É o grande dia, o dia de começar a espreitar o futuro através
de uma janela de esperança. Inicia-se hoje o longo e complexo processo de
vacinação da população portuguesa, da parte que venha a aderir e da parte para
a qual seja indicada.
Os efeitos devastadores dos últimos meses em múltiplas
dimensões da nossa vida individual, da vida em comunidade, entre comunidades no
sentido mais alargado, o problema é mundial, fazem-nos ansiar pela recuperação,
pelo retornar a antes, por um regresso à normalidade perdida, seja isso o que
for para cada um de nós. Será isso que muitos de nós começaremos a vislumbrar
através dessa janela de esperança.
Este movimento é necessário, diria imprescindível, é uma
imagem de futuro que nos reboca, nos mobiliza. É importante percebermos como
será esse retorno, quando será esse retorno e o que importa ponderar para que
se recupere.
De um ponto de vista mais individual e como escrevi acima,
numa perspectiva de protecção e confiança é fundamental que criemos imagens de
futuro que nos apoiem para lá chegar neste caminho que não é fácil e tem
inúmeros riscos.
A grande questão será, creio, a que normalidade queremos
voltar ou melhor, a que normalidades queremos voltar, o que queremos recuperar.
Na verdade, existem múltiplas normalidades e talvez as circunstâncias
excepcionais em que vivemos nos possibilitem e inspirem a repensar se algumas
das “normalidades” que conhecemos seria desejável que se mantivessem.
Nesta perspectiva e ao contarmos com a alavanca financeira a
que chamam “bazuka europeia” queremos recuperar modelos e “normalidades” que
alimentam exclusão, pobreza, intolerância, atropela direitos, compromete o
nosso futuro como habitantes do planeta, etc.? Se nada se repensar ou refizer,
após a pandemia e à boleia da lenta recuperação financiada esta normalidade
voltará, é uma normalidade resistente e se continuar a ser muito bem alimentada
como tem sido, assim se manterá. Aliás, a pandemia acentuou de forma brutal as
assimetrias e a vulnerabilidade de muitos grupos e pessoas.
Por outro lado, também ansiamos recuperar, regressar, a uma
normalidade que se traduz na proximidade com os de que gostamos e voltam a
estar à distância de um gesto, à normalidade dos alunos nas escolas, da gente
na rua, nas lojas e empresas e a circular sem medo do “bicho” como dizem os
meus netos. Os miúdos de diferentes idades tiveram saudades da escola, sim, os
miúdos gostam da escola e dos professores, São bens de primeira necessidade. Os miúdos, adolescentes e jovens,
todos nós, queremos regressar, recuperar, o estar com a família, com os amigos,
de realizar todas as actividades que fazíamos e deixámos de o poder fazer,
enfim, de regressar ao tudo que poderemos e vamos querer fazer. Este Natal
apesar de alguma abertura mostrou isso mesmo.
Esta normalidade queremo-la de volta, queremos recuperá-la
tão depressa quanto possível.
No entanto, deveríamos reflectir se queremos todas as
normalidades de volta, se queremos recuperar tudo, ou entendermo-nos sobre que
novas normalidades precisamos de definir.
Não depende só de nós, mas também depende de nós.
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