quinta-feira, 23 de novembro de 2023

OS TEMPOS DA ESCOLA

 No Público encontra-se um texto de opinião de Margarida Marrucho Mota Amador, “Semestralidade: sinal de mudança”, sobre a organização do ano lectivo em semestres. Algumas das opiniões expressas levantam-me sérias dúvidas, recorrer à semestralidade “para que as populações escolares acima da média possam ser melhores, dentro do conceito de disciplinas anuais que o currículo do ensino básico acarreta”, por exemplo, sendo outras de considerar.

Neste contexto, umas notas sobre os tempos da escola.

Na verdade, não tenho uma posição fechada sobre a organização do ano escolar em semestres ou em trimestres. Tenho acompanhado as experiências já desenvolvidas organização em dois semestres e as avaliações o que são conhecidas são genericamente positivas, o que não me surpreende pois, se assim não fosse, teríamos um sério problema com esta inovação.

Acontece até que no concelho onde vivo a opção pela semestralidade permite-me ir acompanhando o trabalho escolar dos meus netos.

No entanto e certamente por défice de informação, não conheço e gostava de conhecer, estudos com alguma robustez metodológica que identifiquem com clareza uma relação entre o funcionamento em semestres e a mudança em dimensões identificadas do processo de ensino e aprendizagem.

Por outro lado, as questões que muitas vezes se colocam relativamente à organização por trimestres decorrem do calendário ser “indexado” ao calendário de festas o que cria desajustados desequilíbrios na duração dos três períodos com o potencial impacto nos processos educativos.

Assim sendo, é uma questão que merece reflexão alargada a diferentes actores, estudando experiências de outros sistemas e com o recurso à avaliação do que já foi realizado.

Nesta reflexão deveria estar incluída a discussão dos benefícios ou de eventuais efeitos negativos da criação de uma “pausa” a meio do primeiro período modelo existente em vários países e também no modelo de semestres que melhor conheço.

Creio que seria desejável que pudéssemos reflectir de forma global para os tempos da escola considerando outros aspectos. Nesta reflexão poderia estar incluída a discussão dos benefícios e eventuais efeitos negativos da criação de uma “pausa” a meio do primeiro período modelo existente em vários países.

Para esta reflexão pode ser útil recordar um estudo da rede “EurydiceTime in Europe - Primary and General Secondary Education 2019/20” ou dados do trabalho da OCDE, “Education at a Glance 2019”.

Tal como tem sido mostrado em estudos anteriores os alunos portugueses são dos que têm menos dias de aula no contexto europeu, mas, curiosamente, as horas de aula são mais elevadas que a média, considerando horário curricular e AEC. Os alunos do 1º ciclo os que mais horas de aula têm durante o ciclo, cerca 1200 horas a mais face à média europeia.

Não será fácil o estabelecimento de um consenso sobre a “melhor” organização dos tempos da escola, as comparações internacionais devem ser cautelosas pois as variáveis a considerar são múltiplas, a organização curricular, a realização dos exames, clima ou o parque escolar são algumas das que importa não esquecer e analisar.

No entanto, para além da questão de semestres ou trimestres, do meu ponto de vista, seria interessante reflectir de forma mais global sobre os tempos da escola considerando outros aspectos.

Num país com as nossas condições climáticas, tal como genericamente no sul da Europa, e considerando boa parte do nosso parque escolar, aulas prolongadas até ao Verão seriam algo de, literalmente, sufocante.

Reconhecendo que a guarda das crianças nos horários laborais das famílias é um problema sério e que entendo, também creio que não pode ser resolvido prolongando até ao “infinito”, a infeliz ideia de “Escola a Tempo Inteiro” em vez de “Educação a Tempo Inteiro”, a estadia dos alunos na escola. A “overdose” é sempre algo de pouco saudável.

No que respeita aos tempos escolares já sabíamos, como referi acima, que os alunos portugueses, sobretudo no início da escolaridade, têm umas das mais elevadas cargas horárias. Como bem se sabe, mais horas de trabalho não significam melhor trabalho e os alunos portugueses já passam um tempo enorme na escola. Talvez seja de introduzir nesta equação a variável “áreas disciplinares e currículos”, considerando o número de áreas ou disciplinas, duração das aulas, organização de anos e de ciclos, etc.

Neste contexto, insisto, seria desejável reflectir sobre os tempos da escola com tempo, prudência e participação dos diferentes envolvidos e com base em evidência recolhida em diferentes cenários.

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