terça-feira, 23 de setembro de 2025

DAS EXPLICAÇÕES ESCOLARES

 A propósito de um trabalho no JN sobre esta questão, umas notas relativas a uma área da formação escolar que continua bem sucedida, as explicações, ainda que também se reflicta nessa actividade a falta de professores. A procura é suficiente para que alguns centros de explicações tenham lista de espera.

Não tenho dados mais recentes e retomo um relatório divulgado em 2024 pelo Conselho Nacional de Educação com o título sugestivo “Relatório Técnico | Explicações / “'Educação (na) Sombra””, sobre o universo das explicações escolares e deveria constituir um forte contributo para ajustamentos nas políticas públicas de educação.

Vejamos alguns indicadores. Considerando os dados inquérito “Estudantes à Saída do Secundário de 18/19”, cerca de 28 mil, 29% afirmaram recorrer a explicações fora da escola. Mais de metade dos alunos que recorrem a explicações têm pais com formação superior e à medida que decrescem as habilitações familiares baixa a procura por explicações. As razões são óbvias e as consequências também.

Na verdade, nestes últimos anos este nicho do mercado da educação tem estado em alta com uma oferta crescente estimulada pela pressão da busca de apoio escolar externo.

Sendo certo que a pandemia se intrometeu, tenho para mim que são as políticas públicas de educação que têm sido definidas nos últimos anos o que verdadeiramente sustenta este florescente nicho de mercado.

Algumas vezes aqui tenho abordado esta questão. Recordo um estudo, também referido na peça do Público, realizado em 2019 pelo grupo “Ginásios da Educação Da Vinci”, um franchising que gere em Portugal 42 centros respondendo a 5400 alunos num universo estimado em 244 mil que recorrem a estes “serviços”. Destes, cerca de 70% têm “explicadores” particulares, maioritariamente professores que dão explicação num “cantinho” da sua casa num volume de facturação estimado em 200 milhões de euros e que passa, por assim dizer ao lado, das obrigações fiscais, questão que também o CNE coloca incluindo um plano de regulação. Ainda segundo os mesmos dados, existirão à volta de doze mil explicadores e de mil centros de estudo e apoio escolar.

Aliás, também no JN o Presidente do Conselho Nacional de Educação defende que o Ministério da Educação deveria promover maior regulação sobre esta área, designadamente nos requisitos de formação dos “explicadores”

Trata-se de facto de um mercado em expansão e fomentador do empreendedorismo individual e que também contribui para acentuar as desigualdades sociais pré-existentes sem qualquer sobressalto por parte de quem tem sido responsável por políticas públicas.

É um mercado que envolve alunos de todos os anos de escolaridade, mas tem maior procura em anos de exame e no ensino secundário quando está em jogo o acesso ao ensino superior.

Na verdade, é um mercado generalizado como se pode verificar com um passeio pelas proximidades das escolas abundando a oferta de ajudas fora da escola, antes conhecidas por “explicações”, mas agora com designações mais sofisticadas como “Centro de Estudo”, “Ginásio”, "Academia", etc., que, provavelmente, terão mais efeito “catch” no sentido de atingir o “target”, aliás, não são raras as designações em inglês. Ainda temos a oferta mais personalizada, as “explicações” no aconchego caseiro dos explicadores, numa espécie de atendimento personalizado. O mercado está sempre atento e o marketing desempenha um papel importante.

Apesar de nada ter contra a iniciativa privada desde que com enquadramento legal e regulação, o que está longe de existir, várias vezes tenho insistido no sentido de entender como desejável que os apoios e ajudas de que os alunos necessitam fossem encontrados dentro das escolas e agrupamentos. O impacto no sucesso dos alunos minimizaria, certamente, eventuais custos em recursos que, aliás, em alguns casos já existem dentro do sistema emboa saibamos da questão séria da falta de docentes e do  envelhecimento da classe ainda no activo.

Esta minha posição radica no entendimento de que a procura “externa” de apoios, legítima por parte das famílias, tem também como efeito o alimentar da desigualdade de oportunidades e da falta de equidade como tem sido regularmente sublinhado em múltiplos estudos.

Esta questão é também colocada no referido relatório do CNE e noutros trabalhos que evidenciam algo de muito significativo apesar de bem conhecido e reconhecido, nove em cada dez alunos com insucesso escolar são de famílias pobres.

A ajuda externa ao estudo como ferramenta promotora do sucesso não está ao alcance de todas as famílias sendo, portanto, fundamental que as escolas possam dispor dos dispositivos de apoio suficientes e qualificados para que se possa garantir, tanto quanto possível, a equidade de oportunidades e a protecção dos direitos dos miúdos, de todos os miúdos.

De uma vez por todas, é necessário contenção e combate ao desperdício, mas em educação não há despesa há investimento. Talvez o investimento canalizado para inúmeros projectos, iniciativas, vestidas de "inovação", consumidoras de recursos e vindas de fora da escola, fosse mais eficiente se utilizado na e pela escola no âmbito da sua autonomia.

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