No Público encontra-se um texto de opinião de Margarida Marrucho Mota Amador, “Semestralidade: sinal de mudança”, sobre a organização do ano lectivo em semestres. Algumas das opiniões expressas levantam-me sérias dúvidas, recorrer à semestralidade “para que as populações escolares acima da média possam ser melhores, dentro do conceito de disciplinas anuais que o currículo do ensino básico acarreta”, por exemplo, sendo outras de considerar.
Neste contexto, umas notas sobre os tempos da escola.
Na verdade, não tenho uma posição
fechada sobre a organização do ano escolar em semestres ou em trimestres. Tenho
acompanhado as experiências já desenvolvidas organização em dois semestres e as
avaliações o que são conhecidas são genericamente positivas, o que não me
surpreende pois, se assim não fosse, teríamos um sério problema com esta
inovação.
Acontece até que no concelho onde
vivo a opção pela semestralidade permite-me ir acompanhando o trabalho escolar
dos meus netos.
No entanto e certamente por
défice de informação, não conheço e gostava de conhecer, estudos com alguma
robustez metodológica que identifiquem com clareza uma relação entre o
funcionamento em semestres e a mudança em dimensões identificadas do processo
de ensino e aprendizagem.
Por outro lado, as questões que
muitas vezes se colocam relativamente à organização por trimestres decorrem do
calendário ser “indexado” ao calendário de festas o que cria desajustados
desequilíbrios na duração dos três períodos com o potencial impacto nos
processos educativos.
Assim sendo, é uma questão que
merece reflexão alargada a diferentes actores, estudando experiências de outros
sistemas e com o recurso à avaliação do que já foi realizado.
Nesta reflexão deveria estar
incluída a discussão dos benefícios ou de eventuais efeitos negativos da
criação de uma “pausa” a meio do primeiro período modelo existente em vários
países e também no modelo de semestres que melhor conheço.
Creio que seria desejável que
pudéssemos reflectir de forma global para os tempos da escola considerando
outros aspectos. Nesta reflexão poderia estar incluída a discussão dos
benefícios e eventuais efeitos negativos da criação de uma “pausa” a meio do
primeiro período modelo existente em vários países.
Para esta reflexão pode ser útil
recordar um estudo da rede “EurydiceTime in Europe - Primary and General
Secondary Education 2019/20” ou dados do trabalho da OCDE, “Education at a
Glance 2019”.
Tal como tem sido mostrado em
estudos anteriores os alunos portugueses são dos que têm menos dias de aula no
contexto europeu, mas, curiosamente, as horas de aula são mais elevadas que a
média, considerando horário curricular e AEC. Os alunos do 1º ciclo os que mais
horas de aula têm durante o ciclo, cerca 1200 horas a mais face à média
europeia.
Não será fácil o estabelecimento de
um consenso sobre a “melhor” organização dos tempos da escola, as comparações
internacionais devem ser cautelosas pois as variáveis a considerar são
múltiplas, a organização curricular, a realização dos exames, clima ou o parque escolar são algumas das que
importa não esquecer e analisar.
No entanto, para além da questão
de semestres ou trimestres, do meu ponto de vista, seria interessante reflectir
de forma mais global sobre os tempos da escola considerando outros aspectos.
Num país com as nossas condições
climáticas, tal como genericamente no sul da Europa, e considerando boa parte
do nosso parque escolar, aulas prolongadas até ao Verão seriam algo de,
literalmente, sufocante.
Reconhecendo que a guarda das
crianças nos horários laborais das famílias é um problema sério e que entendo,
também creio que não pode ser resolvido prolongando até ao “infinito”, a
infeliz ideia de “Escola a Tempo Inteiro” em vez de “Educação a Tempo Inteiro”,
a estadia dos alunos na escola. A “overdose” é sempre algo de pouco saudável.
No que respeita aos tempos
escolares já sabíamos, como referi acima, que os alunos portugueses, sobretudo
no início da escolaridade, têm umas das mais elevadas cargas horárias. Como bem
se sabe, mais horas de trabalho não significam melhor trabalho e os alunos
portugueses já passam um tempo enorme na escola. Talvez seja de introduzir
nesta equação a variável “áreas disciplinares e currículos”, considerando o
número de áreas ou disciplinas, duração das aulas, organização de anos e de
ciclos, etc.
Neste contexto, insisto, seria
desejável reflectir sobre os tempos da escola com tempo, prudência e
participação dos diferentes envolvidos e com base em evidência recolhida em
diferentes cenários.
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