De acordo com dados da Direcção-Geral de Estatísticas do Ensino Superior e da Ciência ontem divulgados, neste ano lectivo estão matriculados no ensino superior 416 652, o efectivo mais elevado de sempre. Este indicador associa-se a um aumento de 20% do total de aluno no superior nos últimos seis anos.
Trata-se de uma boa notícia, a qualificação é um bem de primeira
necessidade no nosso país. Contra o que muitas vezes se ouve, não somos um país
de doutores. Não temos qualificação a mais, temos desenvolvimento a menos.
No entanto, temos um ensino superior caro, com custos
elevados para as famílias. O desafio que agora se coloca, sobretudo em tempos
tão exigentes e no meio de um período de aumento do custo de vida, é evitar o abandono
dos jovens que agora começam a carreira no superior, assim como, dos que já o
frequentam.
No ano lectivo anterior candidataram-se a bolsa mais de 100 000
estudantes, o mais elevado de sempre. É verdade que também se tinha verificado
um aumento do número de alunos, verificaram-se alterações no regulamento de
atribuição de bolsas, mas também se sabe da perda de rendimento de muitas
famílias em consequência do impacto económico e social da pandemia.
Algumas notas que já aqui tenho colocado começando por
alguns dados.
De acordo com Relatório do CNE, "Estado da Educação
2019", a percentagem de alunos que em Portugal acede a bolsas de estudo
para o 1º ciclo está no segundo escalão mais baixo da análise, entre 10 e
24,9%. Para comparação, Irlanda, Países Baixos estão no intervalo entre 25% e
49,9% e a Suécia no superior a 75%. Países como Espanha, França, Reino Unido e
muitos outros têm percentagens de alunos com apoio superiores a nós e, sem
estranheza, também maior nível de qualificação.
Em 2018 foi divulgado um estudo já aqui citado, “O Custo dos
Estudantes no Ensino Superior Português” da responsabilidade do Instituto de
Educação da U. de Lisboa, relativo ao ano lectivo de 2015/2016 mostrando que
cada estudante universitário gastou em média 6445€ em despesas como propinas,
material escolar, alojamento ou alimentação. Os alunos de instituições
universitárias privadas têm uma despesa perto dos 10000€ e nos politécnicos
privados o custo será de 8296€. De facto, sendo a qualificação superior um bem
de primeira necessidade para os cidadãos e para o país, é um bem muito caro,
demasiado caro para muitas famílias e indivíduos.
Também dados de um trabalho conhecido em 2018 realizado pelo
Projecto Eurostudent “Social and Economic Conditions of Student Life in Europe”
mostra um extenso quadro das condições de frequência do ensino superior em
muitos países da Europa com base em dados de 2016 a 2018.
Da imensidade de dados disponíveis releva que Portugal é o
quarto país em que as famílias assumem maior fatia dos gastos com a frequência
do ensino superior. Verifica-se ainda uma forte associação entre a frequência
do ensino superior e nível de escolarização e estatuto económico das famílias.
São conhecidas as dificuldades de promoção de mobilidade
social que o sistema educativo português, e não só, atravessa registando ainda
níveis baixos de qualificação e perto de 160 000 jovens que não estudam nem
trabalham.
Recordo que também em 2014 um estudo patrocinado pela
Comissão Europeia em oito países da Europa revelava, sem surpresa, que Portugal
apresenta uma das mais altas percentagens, 38%, de jovens que gostava de
prosseguir estudos, mas não tem meios para os pagar. Espero que a actual
realidade seja mais positiva apesar das dificuldades.
De acordo com o Relatório da OCDE, “Education at a Glance
2015”, os custos da frequência de ensino superior em Portugal suportados pelo
universo privado, sobretudo as famílias, era o mais alto da União Europeia,
45.7%.
Segundo o relatório "Sistemas Nacionais de Propinas e
Sistemas de Apoio no Ensino Superior 2015-16", da rede Eurydice da União
Europeia apenas Portugal e a Holanda cobram propinas a todos os alunos do
ensino superior, sendo também Portugal um dos países com valores de propina
mais altos, mas como a vimos a percentagem de alunos dos Países Baixos com
bolsa é superior à nossa.
Acresce que as dificuldades sentidas por muitos estudantes
do ensino superior e respectivas famílias, quer no sistema público, quer no
sistema privado com valores mais altos de propinas, são, do meu ponto de vista,
consideradas frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal
entendimento parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um
luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
A qualificação é a melhor forma de promover desenvolvimento
e cidadania de qualidade o que exige torná-la acessível para a generalidade das
famílias.
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