Num tempo em que até a escola chega pela internet assinala-se hoje o dia o Dia Europeu da Internet Mais segura. Como é habitual na imprensa surgem algumas referências diversificadas.
No JN são referidos dados da Directoria do Norte da PJ referindo
que em 2020 os crimes sexuais contra crianças aumentaram mais de 150%, de 161 casos
registados em 2019 para 396 em 2020.
Atravessamos um novo período de confinamento durante o qual
aumentará exponencialmente o tempo que crianças, adolescentes e jovens, tal
como muitos adultos, estarão em frente do ecrã. Naturalmente os riscos também
aumentarão, não só os de natureza sexual, mas também os de cyberbullying, de chantagem e
roubo, de exposição a conteúdos inadequados às idades, etc.
Trata-se de mais um factor de pressão para a supervisão
imprescindível, mas muito difícil dos mais novos na sua relação com a net.
É de sublinhar que dados do Estudo Internacional de Alfabetização em Informática e Informação (ICILS) envolvendo 11 países e
divulgados em 2020 sugerem que os alunos portugueses são os mais bem preparados
para usar a internet de forma responsável. No entanto, os dados relativos aos
riscos são, de facto, inquietantes.
No âmbito do Projecto Kids Online que envolve 30 países e
analisa a utilização da net e das redes sociais por crianças e adolescentes os
dados de 2018, cerca de 2000 alunos entre os 9 e os 17 anos mostraram comparativamente
a 2014 se verifica uma subida da frequência das situações de risco a que parece
também estar a associada a maior operacionalidade e o tempo de contacto
permitido pela migração da utilização dos pc para os mais “operacionais”
smartphones”.
Para além dos dados do EU Kids Online recordo um trabalho da
OCDE de 2018 "Curriculum Flexibility and Autonomy in Portugal – na
OECDreview” em que considerando dados de 2012 e 2015 (recolhidos no âmbito do
PISA), oito em cada dez adolescentes portugueses afirmam "sentir-se
mal" se não estiverem ligados à internet. Apenas os adolescentes franceses
e suecos de entre os 31 países envolvidos evidenciam uma taxa superior.
Podemos considerar mais um sinal dos tempos as múltiplas
referências ao tempo excessivo e dos riscos associados que que muitas crianças
e adolescentes despendem com a ligação à net nas suas múltiplas possibilidades
designadamente as redes sociais e os riscos associados. Os indicadores
relativos ao cyberbullying são inquietantes.
Nesta perspectiva e tal como noutras áreas o recurso
privilegiado a estratégias proibicionistas não funciona. Em tempos de confinamento
e da escola a chegar pela net a situação é ainda mais complexa.
São mais eficientes a promoção da utilização autoregulada e
informada. A net e o mundo de oportunidades, benefícios e riscos que está
presente em todas as suas potencialidades é uma matéria que deve merecer a
reflexão de todos os que lidam com crianças e jovens embora não lhes diga
exclusivamente respeito. É o nosso trabalho.
Mesmo em tempos “normais”, seja lá isso o que for, em casa, muitas crianças têm um ecrã como companhia durante o pouco tempo que a escola "a tempo inteiro" e as mudanças e constrangimentos nos estilos de vida das famílias lhes deixam "livre". Também é verdade que a crescente "filiação" em redes sociais virtuais pode “disfarçar” o fechamento, juntando quem “sofre” do mesmo mal e o tempo remanescente para estar em família, frequentemente ainda é passado à sombra de uma televisão.
Estas matérias, a presença das novas tecnologias na vida dos
mais novos e os riscos potenciais, são problemas menos conhecidos para muitos
pais. Aliás, as dificuldades sentidas por muitas famílias na ajuda aos filhos
neste tempo de ensino não presencial, mostrou isso mesmo, baixos níveis de
literacia digital. Considerando as implicações sérias na vida diária importa
que se reflicta sobre a atenção e ajuda destinada aos pais para que a
utilização imprescindível e útil seja regulada e protectora da qualidade de
vida das crianças e adolescentes. Existem demasiadas situações em que desde
muito cedo os “smartphones” funcionam como “babysitters”.
Por outro lado, a experiência mostra-me que muitos pais desejam
e mostram necessidade de alguma ajuda ou orientação nestas matérias. Sabemos
que estratégias proibicionistas tendem a perder eficácia com a idade.
Creio que o caminho terá de passar por autonomia,
supervisão, diálogo e muita atenção aos sinais que crianças e adolescentes nos
dão sobre o que se passa com elas.
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