Está a decorrer em Coimbra uma Conferência sobre Segurança Urbana organizada pelo MAI. Uma das matérias abordadas e que gera uma preocupação crescente foi a actividade delinquente de grupos de jovens que tem vindo a aumentar, a envolver adolescentes cada vez mais novos e mais raparigas. De acordo com dados da PSP estes grupos são distintos dos gangues, são constituídos por três a trinta elementos, não têm organização estruturada e muitos dos seus elementos têm “insucesso escolar, famílias fragilizadas, percursos desviantes” e as vítimas são também predominantemente jovens.
Deixem-me insistir em duas ou três notas que retomo de
reflexões anteriores.
Os estilos de vida, as exigências de qualificação têm
tornado gradualmente a escola mais presente e durante mais tempo na vida de
crianças e adolescentes e, consequentemente, com reflexos na educação em
contexto familiar.
Creio que já dificilmente se entende que a “família educa e
a escola instrói”.
Creio que já dificilmente se entende que a escola forma
“técnicos” e não cidadãos, pessoas, com qualificações ao nível dos
conhecimentos em múltiplas áreas. Aliás, se bem repararem falamos de sistemas
de educação e não de sistemas de ensino e ainda bem que assim é.
Creio que já dificilmente se entende que o conhecimento é
asséptico. O conhecimento, a sua produção e a sua divulgação, tem, deve ter,
sempre um enquadramento ético e não é imune a valores.
Creio que os tempos mais recentes são elucidativos de como a
abordagem de matérias como Direitos Humanos; Igualdade de Género;
Interculturalidade; Desenvolvimento Sustentável; Educação Ambiental; Saúde;
Sexualidade; Media; Instituições e Participação Democrática; Literacia
Financeira e Educação para o Consumo; Segurança Rodoviária; Risco,
Empreendedorismo; Mundo do Trabalho, Segurança defesa e paz, Bem-estar animal e
Voluntariado são fundamentais ao longo do processo de formação de crianças,
jovens e adultos.
Nas sociedades contemporâneas um sistema público de educação
com qualidade, desde há muito de frequência obrigatória e progressivamente mais
extenso, é uma ferramenta fundamental para a promoção de igualdade de
oportunidades, de equidade e de inclusão. Uma educação global de qualidade é de
uma importância crítica para minimizar o impacto de condições sociais,
económicas e familiares mais vulneráveis.
Vejamos alguns dados que, do meu ponto de vista, justificam
com clareza a ideia de que “Educação e Cidadania para todos, porque sim”.
De acordo com o Relatório Anual de Segurança Interna
relativo a 2021 alguns indicadores no que respeita aos comportamentos de
adolescentes e jovens. Os crimes que envolvem grupos de indivíduos entre os 15
e os 25 subiu 7,7% e a criminalidade juvenil, entre os 12 e os 16 anos,
aumentou 7,3%, o segundo maior aumento da última década.
Considerando as ocorrências registadas em meio escolar em
20/21, regista-se uma diminuição de 6,8%, tendo-se evidenciado um abaixamento
do número de registos em todos os tipos de ilícito à excepção das ofensas
sexuais.
Mais alguns dados relativos a 2019 considerando a violência
nas relações de namoro. Um trabalho de 2020 da União de Mulheres Alternativa e
Resposta (UMAR) que envolveu 4598 jovens, do 7.º ao 12.º com idade média de 15
anos, mostrou que para 67% é normal algum tipo de violência e 58% já terá
sofrido pelo menos um comportamento de agressão.
Relativamente ao bullying, os estudos em Portugal sugerem
uma prevalência entre 10 e 25% e a OMS indica que 1 em cada 3 crianças ou
adolescentes será vítima de bullying. No caso mais particular do bullying
homofóbico, um trabalho da Associação ILGA Portugal (2018) envolvendo 700
jovens dos 14 e aos 20 anos, refere que 73,6% já sentiu alguma forma de
exclusão intencional por parte dos colegas.
Consumo de drogas, dados de 2019. Entre os 13 e os 18 anos
aumentou o consumo de drogas não canábis e no grupo de 18 anos aumentou o
consumo de canábis. O número de overdoses aumenta há três anos.
O consumo de álcool por jovens está a aumentar desde 2017 e a delinquência juvenil, entre os 12 e os 16 anos, em 2019 aumentou 5,6% e a criminalidade grupal (gangues) aumentou 15,9%.
Assim e por estas razões simples, entendo que as matérias integradas
na "Educação para a Cidadania" devem obrigatoriamente fazer parte do trabalho
desenvolvido na educação em contexto escolar. Com o mesmo objectivo será
importante o desenvolvimento de programas de natureza comunitária envolvendo
diferentes áreas das políticas públicas.
Precisamos e devemos discutir como fazer sempre, com que
recursos e objectivos, promover a autonomia das escolas, também nestas
questões. Por outro lado, não acredito na “disciplinarização” destas matérias,
julgo mais interessantes iniciativas integradas, simplificadas e
desburocratizadas em matéria de organização e operacionalização.
Sabemos que a prevenção e programas de natureza comunitária, socioeducativa, têm custos, mas importa ponderar entre o que custa prevenir e os custos posteriores da pobreza, exclusão, delinquência continuada e da insegurança.
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