Finalmente a decisão acertada, no 1.º ciclo os manuais não serão reutilizados, o que deveria ter acontecido desde o início da sua gratuitidade. Muitas vezes aqui tenho abordado a questão dos manuais escolares, incluindo a reutilização, e retomo algumas notas.
Por várias razões e de natureza
diferente, continuo a entender que o nosso modelo de trabalho, apesar das
excepções e das mudanças, ainda se pode considerar excessivamente “manualizado”
ou seja, assenta talvez demais em práticas pedagógicas pouco diferenciadas
muito decorrentes de conteúdos curriculares demasiado extensos, prescritivos e
normalizadores. Seria desejável atenuar a fórmula predominante, o professor
ensina com base no manual o que o aluno aprende através do manual que o pai
acha muito importante porque tem tudo o que professor ensina. Não esqueço, no
entanto, que variáveis como a natureza e conteúdos curriculares, o número de
alunos por turma ou ainda a cultura pedagógica de décadas, influenciam este
cenário.
Estou convicto de que sem
aligeirar o peso do manual no trabalho em sala de aula, os níveis de
diferenciação necessários como forma mais robusta à diversidade dos alunos
ficam comprometidos.
Neste contexto, parecia claro que
os manuais do 1.º ciclo não poderiam, não deveriam, ser reutilizados. Conhecem-se
referências a “expedientes” usados pelos pais para “apagar” o rasto que os seus
filhos deixaram nos manuais.
Como tantas vezes afirmo, a
entrada na escola, no 1º ciclo, será dos poucos processos que quando correm mal
já não é possível voltar atrás e recomeçar com a esperança de que a coisa vá
correr melhor.
Torna-se, pois, essencial que
este processo de entrada na escola seja pensado e orientado, que crie as
rotinas, a adaptação e a confiança em miúdos e em pais, indispensáveis à
aprendizagem bem-sucedida.
É fundamental não esquecer que os
miúdos à entrada na escola não estão todos nas mesmas condições pelas mais
variadas razões, ambiente e experiências familiares, percurso anterior,
características individuais, etc., o que exige desde o início uma atenção
diferenciada que combata a cultura de que devem ser todos tratados da mesma
maneira que alguma opinião publicada e ignorante defende.
Antes de, com voluntarismo e
empenho, se tentar ensinar aos miúdos as coisas da escola é preciso, como
sempre afirmo, dar tempo, oportunidade e espaço para que aprendam a escola.
Depois de aprenderem a escola estarão mais disponíveis para então aprender as
coisas da escola.
É neste contexto que julgo que os
manuais devem ficar com os alunos, permitindo que possam ser usados como
suporte do seu trabalho sem que este entendimento, comprometa o que disse acima
sobre o excesso de peso pedagógico atribuído ao manual. Acresce ainda que
apesar de alguma “disciplinarização” dos conteúdos curriculares, incluindo o
recurso a manuais para cada conteúdo, e a lógica de ciclo contida na LBSE, a
continuidade da relação dos alunos em diferentes patamares de aprendizagem e
desempenho ao longo do ciclo com o trabalho desenvolvido também aconselharão a
que se mantenham os manuais que vão utilizando.
Esta manutenção dos manuais terá
ainda um valor de natureza menos tangível, diria afectivo, pois acabam por ser um
registo, um diário de bordo da sua aprendizagem e um instrumento de relação com
o trabalho escolar.
Como é óbvio este entendimento
não belisca a necessidade do recurso a actividades e materiais diversificados
num já referido modelo de diferenciação pedagógica.
Definitivamente, nos primeiros
anos a relação com os manuais é de natureza diferente da que estabelece em
fases posteriores da escolaridade obrigatória em que a reutilização é bem mais
“tranquila”, por assim dizer.
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