quarta-feira, 11 de maio de 2022

TAL PAI, TAL FILHO

 O Banco de Portugal divulgou no seu Boletim Económico um trabalho sobre a relação entre o trajecto escolar dos filhos e o estatuto económico e nível de escolarização dos pais. O trabalho foi realizado com dados do Instituto nacional de Estatística de 2019 e do “EU Statistics on Income and Living Conditions”, do Eurostat, de 2021.

Apesar do aumento significativo do nível de escolarização nos últimos anos os indicadores mostram que apenas cerca de 10% dos filhos de famílias pobres e com pais com escolaridade até ao 9º chegam ao ensino superior. O conjunto dos dados apurados sustenta a forte associação entre estatuto económico e escolarização das famílias e o percurso escolar dos filhos. Nada de novo, desde que se realizam este tipo de estudos esta relação é evidenciada.

Também sabemos que isto é tanto mais evidente quanto maiores são os níveis de desigualdade nas comunidades. Em Portugal verifica-se ainda um dos maiores fossos entre ricos e pobres da União Europeia pelo que a relação entre os níveis escolar e salarial dos pais e os dos filhos é ainda mais forte. O trabalho agora apresentado vem, mais uma vez, confirmar a realidade que conhecemos, a enorme dificuldade da escola de promover mobilidade social, ou seja, o nível de escolaridade dos pais marca de forma excessiva o nível atingido pelos filhos. Apesar de alguma evolução, a situação sempre assim foi, ainda me lembro de quando era pequeno, haver quem se admirasse dos meus pais, um serralheiro e uma costureira, terem decidido que eu continuaria a estudar após a escolaridade obrigatória, na época a 4ª classe.

Acresce que as circunstâncias conjunturais e estruturais das políticas educativas, apesar de alguma recuperação não garantem equidade nas oportunidades, dificilmente sustentam que a educação e a qualificação também com equidade.

Deste quadro, resulta uma complexa situação que poderemos de forma simplista colocar nestes termos, a escola ao acabar por reproduzir a desigualdade social à entrada, compromete o papel fundamental que lhe cabe na promoção da mobilidade social, ou seja, a escola que deveria ser parte da solução, na prática, corre o risco de continuar a ser parte do problema. No entanto e apesar disto, creio que muito poderá e deverá ser feito no sentido da promoção efectiva da chamada e distante equidade e igualdade de oportunidades. No entanto, não teremos alternativa, é a escola pode e deve, de facto, fazer a diferença.

Assim, mais uma vez, a questão central será a qualidade na escola pública. Esta qualidade deverá assentar em três eixos fundamentais, a qualidade considerando resultados, processos, autonomia e gestão optimizada de recursos, segundo eixo, qualidade para todos, a melhor forma de combater os mecanismos de exclusão e a desigualdade de entrada e, terceiro eixo, diferenciação de metodologias, diferenciação progressiva e não prematura dos percursos de educação e formação.

No actual cenário, quando se entende e espera que a educação e qualificação possam ter um papel decisivo na minimização de assimetrias, as políticas, os custos e a dificuldade de acesso podem, pelo contrário, alimentar essas assimetrias e manter a narrativa, "tal pai, tal filho", pai (mãe) letrado, filho letrado e pai (mãe) pouco letrado, filho pouco letrado.

Assim sendo, são necessárias políticas públicas para o médio prazo, estabelecidas com base no interesse de todos, com definição clara de metas, recursos, processos e avaliação. Apesar de algumas melhorias que se registam, a continuidade de alguns aspectos levará a que daqui a algum tempo um novo estudo de dentro ou de fora venha dizer ... provavelmente o mesmo.

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