Quando em Maio de 2015 li no
Programa do PS que seria realizada “A aposta educativa numa escola inclusiva de
2ª geração que deverá intervir no âmbito da educação especial e da organização
dos apoios educativos às crianças e aos jovens que deles necessitam” tentei
perceber o que seria uma escola inclusiva de 2º geração mas não consegui entender.
Acompanhei com esperança e
expectativa a mais do que necessária, reafirmo, mudança legislativa desencadeada
no âmbito da Educação Inclusiva que se traduziu no DL 54/2018 ele próprio associado
a todo um quadro de mudança envolvendo, designadamente a definição do Perfil
dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, das Aprendizagens Essenciais ou
do Decreto-Lei n.º 55/2018 relativamente ao currículo. Todo este edifício
potenciaria a inovação, a mudança de paradigma, de vários paradigmas aliás, e
alguns falavam mesmo da revolução que estava em marcha.
Com confiança em algumas virtudes
do novo quadro aguardei expectante pela revelação da escola inclusiva de 2ª
geração. No entanto, para meu desconforto e cansaço, o que vou conhecendo e vai
sendo divulgado ainda não me ajudou a perceber o que seria.
Continuo a verificar que tal como
aconteceu com o velho 319/91 (nesta altura eu já trabalhava neste universo há
15 anos), quer com o 3/2008 e agora com o 54/2018 existiam e existem
professores e escolas a realizar trabalhos notáveis que devem ser conhecidos e
reconhecidos.
A avaliação das crianças, a
definição dos apoios nas diferentes tipologias (já usadas como categorização
uma vez que a outra categorização já não existe), o funcionamento das Equipas,
os recursos disponíveis, a organização da intervenção, os papéis ou a
articulação dos intervenientes está a criar nas escolas inúmeros sobressaltos. Recebo muitos testemunhos e dados mais robustos já conhecidos não são
particularmente animadores. A tudo isto não terá sido alheio o discutível processo
de operacionalização da mudança mesmo que sustentada por um Manual de Apoio,
algo de estranho a um processo que assenta num racional de diferenciação,
abordagem multinível ou desenho universal de aprendizagem, chamem-lhe o que
quiserem, que é incompatível com um …Manual, quando muito com Orientações.
Como já escrevi há algum tempo, o
cansaço é muito embora sempre me anime quando conheço situações muito positivas
que felizmente acontecem todos os dias em tantas escolas.
Não quero fazer o papel do miúdo
que diz que o “rei vai nu”, primeiro porque já não tenho idade para isso e,
segundo, porque não seria de todo justo.
Também não gosto de me sentir o
Waldorf ou o Statler, os velhos dos Marretas que estão sempre na crítica, até
porque, de novo, muita coisa de bom acontece, mas … a verdade é que julgo que
só mudar, ainda que num caminho ajustado não significa … mudar.
No meio deste desconforto li o
texto do Professor Fernando Elias no Público, “As linhas com que se pode coser a Escola” e foi uma revelação, o
caminho está iluminado, os amanhãs cantam finalmente, “Os desafios e
oportunidades para a transformação das escolas estão aí. Transformar a “Escola
que temos” na “Escola que queremos”.
Agora e finalmente percebi o que provavelmente
serão as escolas inclusivas de 2ª geração … realidade virtual.
Não queria repetir, sim, existem
muitas coisas muito bonitas, como certamente no Agrupamento liderado pelo Professor Fernando Elias, mas … nem tudo vai bem. Não torturem a realidade
que ela não vai confessar.
Aliás, devo acrescentar que não acredito em escolas inclusivas. Não me batam, tento explicar.
Como disse Biesta, a história da inclusão é a história da democracia. Olhando para os tempos actuais e apesar de confiar no poder transformador da escola a inevitável ligação entre a sociedade e a escola e sociedade leva a que também nesta se reflictam estes tempos e Portugal não é excepção.
Acredito sim em escolas e professores, a maioria, que com visão, competência e esforço assentes em princípios de educação inclusiva procuram diariamente combater os riscos e as situações de exclusão que muitas crianças pelas mais variadas razões correm ou vivem.
Quadros legislativos mais adequados são essenciais ... mas não são mágicos por mais que num exercício de "wishful thinking" os queiramos entender e vender como tal.
Daí este meu cansaço.
Aliás, devo acrescentar que não acredito em escolas inclusivas. Não me batam, tento explicar.
Como disse Biesta, a história da inclusão é a história da democracia. Olhando para os tempos actuais e apesar de confiar no poder transformador da escola a inevitável ligação entre a sociedade e a escola e sociedade leva a que também nesta se reflictam estes tempos e Portugal não é excepção.
Acredito sim em escolas e professores, a maioria, que com visão, competência e esforço assentes em princípios de educação inclusiva procuram diariamente combater os riscos e as situações de exclusão que muitas crianças pelas mais variadas razões correm ou vivem.
Quadros legislativos mais adequados são essenciais ... mas não são mágicos por mais que num exercício de "wishful thinking" os queiramos entender e vender como tal.
Daí este meu cansaço.
6 comentários:
O retrato de muitas escolas que infelizmente conheço:
E porque não mudar de cima para baixo?
As mudanças organizacionais estão dependentes da disponibilização de recursos humanos e materiais às Escolas.
Da reforma do atual modelo de Direção e Coordenação, em que a chefia se assume como a absoluta autoridade em relação aos seus subordinados, os outros docentes e demais funcionários dos Agrupamentos.
Este modelo atual de chefia, que existe em muitos Agrupamentos e Escolas, em que os docentes subordinados têm de seguir a visão do Diretor, e cumprir estritamente as suas ordens tem contribuído para tornar a Escola obsoleta e desadaptada às realidades do contexto social. É necessária a renovação urgente deste modelo de chefia, já antiquado e abandonado por muitas empresas, baseado no autoritarismo, no cumprimento de tarefas e ordens sem possibilidade de questionar, com receio de reprimenda, ameaça e assédio moral.
Uma Liderança em que seja valorizado o trabalho de equipa, o respeito e a contribuição de todos os docentes. Em que seja implementado um ambiente inclusivo que demonstre preocupação pelo sucesso e bem-estar de todos os funcionários das Escolas/Agrupamentos. Um ambiente onde todos são chamados a contribuir com as suas ideias e se sintam envolvidos cria deste modo, um ambiente inclusivo e motivador de aprendizagens significativas para todos os alunos da Escola.
Também o facto do Diretor(a) não ser eleito de entre os seus pares tem causado alguns constrangimentos: alguém distante que não se envolve na dinâmica de Escola, autoritarismo e desmando, falta de competências sociais, de educação e até de mérito para o exercício das funções.
Numa Escola/Agrupamento, que promova o pensamento único é lógico, que não poderá haver mudança. Ou qualquer mudança que ocorra será sempre desviante. Como poderá uma Escola/Agrupamento que se reja por estas premissas proporcionar um ambiente inclusivo amigável de aprendizagem?
Estes novos Decretos-lei 54 e 55, esta visão holística das aprendizagens, assente nos princípios de autonomia e liberdade pressupõe que os docentes planeiem e desenvolvam o seu trabalho em equipa, de acordo com a sua especificidade e que também tenham uma certa autonomia para desenvolver o seu trabalho. Se existir mau ambiente, falta de respeito, se não conseguirem trabalhar em equipa, se nem conseguirem apresentar propostas de trabalho, como conseguiram trabalhar de acordo com os normativos?
Como poderão as escolas/agrupamentos com este tipo de organização garantir que todos os alunos atinjam o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória?
Parece-me pertinente o seu comentário. A reflexão sobre a real autonomia das escolas é muito pertinente como também sobre o modelo de governança, unipessoal ou colegial com eleição pela comunidade educativa e não pelo Conselho Geral. Vamos ver como evolui,
Professor, e qual é o seu contributo específico para a formação de quem está na escola? Acredita nos professores, mas quando algum dá testemunho são "amanhãs que cantam". Repete que precisamos de recursos na escola, e se precisamos, mas não nos dá uma linha sobre como organizar os recursos. Sinceramente, acho pouco o que diz. É a voz do eterno lamento e não das propostas de um especialista na matéria.
Eu sou mãe de um filho autista. E sei o quanto a escola exclui e também sei que esta legislação é o caminho para tirar o meu filho de uma unidade onde estava com autistas profundos sem qualquer hipótese de desenvolvimento. Agora tive a oportunidade para poder discutir noutros termos na escola. Não foi fácil garanto-lhe. Não, não é verdade que as escolas fizessem tudo bem e também não é verdade que os que tentam mudar estejam em amanhãs que cantam. Esperava mais de um universitário que trabalha em educação especial do que o desrespeito pelas escolas que estão mesmo a fazer caminho na inclusão.
Cara mãe, embora por princípio não responda a comentários anónimos a importância do que diz justufica umas pequenas notas neste espaço pouco adequado desejando muito ter uma oportunidade para conversar consigo.
Como disse no texto existe muito de bom, recordo alguns excertos "“Continuo a verificar que tal como aconteceu com o velho 319/91 (nesta altura eu já trabalhava neste universo há 15 anos), quer com o 3/2008 e agora com o 54/2018 existiam e existem professores e escolas a realizar trabalhos notáveis que devem ser conhecidos e reconhecidos”
“… o cansaço é muito embora sempre me anime quando conheço situações muito positivas que felizmente acontecem todos os dias em tantas escolas.”
“… sim, existem muitas coisas muito bonitas, como certamente no Agrupamento liderado pelo Professor Fernando Elias, mas … nem tudo vai bem”.
O meu ponto é que nem tudo vai bem. Fico muito satisfeito de saber como positivo está a ser o processo do seu filho e se me tem companhado sabe que muitas vezes escrevi que as Unidades eram guetos, ferramentas de exclusão, em nome da inclusão. No entanto o que recebo regularmente são problemas colocados por mães/pais, professores (regular e especial) colegas psicólogos reportando problemas. Preferia que assim não fosse mas é a realidade. O que de facto não gosto de ouvir a gente responsável e me leva a reagir é que "tudo está bem feito e pensado" e "as escolas só não fazem porque não querem". Isto é que não é verdade. E quando se diz que tudo está bem, está-se criar obstáculos a que se mude porque ... mudar o quê se a coisa está bem.
Quanto ao meu tabalho pessoal, embora o currículo seja público e não goste o promover nestes contextos, comecei há 43 anos a trabalhar nesta área, trabalho em formação de psicólogos mas também em formação de professores, inicial e contínua, trabalho com pais e associações, tenho centenas de intervenções em escolas e agrupamentos, se estiver interessada convido-a para assistir a uma das próximas, tenho livros e artigos escritos sobre estas matérias, para além de muitos textos por aqui. No entanto, está no seu direito de afirmar que não conhece uma linha, nem uma proposta. Ainda há pouco aqui disse o que me parece que deveria ter sido feito para implementar o DL 54/2018. Talvez pela minha formação sou cauteloso na produção de juízos sobre as pessoas, não desrespeitei, ninguém. Os pais, os professores, os técnicos que todos os dias fazem coisas excelentes não mereciam que o fizesse.
Se tiver oportunidade e interessse proponho uma conversa que talvez fosse mais esclarecedora.
Muito obrigado pelo seu comentário e que tudo continue a correr bem com o seu filho.
Professor, agradeço a sua disponibilidade para me responder e desculpe não ter posto o meu nome. Acho que ninguém diz que está tudo bem. Vejo que dizem que há quem diz que está tudo bem.
Era mesmo essa reflexão que lhe pedia. Se tem 43 anos de trabalho nesta área, se formou tanta gente, por que é a inclusão ainda uma realidade tão distante?
Olá Mãe Teresa, obrigado. A grande dificuldade, do meu ponto de vista, começa no facto de que,como escrevi, o mundo da escola é sempre um reflexo do mundo. Dramaticamente o mundo actual tem pouco de inclusivo, é altamente competitivo. Por outro lado, a educação é sempre palco de disputas e agendas que estão para além do bem superior que deveria ser o bem estar e sucesso dos alunos, de todos os alunos. Acresce que nas últimas décadas as políticas públicas passam por sucessivas alterações sem que se avalie suficientemente bem porquê e o quê mudar. Promovem-se mudanças avulsas, desgarradas e, logo a seguir, muda-se outra vez. Ainda em matéria de políticas públicas coloca-se a questão dos recursos, da organização, da burocracia e também de alguma incompetência. Um pequeno exemplo que felizmente foi corrigido embora seja cedo para avaliar o resultado. O 3/2008 previa uma coisa bizarra chamada CEI - Currículo Específico Individual. Pense comigo, por favor, pode haver um Currículo Individual que não seja Específico?!!! para mais e mais grave que a estranha designação é que o recurso ao CEI atropelou muitas crianças sem qualquer justificação condenando-as a um percurso de exclusão. É só um exmplo que tantas e tantas vezes referi em público e em diferentes fóruns. Eu sou optimista e creio que temos e vamos avançando mas para que este percurso seja de mais qualidade e que chegue a mais crianças é preciso que sejamos realistas, identifiquemos problemas e encontremos soluções. É a minha única preocupação e preferia não ter que dizer coisas menos positivas mas sinto que tenho a responsabilidade ética e deontológica de não esconder o que penso, posso estar errado e mostrem-me que sim, mas minha preocupação é exclusivamente o bem estar dos miúdos, de todos os miúdos, das famílias e dos profissionais. Continua de pé a ideia da conversa e se achar por bem contacte-me por mail, dou-lhe um contacto pessoal. É assim que, creio, conseguimos ir melhorando. Cumprimentos e obrigado pelos comentários.
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