Na imprensa de hoje e ainda sobre
a tragédia que aconteceu em Peniche lê-se que a em 2019 e no contexto de uma
fuga de casa a situação da criança terá sido sinalizada. O caso foi encerrado
pouco tempo depois dado que com base nos factos conhecidos na altura foi entendido
como não necessária a aplicação de medidas de promoção e protecção.
Algumas notas que não pretendem
atribuir responsabilidades, não quero, não posso e não devo, mas apenas voltar a alertar para uma situação
recorrente.
De há muito e a propósito de
várias questões afirmo que em Portugal, apesar de existirem diferentes
dispositivos de apoio e protecção às crianças e jovens e de existir legislação
no mesmo sentido sempre assente no incontornável “superior interesse da
criança", não possuímos ainda o que me parece mais importante, uma cultura
sólida de protecção das crianças e jovens como alguns exemplos regularmente
evidenciam.
Por outro lado, as condições de
funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer
um trabalho eficaz estão ainda longe de ser as mais eficazes e operam em
circunstâncias difíceis. Na sua grande maioria as Comissões têm
responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que
transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das
Comissões, a designada Comissão restrita, é composta por muitos técnicos em
tempo parcial. Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e
qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos
profissionais que as integram.
Muitas vezes tenho aqui referido
a necessidade maior investimento e eficiência no âmbito do sistema de protecção
de menores. Para além do reforço dos recursos das CPCJ seria desejável uma
melhor integração e oportunidade das respostas a situações detectadas, uma adequação
às mudanças e novas realidades na área dos Tribunais de Família e Menores, etc.
Os serviços de apoio às comunidades, ainda que regulados e escrutinados, deverão
ser suficientes e adequados em recursos e procedimentos.
Este cenário permite que ocorram
situações como a agora conhecida, frequentemente com contornos dramáticos,
envolvendo crianças e jovens que sendo conhecida a sua condição de
vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio ou os procedimentos
necessários. E tal como nesta situação é frequente ouvir depois de alguns
episódios mais graves uma expressão que me deixa particularmente incomodado, a
criança estava “sinalizada” ou “referenciada” mas dessa "sinalização"
não decorreu a adequada intervenção.
Sinalizamos e referenciamos com relativa
facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver os problemas das
crianças referenciadas ou sinalizadas. Importa ainda não esquecer as que passam
mal em diferentes aspectos sem que estejam sinalizadas ou referenciadas. Nos
tempos que atravessamos os riscos serão maiores.
Por isso, sendo importante
registar uma aparente menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos
miúdos, também será fundamental que desenvolva a sua intolerância face à
ausência de respostas.
O que me dói ainda mais é que não
é a primeira vez que escrevo sobre acontecimentos desta natureza e,
provavelmente, não será a última.
As crianças são resilientes, mas
família, afecto, contextos educativos de qualidade, são bens de primeira
necessidade.
Sem comentários:
Enviar um comentário