Lê-se na imprensa que o Presidente do Conselho Nacional de Educação afirmou que o Conselho está a desenvolver um estudo sobre as “explicações” referindo que metade dos alunos do ensino secundário frequentarão estes “dispositivos”.
Parece claro que nos últimos anos
este nicho do mercado da educação tem estado em alta com uma oferta crescente
estimulada pela pressão da busca de apoio escolar externo.
A pandemia intrometeu-se no
mercado e, mais recentemente, é referido o impacto dos processos reivindicativos
que as escolas vivem. Tenho para mim, que sendo de considerar estas duas
situações, o que verdadeiramente sustenta este florescente nicho de mercado são
as políticas públicas de educação que têm sido definidas nos últimos anos.
Algumas vezes aqui tenho abordado
esta questão e retomo algumas notas. Recordo um estudo realizado em 2019 pelo
grupo “Ginásios da Educação Da Vinci”, um franchising que gere em Portugal 42
centros respondendo a 5400 alunos num universo estimado em 244 mil que recorrem
a estes “serviços”. Destes, cerca de 70% têm “explicadores” particulares,
maioritariamente professores que dão explicação num “cantinho” da sua casa num
volume de facturação estimado em 200 milhões de euros e que passa, por assim
dizer ao lado, das obrigações fiscais. Ainda segundo os mesmos dados, existirão
à volta de doze mil explicadores e de mil centros de estudo e apoio escolar.
Trata-se de facto de um mercado
em expansão e fomentador do empreendedorismo individual e que também contribui
para acentuar as desigualdades sociais pré-existentes sem qualquer sobressalto
por parte de quem tem sido responsável por políticas públicas.
É um mercado que envolve alunos
de todos os anos de escolaridade, mas tem maior procura em anos de exame e no
ensino secundário quando está em jogo o acesso ao ensino superior.
Na verdade, é um mercado
generalizado como se pode verificar com um passeio pelas proximidades das
escolas abundando a oferta de ajudas fora da escola, antes conhecidas por
“explicações”, mas agora com designações mais sofisticadas como “Centro de
Estudo”, “Ginásio”, "Academia", etc., que, provavelmente, terão mais
efeito “catch” no sentido de atingir o “target”, aliás, não são raras as
designações em inglês. Ainda temos a oferta mais personalizada, as
“explicações” no aconchego caseiro dos explicadores, numa espécie de
atendimento personalizado. O mercado está sempre atento e o marketing
desempenha um papel importante.
Apesar de nada ter contra a
iniciativa privada desde que com enquadramento legal e regulação, o que está
longe de existir, várias vezes tenho insistido no sentido de entender como
desejável que os apoios e ajudas de que os alunos necessitam fossem encontrados
dentro das escolas e agrupamentos. O impacto no sucesso dos alunos minimizaria,
certamente, eventuais custos em recursos que, aliás, em alguns casos já existem
dentro do sistema.
Esta minha posição radica no
entendimento de que a procura “externa” de apoios, legítima por parte das
famílias, tem também como efeito o alimentar da desigualdade de oportunidades e
da falta de equidade como tem sido regularmente sublinhado em múltiplos
estudos.
Neste contexto, recordo que no
Relatório do CNE, "Estado da Educação 2016", constava um dado
interessante relativo a Portugal que na altura comentei e extraído do TIMSS de
2015. Referindo apenas o secundário, 61% dos estudantes do secundário afirmam
ter aulas particulares de Matemática no sentido de melhorar o desempenho nos
exames. A comparação com outros países é elucidativa tanto mais se considerarmos
o respectivo nível de vida, sendo a Noruega um exemplo extremo.
Também trabalhos realizados pelo
CNE e pela Fundação Francisco Manuel dos Santos evidenciam algo de muito
significativo apesar de bem conhecido e reconhecido, nove em cada dez alunos
com insucesso escolar são de famílias pobres.
A ajuda externa ao estudo como
ferramenta promotora do sucesso não está ao alcance de todas as famílias pelo
que é fundamental que as escolas possam dispor dos dispositivos de apoio
suficientes e qualificados para que se possa garantir, tanto quanto possível, a
equidade de oportunidades e a protecção dos direitos dos miúdos, de todos os
miúdos.
De uma vez por todas, é
necessário contenção e combate ao desperdício, mas em educação não há despesa
há investimento. Talvez o investimento canalizado para inúmeros projectos,
iniciativas, vestidas de "inovação", consumidoras de recursos e
vindas de fora da escola, fosse mais eficiente se utilizado na e pela escola no
âmbito da sua autonomia.
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