Como sempre, li com muito interesse no Expresso as
referências à intervenção do Ministro da Educação no 2.º Encontro Nacional de
Autonomia e Flexibilidade Curricular ontem realizado
Do que li registei que já não é preciso “ir a países
longínquos para ver um sistema educativo moderno e contemporâneo” porque “a
escola pública portuguesa faz muito e muito bem”.
Não pude deixar de ficar satisfeito porque “Temos níveis
históricos de abandono escolar precoce, numa redução rápida e sustentada. Temos
níveis históricos de sucesso escolar e não fazemos [esse percurso] com o
trabalho de menorizar as aprendizagens – fazemo-lo com este mote (…) de sermos
cada vez mais exigentes naquilo que é a qualidade das aprendizagens”.
Soube com particular agrado que acabou “o tempo do currículo
toca-e-foge, toma lá hoje, debita amanhã, esquece depois de amanhã”, alegando
que, na atualidade, as escolas propõem “um currículo muito mais desafiante e
ambicioso, em que ensinam não apenas coisas que se aprendem e se sabem, mas
também o raciocínio, a resolução de problemas, [a capacidade de] pensar
criticamente e de criar”.
Registei ainda o desagrado do Senhor Ministro, pois “Já
chega de pintar um retrato da escola portuguesa que não corresponde à
realidade. Parece que andam sempre à procura do que corre mal, ignorando que,
todos os dias, nas nossas escolas, há um milhão e 300 mil crianças a aprender e
100 mil professores a ensinar, e que as coisas correm bem”, declarou.
Curiosamente, estas afirmações foram proferidas num encontro
em que se apresentou o estudo, “Observatório Escolar: Monitorização e Ação - Saúde
Psicológica e Bem-estar”, encomendado pelo Ministério da Educação, evidenciando
em síntese que um terço dos alunos inquiridos (cerca de 8 000 e metade dos
docentes inquiridos (cerca de 1400) apresenta sinais de sofrimento psicológico.
Provavelmente, para o Senhor Ministro este quadro é tranquilo, chega de ver
problemas onde não existem.
Nesta intervenção achei também interessante a inevitável referência
ao estudo do bem-estar emocional em contexto educativo como um dos novos
instrumentos a que se pretende recorrer para sustentar as decisões do Ministério
em indicadores concretos “e não em laxismos ou opiniões”.
É verdade que sempre me anima e não esqueço o que de positivo
diariamente acontece nas escolas, mas ao fim de umas décadas, o cansaço é
grande. Sim Senhor Ministro, temos caminhado positivamente em muitos sentidos,
mas estamos longe do que ainda precisamos de caminhar. O desenvolvimento das
sociedades, os períodos críticos pelos quais passamos, a enorme desigualdade
que ainda se verifica, levantam desafios gigantes a alunos, professores e famílias e o "Rolls-Royce" não transporta todos.
Não quero fazer o papel do miúdo que diz que o “rei vai nu”,
primeiro porque já não tenho idade para isso e, segundo, porque não seria de
todo justo, o rei anda composto, por assim dizer.
Também não gosto de me sentir o Waldorf ou o Statler, os
velhos dos Marretas que estão sempre na crítica, até porque, de novo, muita
coisa de bom acontece, mas … a verdade é que julgo que só afirmar a mudança,
ainda que num caminho ajustado, só por si, não significa … que a mudança aconteça generalizadamente.
Décadas de trabalho neste universo não me deixam acreditar na
chegada dos amanhãs que cantam. Não queria repetir porque, sim, existem muitas
coisas muito bonitas, mas … nem tudo vai bem. Não torturemos a realidade que
ela não vai confessar.
Aliás, e pegando na incontornável referência à inclusão, devo
acrescentar que não acredito em escolas inclusivas. Não me batam, tento
explicar.
Como disse Biesta, a história da inclusão é a história da
democracia. Olhando para os tempos actuais e apesar de confiar no poder
transformador da escola a inevitável ligação entre a sociedade e a escola e
sociedade leva a que também nesta se reflictam estes tempos e Portugal não é
excepção.
Acredito sim em escolas e professores, a maioria, que com
visão, competência e esforço assentes em princípios de educação inclusiva
procuram diariamente combater os riscos e as situações de exclusão que muitas
crianças pelas mais variadas razões correm ou vivem.
Precisamos de políticas públicas integradas e adequadas.
Projectos, iniciativas, inovação, actividades que, demasiadas vezes chegam do
exterior às escolas, podem ser interessantes … mas não são mágicos por mais que
num exercício de "wishful thinking" os queiramos entender e vender
como tal.
Daí este meu cansaço.
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