Bom, aí está o produto sazonal
que dá pelo nome de “rankings escolares” nas suas diferentes declinações e
leituras dos dados disponibilizados e bem pelo ME. Agora, relativos a
2019/2020, um ano verdadeiramente atípico e que inibe algumas comparações.
Apesar de continuar com
dificuldade em defender a sua bondade, bem longe de o fazer, não tenho uma atitude
fundamentalista face à sua construção. Sublinho, sobretudo, a evolução que se
tem verificado nos últimos anos, quer na disponibilização de informação por
parte do ME para além dos “meros” resultados da avaliação externa, quer na
forma como essa informação é tratada e divulgada por diferentes entidades. Se
me parece muito importante a análise dos dados providenciados pelo ME, já me
parece irrelevante a construção de listas classificativas de escola. Registo
positivamente, aliás, a posição do Ministro, numa das suas raras intervenções que
percebi e concordo.
Continuo também a sentir-me
incomodado com as estratégias de marketing dos negócios da educação a propósito
da divulgação dos rankings.
A mais frequente defesa da sua
construção assenta na importância da avaliação externa. No entanto, é evidente
que a imprescindível avaliação externa não tem que, necessariamente, obrigar à
construção dos rankings que, aliás, alguns países não realizam. Curiosamente,
em Singapura terá sido decidido em 2018 abolir a construção e divulgação de
rankings escolares com base nos resultados em exames bem como não divulgar
outras informações de natureza comparativa sobre o desempenho escolar dos alunos.
A decisão, de acordo como o
Ministro da Educação, Ong Ye Kung, assenta no princípio a promover junto dos
alunos e famílias que “aprender não é uma competição”. Aliás, é
interessante considerar toda a argumentação e sustentação da medida. A decisão
é ainda mais surpreendente considerando a posição cimeira habitualmente ocupada
por Singapura nos estudos comparativos internacionais e na sua habitual defesa
destes dispositivos.
Mas de facto, existindo e apesar
das mudanças que se têm verificado que mostram, ou não, os rankings?
Dificilmente mostrarão algo de
substantivamente diferente como é que claro.
Mostram que genericamente as
escolas privadas apresentam melhores resultados e que também existem escolas
privadas com resultados mais baixos.
Mostram que a maioria das escolas
que maior discrepância apresenta entre a avaliação externa e a avaliação
interna, sendo esta "inflacionada", são privadas sendo algumas
persistentes na tarefa. Aliás, por coincidência certamente, foi também divulgada
a aplicação de 64 processos de sanção a direcções de escolas, públicas e
privadas. são também de registar as notas da
disciplina de Educação Física no secundário, um em cada quatro alunos teve nota superior a 18, que, a corresponder a reais competências dos
alunos, transformaria Portugal num estudo de caso e numa incubadora de atletas.
Ao contrário, mostram das que se
revelam mais exigentes a maioria é do ensino público.
Mostram que existem escolas
públicas com bons resultados e escolas públicas com resultados menos bons.
Mostram que existem escolas que
face ao contexto sociodemográfico que servem conseguem bons resultados ou, pelo
menos, progresso no trajecto dos alunos e que existem escolas públicas que
ainda não conseguem contrariar o destino de muitos dos seus alunos.
Mostram que o nível de retenção é
elevado e que o recurso à retenção não faz subir os resultados dos alunos.
Mostram que a menor dimensão das
turmas pode em escolas em contextos menos favoráveis promover a melhoria de
resultados. Curiosamente, na passada semana não avançou uma proposta de redução
do número de alunos por turma.
Mostram que a tradição ainda é o
que era, pais (mães) mais escolarizados, têm, potencialmente, filhos com
melhores resultados.
Mostram que as escolas públicas
são as que mais progressos promovem nos alunos.
Mostram que nas escolas com
melhores resultados, em regra, são as que têm menos alunos abrangidos pela
Acção Social Escolar.
Mostram que a escola, os
professores, fazem a diferença.
Mostram ainda que se continua a
falar de “melhores escolas” e “piores escolas”
Mostram que …
Enfim, os rankings mostram tudo,
só não mostram o que se fará a seguir com a informação que os rankings mostram.
Na verdade, também não mostram o tanto que não se consegue medir, mas se pode
avaliar e que é tão essencial como o que se mede.
Três notas finais.
1 - A propósito de rankings -
Gert Biesta da Universidade Stirling numa obra notável, "Good Education in
a Age of Measurement - Ethics, Politics, Democracy", afirma que uma
obsessão centrada na medida, assenta na gestão continuada de uma dúvida,
"medimos o que valorizamos ou valorizamos o que medimos?" No mesmo
sentido e numa entrevista ao Público em 2011, o Professor Biesta afirmava
sugestivamente, “Os rankings são muito antiquados e não devem ter lugar numa
sociedade civilizada". Aliás, nessa altura assisti a uma sua notável
conferência sobre a questão da medida e da avaliação em educação.
2 - Por onde andam nos rankings
os alunos com necessidades educativas especiais? (desculpem o termo não inovador dentro do
novo paradigma, mas ainda não me habituei às novas "não categorias"
como "adicionais", "selectivas" ou
"adicionais"). Provavelmente à
espera da operacionalização de um novo indicador-chave da avaliação das
escolas, a inclusão de cuja consideração na construção dos rankings não me dei
conta.
3 – Continuo com a dúvida
expressa por Gil Nata e Tiago Neve do Centro de Investigação e Intervenção
Educativas da U. do Porto que num texto no Público a propósito dos rankings de
há dois anos escreviam, “Assim, passados 20 anos, a pergunta impõe-se onde
estão as evidências de que a publicação dos rankings tenha contribuído para a
melhoria do sistema educativo?”
Para o ano cá estaremos a tentar
perceber que efeito terá nos rankings o ano atípico que está a
terminar.
E voltarei a estas notas. São
assim os produtos sazonais.
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