O I traz uma peça muito curiosa sobre a “febre” da colecção de cromos que a propósito da realização do próximo mundial de futebol se faz sentir e dos “negócios" que gera. A leitura recordou-me uma cena que, de certa forma, também ilustra os tempos em que vivemos e a forma como olhamos para as “coisas” dos miúdos que, como se percebe,espelham as coisas dos adultos como, aliás, o trabalho do I mostra.
Estava na papelaria do meu bairro a comprar o jornal, apesar
da leitura online ainda não consigo viver sem um jornal em papel, e à minha
frente estava um pai com um gaiato de uns sete ou oito anos. O senhor perguntou
à D. Fátima se já tinha recebido os cromos de uma colecção de que não fixei o
nome. A senhora respondeu que sim, já há uns dias que tinha as carteiras de
cromos e as cadernetas. O miúdo referiu que sabia disso porque os colegas da
escola já tinham começado a colecção e pediu ao pai para comprar umas carteiras
e uma caderneta. O pai, certamente um pai cuidador e atento, pediu então a
caderneta e umas dezenas de carteiras de cromos. É verdade, umas dezenas de
carteiras de cromos. Gastou, creio, que um pouco mais de vinte euros e o miúdo
levou carteiras para estar um bom bocado a abrir.
Devo estar a ficar velho, mas fiquei a pensar. Para além do
valor gasto, não sei se muito ou pouco significativo para aquela família,
lembrei-me que no meu tempo, é mesmo conversa de velho, mas também no tempo do
meu filho, fazer uma colecção de cromos era isso mesmo, coleccionar, não era
comprar uma colecção de cromos. Fazer uma colecção era entrar numa espécie de
rede social antes do Facebook, era saber quem fazia a colecção, quem tinha
cromos e quais para trocar, usar uma lista com os cromos em falta e passar
muito tempo em negociações com os coleccionadores para, de descoberta em
descoberta, ir completando a colecção. Este processo arrastava-se no tempo e
quando se aproximava o fim, quando já só faltavam um ou dois cromos, "os
mais difíceis" a adrenalina subia e os negócios eram mais difíceis, por
vezes conseguir um dos "tais" obrigava trocá-lo por muitos dos
repetidos. Era o mercado a funcionar.
E quando a colecção ficava completa, era o triunfo, até à
próxima colecção, claro.
Ainda gostava que aquele miúdo que estava na papelaria
soubesse o que é fazer uma colecção de cromos, ia ser bom para ele.
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