sábado, 30 de maio de 2020

A HISTÓRIA DO BRINCALHÃO


Neste dias de chumbo lembrei-me do Brincalhão. O Brincalhão foi um companheiro de escola durante alguns anos. Não era o seu nome mas era assim que todos o tratávamos.
Era um tipo fantástico, com ele presente não havia depressão ou mau humor que resistisse. Percebia quando alguém do grupo não estava bem e encontrava sempre a melhor forma de, sem se tornar excessivo, recompor o ânimo mais em baixo.
Disponível para quase tudo, as conversas com o Brincalhão não tinham fim, discutia tudo com um empenho convicto mas sempre com um inultrapassável sentido de humor que só por si justificava a discussão.
Uma outra particularidade que mexia verdadeiramente connosco era o sucesso do Brincalhão junto das miúdas. Confesso que a inveja, coisa feia, era grande. Bem que tentávamos justificar o sucesso com o facto de ele ser um excelente palhaço e as miúdas gostarem de circo. A justificação não era de facto muito boa nem muito inteligente, mas não nos ocorria outra e sempre tentávamos, sem o conseguirmos, proteger a nossa auto-estima porque as miúdas gostavam quase todas do Brincalhão.
Para a realização de qualquer tarefa era importante a colaboração do Brincalhão, ajudava a organizar as dúvidas, a escolher os caminhos e sempre nos ríamos imenso. Era um tipo com uma sensibilidade enorme às injustiças, tinha uma visão quase romântica do mundo e da revolução que se deveria fazer. Com o fino e inteligente humor que o caracterizava minava qualquer discurso mais conservador.
O cumprimento das estradas de cada um levou de mansinho à dispersão do grupo. O primeiro a afastar-se e para longe, para muito longe foi o Brincalhão.
Com o tempo fomos percebendo todos que tínhamos perdido a pessoa mais séria que conhecemos.

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