Foi divulgado o segundo relatório
intercalar da Comissão de Análise Integrada da Delinquência Juvenil e da
Criminalidade Violenta (CAIDJCV), coordenada por Isabel Oneto e integra
elementos de diferentes ministérios.
Como se lê na peça do Público,
para além do aumento de situações é particularmente preocupante a severidade
dos comportamentos, o abaixamento da idade dos intervenientes, a sensação de
impunidade percebida, o nível de ocorrências de criminalidade grupal entre jovens
entre outras dimensões.
É também relevante a valorização da resposta dada pelos centros educativos em comparação com a colocação dos jovens em casas de acolhimento
Tenho bordado aqui esta questão,
delinquência e violência juvenil, e este relatório justifica que volte a esta
matéria começando por recordar alguns dados.
Segundo o Relatório Anual de
Segurança Interna de 2021 verificou-se um aumento de 7,3% do número de
ocorrências e no RASI de 2022 de 50,6%. Estes números dizem respeito a factos
qualificados como crimes, mas cometidos por jovens entre os 12 e os 16 anos,
idade a partir da qual se pode ser responsabilizado por um ilícito criminal.
Também a criminalidade grupal cresceu em 2022 (18%) relativamente ao ano
anterior, contabilizando 5895 ocorrências, ou seja, mais 11,5% do que as
registadas em 2019.
A criminalidade grupal tem gerado
uma preocupação crescente pois tem vindo a aumentar, a envolver adolescentes
cada vez mais novos e mais raparigas. De acordo com dados da PSP estes grupos
são distintos dos gangues, são constituídos por três a trinta elementos, não
têm organização estruturada e muitos dos seus elementos têm “insucesso escolar,
famílias fragilizadas, percursos desviantes” e as vítimas são também
predominantemente jovens.
Mais alguns dados relativos a
2019 considerando a violência nas relações de namoro. Um trabalho de 2020 da
União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) que envolveu 4598 jovens, do
7.º ao 12.º com idade média de 15 anos, mostrou que para 67% é normal algum
tipo de violência e 58% já terá sofrido pelo menos um comportamento de
agressão.
Relativamente ao bullying, os
estudos em Portugal sugerem uma prevalência entre 10 e 25% e a OMS indica que 1
em cada 3 crianças ou adolescentes será vítima de bullying. No caso mais
particular do bullying homofóbico, um trabalho da Associação ILGA Portugal
(2018) envolvendo 700 jovens dos 14 e aos 20 anos, refere que 73,6% já sentiu
alguma forma de exclusão intencional por parte dos colegas.
Consumo de drogas, dados de 2019.
Entre os 13 e os 18 anos aumentou o consumo de drogas não canábis e no grupo de
18 anos aumentou o consumo de canábis. O número de overdoses aumenta há três
anos. O consumo de álcool por jovens está a aumentar desde 2017.
Deixem-me insistir em duas ou
três notas que retomo de reflexões anteriores.
Os estilos de vida, as exigências
de qualificação têm tornado gradualmente a escola mais presente e durante mais
tempo na vida de crianças e adolescentes e, consequentemente, com reflexos na
educação em contexto familiar.
Creio que já dificilmente se
entende que a “família educa e a escola instrói”.
Creio que já dificilmente se
entende que a escola forma “técnicos” e não cidadãos, pessoas, com
qualificações ao nível dos conhecimentos em múltiplas áreas. Aliás, se bem
repararem falamos de sistemas de educação e não de sistemas de ensino e ainda
bem que assim é.
Creio que já dificilmente se
entende que o conhecimento é asséptico. O conhecimento, a sua produção e a sua
divulgação, tem, deve ter, sempre um enquadramento ético e não é imune a
valores.
Creio que os tempos mais recentes
são elucidativos de como a abordagem de matérias como Direitos Humanos;
Igualdade de Género; Interculturalidade; Desenvolvimento Sustentável; Educação
Ambiental; Saúde; Sexualidade; Media; Instituições e Participação Democrática;
Literacia Financeira e Educação para o Consumo; Segurança Rodoviária; Risco,
Empreendedorismo; Mundo do Trabalho, Segurança defesa e paz, Bem-estar animal e
Voluntariado são fundamentais ao longo do processo de formação de crianças,
jovens e adultos.
Nas sociedades contemporâneas um
sistema público de educação com qualidade, desde há muito de frequência
obrigatória e progressivamente mais extenso, é uma ferramenta fundamental para
a promoção de igualdade de oportunidades, de equidade e de inclusão. Uma
educação global de qualidade é de uma importância crítica para minimizar o
impacto de condições sociais, económicas e familiares mais vulneráveis.
Considerando todo este universo
parece-me claro que as matérias integradas na "Educação para a
Cidadania" devem obrigatoriamente fazer parte do trabalho desenvolvido na
educação em contexto escolar. Com o mesmo objectivo será importante o desenvolvimento
de programas de natureza comunitária envolvendo diferentes áreas das políticas
públicas.
Precisamos e devemos discutir
como fazer sempre, com que recursos e objectivos, promover a autonomia das
escolas, também nestas questões. Por outro lado, não acredito na
“disciplinarização” destas matérias, julgo mais interessantes iniciativas
integradas, simplificadas e desburocratizadas em matéria de organização e
operacionalização.
Sabemos que a prevenção e
programas de natureza comunitária, socioeducativa, têm custos, mas importa
ponderar entre o que custa prevenir e os custos posteriores da pobreza,
exclusão, delinquência continuada e insegurança.
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