Foi divulgado um estudo realizado pela Fundação Gulbenkian e pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, “Práticas Culturais dos Portugueses”. Os resultados estão em linha com os de outros trabalhos com o mesmo objectivo e sublinham o que está por caminhar no sentido de aumentar o consumo de produtos culturais, ferramenta imprescindível no desenvolvimento das sociedades.
Do vasto conjunto de indicadores
umas notas direccionadas para a área dos livros e leitura.
No último ano 61% dos inquiridos não
leu um livro impresso e em formato digital apenas 10% o fizeram. A leitura por
prazer é referida por 10%.
Sem surpresa é também evidenciado
pelo estudo a importância do estatuto socioeconómico e nível de literacia
familiar, sendo que os leitores mais assíduos têm formação superior ou com pais
com esse estatuto académico.
Estando comprovado o impacto relevante
que os estímulos à leitura em contexto familiar assumem na promoção de hábitos
de leitura, é muito significativo registar essa falta incentivo expressa pela
maioria dos inquiridos, 71% nunca foi levado a uma livraria, 77% a uma
biblioteca e 75% a uma feira do livro. Também 47% afirmam nunca ter recebido um
livro e 54% referem que ninguém lhes leu um livro enquanto crianças.
São, na verdade, dados preocupantes,
mas que, lamentavelmente não surpreendem e, naturalmente, reflectem-se no
consumo de bens culturais.
Os bens culturais em Portugal parecem
continuar a ser percebidos como bens supérfluos e não um bem de que
necessitamos. O universo da cultura ainda vive numa apagada e vil tristeza
orçamental. Sabe-se como os museus têm dificuldade em manter portas abertas,
para não falar de investimento e manutenção nos respectivos espólios. As
visitas aos museus têm aumentado, mas sobretudo devido aos visitantes
estrangeiros. Muito do que se realiza em Portugal em matéria de cultura está
dependente de apoios privados, carolice ou mecenato.
Por outro lado, e no que respeita
ao mercado livreiro, creio que uma das grandes razões para o preço dos livros
será o reduzido volume de consumo desse bem por parte do cidadão comum. De
facto, à excepção de alguns, poucos, nomes, edições reduzidas dificultarão, por
questões de escala, o abaixamento do preço. Algumas editoras ou grupos
editoriais têm experimentado o lançamento de colecções com obras a mais baixo
custo, mas muitos dos potenciais compradores dessas obras, já as terão
adquirido pelo que, mais uma vez será difícil que sejam bem-sucedidas essas
edições. Se considerarmos o caso particular da poesia a situação pode ser um
pouco mais negra, basta atentar nas montras ou nas listas dos mais vendidos.
Acresce que o mercado assenta
cada vez mais numa meia dúzia de pontos de venda que asseguram o grosso do
"rendimento" e por uma distribuição que trata, muitas vezes, o livro
como apenas um produto e não o distribui como um "bem". Importa ainda
considerar o aumento exponencial das vendas online cujo circuito acaba por
deixar de fora a livraria mais tradicional, espaço de descoberta, troca de
informação e partilha com gente conhecedora que conhece e ama os livros
No entanto e já o tenho aqui
afirmado, penso que a grande aposta deveria ser no leitor e não no livro, ou
seja, criando mais leitores, talvez as edições, que poderiam em todo o caso ser
menos exigentes em papel e grafismo, ficassem mais acessíveis como se verifica
noutros países. Esta batalha ganha-se na família, na escola e na comunicação
social como os dados agora conhecidos reconhecem.
Será consensual, que a questão central, embora importante, não assenta nos
livros, bibliotecas (escolares ou de outra natureza) ou na presença crescente e
atractiva dos "tablets", a questão central é o leitor, ou seja, o
essencial é criar leitores que, quando o forem, procurarão o que ler, livros
por exemplo, espaços ou recursos, biblioteca, casa ou escola e suportes
diferente, papel ou digital.
Creio que também estaremos de
acordo que um leitor se constrói desde o início do processo educativo. Desde
logo assume especial importância o ambiente de literacia familiar e o
envolvimento das famílias neste tipo de situações, através de actividades que
desde a educação pré-escolar e 1º ciclo deveriam, muitas vezes são, ser estimuladas
e para as quais poderiam ser disponibilizadas aos pais algumas orientações. Os dados agora conhecidos mais uma vez sublinham esta importância.
Nos primeiros anos de
escolaridade é fundamental uma relação estreita com a leitura, não só com os
aspectos técnicos, por assim dizer, da aprendizagem da leitura e da escrita da
língua portuguesa, mas um contacto estreito e regular com a actividade de
leitura acomodando motivações e culturas diferenciadas a dos alunos e das
famílias.
Só se aprende a ler, lendo, só se
aprende a escrever, escrevendo, etc.
Recordo dados divulgados no final
de 2021 dados no âmbito do estudo “Práticas de Leituras dos estudantes do
ensino básico e secundário”, realizado pelo Centro de Investigação e Estudos de
Sociologia do ISCTE em parceria com o Plano Nacional de Leitura 2017-2027.
Os indicadores são relativos a
alunos do 1º ciclo (3º e 4º ano) e do 2º ciclo e devem ser lidos tendo em conta
o que foi encontrado numa fase anterior em alunos do 3º ciclo e secundário.
Aos 10 anos verifica-se uma
percentagem de 11% de alunos que afirmam só ler quando só obrigados, a partir
dos 11 anos a percentagem sobre significativamente até aos 25% sendo que
existem diferenças significativas entre rapazes e raparigas com estas a
evidenciarem hábitos de leitura mais robustos.
Na fase anterior do estudo
envolvendo o 3º ciclo e o secundário a percentagem de alunos que só lêem quando
obrigados foi de 32% e de 25%.
A situação é preocupante e creio
que mesmo no ensino superior os hábitos de leitura dos alunos não serão ser
muito robustos.
É certo que existe em actividade
o Plano Nacional de Leitura que, parece, estará a dar alguns resultados, mas na
comunicação social generalista o espaço dedicado aos livros é pouco
significativo, ainda se mantém veremos até quando o JL, e na comunicação
televisiva o panorama não é melhor e o que existe parece pouco eficaz.
Insisto, é um problema de
leitores não de livros, aliás e estranhamente, o volume de obras publicadas é
significativo, o que é motivo de reflexão.
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