costureira, terem decidido que eu continuaria a estudar
após a escolaridade obrigatória, na época a 4ª classe.
Acresce que as circunstâncias conjunturais e estruturais das
políticas educativas, apesar de alguma recuperação não garantem equidade nas
oportunidades, dificilmente sustentam que a educação e a qualificação também
com equidade.
Deste quadro, resulta uma complexa situação que poderemos de
forma simplista colocar nestes termos, a escola ao acabar por reproduzir a
desigualdade social à entrada, compromete o papel fundamental que lhe cabe na
promoção da mobilidade social, ou seja, a escola que deveria ser parte da solução,
na prática, corre o risco de continuar a ser parte do problema. No entanto e
apesar disto, creio que muito poderá e deverá ser feito no sentido da promoção
efectiva da chamada e distante equidade e igualdade de oportunidades. No
entanto, não teremos alternativa, é a escola pode e deve, de facto, fazer a
diferença.
Assim, mais uma vez, a questão central será a qualidade na
escola pública. Esta qualidade deverá assentar em três eixos fundamentais, a
qualidade considerando resultados, processos, autonomia e gestão optimizada de
recursos, segundo eixo, qualidade para todos, a melhor forma de combater os
mecanismos de exclusão e a desigualdade de entrada e, terceiro eixo,
diferenciação de metodologias, diferenciação progressiva e não prematura dos
percursos de educação e formação.
No actual cenário, quando se entende e espera que a educação
e qualificação possam ter um papel decisivo na minimização de assimetrias, as
políticas, os custos e a dificuldade de acesso podem, pelo contrário, alimentar
essas assimetrias e manter a narrativa, "tal pai, tal filho", pai
(mãe) letrado, filho letrado e pai (mãe) pouco letrado, filho pouco letrado.
Assim sendo, são necessárias políticas públicas para o médio
prazo, estabelecidas com base no interesse de todos, com definição clara de
metas, recursos, processos e avaliação. Apesar de algumas melhorias que se registam, a continuidade de alguns aspectos levará a que daqui a algum
tempo um novo estudo de dentro ou de fora venha dizer ... provavelmente o mesmo.
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