sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

MUITOS DOS PROBLEMAS DOS PROFESSORES SÃO TAMBÉM PROBLEMAS NOSSOS

 Desculpem a insistência, mas a questão é grave. Também sei que não é por muito falar num problema que ele se resolve ou minimiza.

Estou a referir-me à situação dos professores e ao fortíssimo impacto que os múltiplos problemas que os afectam está a ter e terá no curto e médio prazo na qualidade dos percursos escolares dos alunos. Aliás, com frequência afirmo que muitos dos problemas dos professores são também problemas nossos. É importante que os conheçamos, sem demagogia ou preconceito, e possamos exigir a atenção que merecem, em particular quando esperamos a entrada em funções de um novo Governo com um prazo de validade de quatro anos.

O quadro agora divulgado no recente relatório do CNE, “Estado da Educação 2020” agudiza a necessidade de estabelecer um alerta vermelho no mundo da educação.

Nesta altura do ano escolar continuam a faltar professores em muitas turmas e as dificuldades de recrutamento são crescentes mesmo recorrendo, em algumas situações, à contratação de pessoas sem formação para a docência.

Acentua-se o envelhecimento da classe docente sendo que em 2021 se aposentarão mais de 2000 professores e em 2023 estima-se que serão mais de 3000.

Acrescem os efeitos da mobilidade por doença e ainda uma menor capacidade de atracção pela carreira nos jovens que chegam ao ensino superior nos anos mais recentes. Por outro lado, existem múltiplos aspectos relativos à carreira e à sua valorização com implicações devastadoras nos projectos de vida muitos professores quando uma carreira valorizada deveria constituir um projecto de realização.

Lamentavelmente não é nada de novo, há anos que sucessivos relatórios nacionais e internacionais têm alertado para gravidade do envelhecimento da classe docente, dos efeitos associados, e da certeza da falta de docentes a curto prazo como já está a acontecer. Algumas notas repescadas.

O envelhecimento da classe docente não é um problema exclusivo do nosso sistema, mas é particularmente grave sendo que alguns países também afectados têm iniciativas já em desenvolvimento no sentido de o minimizar o que não parece acontecer entre nós.

Ao perfil dos docentes em termos de idade acresce que, como é reconhecido em qualquer país, a profissão docente é altamente permeável a situações de burnout, estado de esgotamento físico e mental provocado pela vida profissional, frequentemente associado a níveis pouco positivos de satisfação profissional.

Na verdade, este cenário só pode surpreender quem não conhece o universo das escolas, como acontece com boa parte dos opinadores que pululam na comunicação social e dos comentários nas redes sociais dirigidos à educação e aos professores.

Também se sabe que as oscilações da demografia discente não explicam a saída de milhares de professores do sistema, novos e velhos, como também não explicam a insuficiente renovação, contratação de docentes novos. Sem estranheza, no universo do ensino privado é bastante superior a presença de docentes mais jovens, mas também se sente a falta.

Não esqueçamos ainda a deriva política a que o universo da educação tem estado exposto nas últimas décadas, criando instabilidade e ruído permanente sem que se perceba um rumo, um desígnio que potencie o trabalho de alunos, pais e professores. Acresce que sucessivas equipas ministeriais têm desenvolvido políticas que contribuem para a desvalorização dos professores com impacto evidente no clima das escolas e nas relações que a comunidade estabelece com estes profissionais. Este cenário revela uma das dimensões mais frágeis das políticas públicas de educação nos últimos anos em que sempre se insistia na narrativa dos professores a mais com resultados que estão à vista.

Sabemos que os velhos não sabem tudo e os novos nem sempre trazem novidade. Mas também sabemos que qualquer grupo profissional exige renovação por diferentes razões incluindo emocionais, de suporte, partilha de experiência ou pela diversidade.

Parece clara a necessidade urgente de definir uma resposta oportuna e consistente a este trajecto.

Sabemos que os sistemas educativos com melhor desempenho são também os sistemas em que os professores são mais valorizados, reconhecidos e apoiados.

Não parece difícil perceber porquê.

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