Gostei de ler o texto de Pacheco Pereira na sua habitual página do Público, “O recuo da cultura das humanidades e a democracia” que merece leitura e reflexão
“(…)
Vamos, por isso, usar uma definição comum de vulgar de
“humanidades”, para não complicar, que contém a literatura, a arte, a música, o
direito, as ciências sociais, a história, num contexto de aproximação ao
“homem” que desde a Renascença e o Iluminismo tem traços comuns. Inclui uma ideia
da fragilidade da vida humana, do serviço do “bem comum”, dos direitos humanos,
da liberdade, a começar pela mais importante historicamente, a liberdade
religiosa, do valor da igualdade, do papel da educação na luta contra a
servidão, na emancipação e dignificação do trabalho, na recusa da violência, do
respeito pelas escolhas de género e da aceitação de que cada um é livre de
viver a vida que quer desde que não seja à custa da liberdade de outrem.
(…)”
Pensando mais na realidade portuguesa, neste aspecto também
não é muito diferente de outras, já aqui tenho abordado esta questão
preocupante, a desvalorização das ciências sociais e das humanidades.
Numa das referências parti de uma peça na imprensa sobre a
questão sobre a questão da escolha de formação no ensino superior na área das
Ciências Sociais e das Humanidades questionando a sua utilidade e
empregabilidade. Foram inquiridos alguns jovens que defenderam com entusiasmo a
sua opção pela formação nesta área apesar das dificuldades que sabem existir.
No entanto e na verdade, têm emergido nos últimos anos discursos que de forma mais explícita ou implícita desvalorizam o
papel desta área.
Mesmo ao nível da investigação científica e do seu
financiamento a área das Ciências Sociais e Humanidades foi arrasada pela
crática negrura que se abateu sobre o tecido científico e de investigação em
Portugal.
A visão passou a centrar-se quase que exclusivamente na
empregabilidade e “utilidade” destas áreas científicas, as Ciências Sociais e
as Humanidades.
As Universidades tendem a ser vistas uma escola profissional
para as empresas o que assenta num equívoco tremendamente perigoso, confundir
desenvolvimento tecnológico com desenvolvimento científico.
Este equívoco esteve claramente presente, embora não se esgote, na política de
Crato para a ciência e investigação com o esmagamento das Ciências Sociais e
das Humanidades ou em discursos como o do então Ministro da Economia, Pires de
Lima quando afirmava com preconceito e ignorância que é preciso que a
investigação (maioritariamente desenvolvida enquadrada pelas universidades)
"se traduza em produtos, marcas e serviços que possam fazer a diferença
no mercado e devolver à sociedade o investimento que fizemos".
Tal entendimento mostra mais uma vez a ignorância sobre a
ciência, o seu desenvolvimento e o papel fundamental no desenvolvimento das
sociedades, eliminando pura e simplesmente as ciências sociais e humanidades,
evidentemente inúteis por não criarem "produtos, marcas e serviços".
É evidente que a empregabilidade e a transferência de
conhecimentos para o tecido económico são dimensões a considerar na organização
da oferta formativa e na investigação, mas existe um conjunto vasto e imprescindível de formação
universitária e de investigação de que não podemos prescindir com o fundamento exclusivo no
mercado de emprego. Podemos dar como exemplo formações na área da filosofia, da
história ou nichos de investigação que são imprescindíveis num tecido
universitário e social moderno e que cumpra o seu papel de construção e
divulgação de conhecimento e desenvolvimento em todas as áreas.
As universidades não podem ser o departamento de formação
profissional das empresas.
Uma sociedade com gente formada e a investigar nestas áreas,
ciências sociais e humanidades, é uma sociedade mais desenvolvida.
Neste sentido, insisto na ideia de que em todos os cursos de
ensino superior deveriam existir créditos obrigatórios para áreas como ética,
filosofia e história.
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