O calendário das consciências determina para hoje o Dia
Internacional dos Direitos da Criança assente numa dupla comemoração, a
proclamação da Declaração dos Direitos da Criança (1959) e adopção da Convenção
sobre os Direitos da Criança (1989) pela Assembleia Geral das Nações Unidas.
É verdade que nestes 60 anos, pensando sobretudo na
realidade portuguesa, muito evoluímos também no que respeita ao universo dos
mais novos. No entanto, os Direitos da Criança continuam uma agenda por cumprir em múltiplas dimensões e por muitas e diferentes razões.
Os ventos malinos que sopram e o enorme conjunto de
dificuldades que atravessamos apesar de algumas melhorias, ancorados num quadro
de valores que tende a proteger mercados e interesses outros que conflituam com
os interesses e bem-estar da maioria das pessoas vão criando exclusão, pobreza
e negação de direitos. Aliás, é frequente o entendimento de que os direitos
devem ser entendidos como sendo de geometria variável, ou seja, dependem da
conjuntura económica pelo que os que menos têm também terão os seus direitos
diminuídos.
Neste cenário, conforme os estudos e a experiência mostram,
os mais novos constituem um grupo especialmente vulnerável. Aliás, recordo uma
expressão de Laborinho Lúcio considerando que entre nós e em muitas
circunstâncias, os direitos dos menores também parecem direitos menores.
Nesta vulnerabilidade existem três áreas em que me parece
que os direitos estão particularmente ameaçados, as crianças e adolescentes em
risco de maus tratos, abusos e negligência, a pobreza infantil e o direito à
equidade nas oportunidades de acesso à educação de qualidade para todas as
crianças, sublinho, todas as crianças.
De uma forma geral, os discursos e a retórica política
sempre acentuam a importância destas matérias mas é preciso ir um pouco mais
longe. Por exemplo, dotar as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens dos
meios suficientes e qualificados para a detecção e acompanhamento eficaz dos
casos de risco, ou caminhar no sentido de diminuir o número de crianças
institucionalizadas e sem projecto de vida.
No que respeita ao risco de pobreza, as crianças são sempre
o elo mais fraco de uma sociedade com um fosso demasiado grande entre os mais
ricos e os mais pobres. As políticas sociais não podem deixar de entender como
prioritário, sobretudo nos tempos que atravessamos, os apoios sérios e fiscalizados
aos problemas das famílias que envolvem, necessariamente, os mais novos. É o
seu futuro que está em causa.
No que respeita à educação, a equidade e o objectivo de que
todos atinjam o patamar possível de sucesso educativo e qualificação é o grande
desafio. Os discursos políticos nunca esquecem o grande desígnio da educação ou
a paixão pela educação. Os preâmbulos dos normativos são excelentes peças de
retórica sobre direitos e qualidade.
No entanto, precisamos mesmo de caminhar de forma séria e
não tentados pela sedução do sucesso estatístico, para a qualidade dos
processos educativos que se traduz nos níveis de qualificação das pessoas (não
da simples certificação), na diminuição das taxas de abandono e insucesso,
enfim, na construção de projectos de vida viáveis e bem-sucedidos. Muitas
crianças e adolescentes com necessidades especiais vêem atropelados os seus
direitos a dimensões básicas da qualidade de vida, a educação, por exemplo.
A escassez de recurso de diferente natureza que permitam
apoios suficientes, competentes e em tempo útil são constrangimentos grandes
que ameaçam os direitos de crianças e adolescentes…
Torna-se imperativo promover a participação e fazer ouvir,
escutando, a voz dos mais novos.
Continuamos com uma agenda por cumprir no que respeita ao
seu bem-estar.
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