Um trabalho no JN com chamada a primeira página, divulga que a generalidade das medidas previstas para 2021 na Estratégia Nacional para a Inclusão das Pessoas com Deficiência, a desenvolver entre 2021 e 2025, não foram cumpridas. Segundo a peça, o Ministério da Segurança Social entende que o atraso verificado se deverá ao facto de algumas medidas serem inovadoras e necessitarem de suporte técnico e que o tempo não foi suficiente. Acresce que, de acordo com organizações que intervêm nesta área, o Orçamento do Estado não contempla a Estratégia.
Confesso que esta justificação também me parece bastante
inovadora e a situação constitui um notável exemplo de planeamento.
No trabalho do JN aborda-se ainda a questão do emprego das
pessoas com deficiência que subiu 30% na última década atingindo o valor mais
alto de sempre. Registe-se que na própria administração pública fracciona os
concursos de forma a fugir à cota de 5% definida para ser ocupada por pessoas
com deficiência.
Nada de novo, lamentavelmente. Os problemas que afectam as minorias dificilmente deixarão de ser problemas percebidos como minoritários e em tempos de maiores
dificuldades os mais vulneráveis estão ainda mais expostos. Algumas notas em linha com o que muitas vezes aqui escrevo.
Na verdade, boa parte dessas dificuldades decorre do que as
comunidades e as suas lideranças, políticas por exemplo, entendem ser os
direitos, o bem comum e o bem-estar das pessoas, de todas as pessoas.
Também para as crianças com necessidades especiais e
respectivas famílias, área que melhor conheço, a vida é muito complicada face à
qualidade e acessibilidade aos apoios e recursos educativos e especializados necessários. Não esqueço os bons exemplos e práticas que conhecemos, assim como sei do empenho e profissionalismo da maioria dos profissionais que trabalham
nestas áreas.
Uma referência ainda ao que deve ser um princípio não
negociável, a inclusão em todos os domínios da vida das comunidades.
É verdade que a questão da inclusão, em particular da
inclusão em educação, é presença regular nos discursos actuais. É objecto de
todas as apreciações, ilumina todas as perspectivas e acomoda todas as
práticas, incluindo a “entregação” que manifestamente não promove inclusão,
antes pelo contrário. Apesar do bom trabalho que existe e deve ser sublinhado,
por vezes, demasiadas vezes, confunde-se colocação educativa, crianças com
necessidades especiais na sala de aula regular, com inclusão. Aliás, até a
exclusão de muitos alunos da sala de aula e das actividades comuns é frequentemente
realizada … em nome da inclusão. E não acontece nada. A situação dura e já
longa que atravessamos veio agudizar a situação.
O termo está tão desgastado que já nem sabemos bem o que
significa. Não esqueço o que positivo se faz, mas conheço tantas práticas e
tantos discursos que alimentam exclusão e que são desenvolvidas e enunciados
... em nome da inclusão. Tantas vezes me lembro do Mestre Almada Negreiros que
na "Cena do Ódio" falava da "Pátria onde Camões morreu de fome e
onde todos enchem a barriga de Camões".
A inclusão assenta em cinco dimensões fundamentais, Ser
(pessoa com direitos), Estar (na comunidade a que se pertence da mesma forma
que estão todas as outras pessoas), Participar (envolver-se activamente da
forma possível nas actividades comuns), Aprender (tendo sempre por referência
os currículos gerais) e Pertencer (sentir-se e ser reconhecido como membro da
comunidade). A estas cinco dimensões acrescem dois princípios inalienáveis,
autodeterminação e autonomia e independência.
Não é por muito afirmar a escola inclusiva que a educação se
torna inclusiva, o pensamento mágico tantas vezes expresso não … não é a
realidade.
As pessoas com deficiência não precisam de tolerância, não
precisam de privilégios, não precisam de caridade, precisam só de ver os seus
direitos considerados. Os direitos não são de geometria variável cumprindo-se
apenas quando é possível.
Este é o caderno de encargos que nos convoca a todos, todos
os anos, todos os dias.
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