A imprensa de hoje refere o Relatório Anual sobre a Situação do País em Matéria de Drogas e Toxicodependência que será entregue no Parlamento e com dados até 2019. Em pleno confinamento pode parecer fora da agenda abordar estas questões, mas creio que é sempre pertinente.
Alguns indicadores divulgados pelo Serviço de Intervenção
nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências.
Entre os alunos dos 13 aos 18 verificou-se um aumento do
consumo de outras drogas, que não canábis, e a diminuição do risco percebido pelos
alunos de 16 anos decorrente do consumo e uma evolução de consumos menos positiva
que na zona europeia.
No grupo dos 18 anos aumentou o consumo de canábis entre
2015 e 2019. Apesar dos números ainda não serem, felizmente, muito
significativos o número de overdoses aumenta desde há três anos sendo que
duplicaram as causadas por opiáceos entre 2017 e 2018 e as causadas por cocaína
sobem continuamente há três anos.
Parece verificar-se um aumento da circulação de drogas em
Portugal associadas ao crescente recurso à net para a sua comercialização.
No que respeita ao consumo do álcool entre 2017 e 2019 também
existem indicadores que merecem preocupação. Verifica-se o aumento continuado
do consumo e da modalidade “binge drinking”, consumir muito em pouco tempo, que
promovem exponencialmente casos de embriaguez em alunos de diferentes idades,
18 anos e em particular no grupo de 16 anos.
Trata-se, de facto, de um cenário que merece uma atenção que,
por razões óbvias, muito provavelmente não terá nesta altura. Algumas notas já
por aqui reflectidas.
O consumo de diferentes substâncias, em quantidade e em grupo
por adolescentes e jovens, sobretudo ao fim-de-semana, é muitas vezes entendido
e sentido como o factor de pertença ao grupo, potenciando a escalada desse
consumo, juntos bebemos ou fumamos mais do que sós, como é óbvio e o
"estado" que se atinge é sentido como um "facilitador"
relacional.
Por outro lado, a acessibilidade aos diferentes produtos não
é complicada, antes pelo contrário, processa-se com a maior das facilidades.
Muitos adolescentes, ouvidos em estudos nesta matéria, referem ainda a ausência
de regulação dos pais sobre os gastos, sobre os consumos ou sobre as horas de
entrada em casa, que muitas vezes tem que ser discreta e directa ao quarto
devido ao “mau estado” do protagonista.
Como é evidente, já muitas vezes aqui o tenho referido com
base na minha experiência de contacto com pais de adolescentes, não estamos a
falar de pais negligentes. Podem acontecer situações de negligência, mas, na
maioria dos casos, trata-se de pais que sabem o que se passa, “apenas fingem”
não perceber desejando que o tempo “cure” porque se sentem tremendamente
assustados, sem saber muito bem o que fazer e como lidar com a questão.
De fora parece fácil produzir discursos sobre soluções, mas
para os pais que estão “por dentro” a situação é muitas vezes sentida como maior
que eles.
É preciso que a comunidade esteja atenta a estes
adolescentes que, por vezes ainda antes dos 13 ou 14 anos começam a “aceder” às
“litrosas”, aos shots, a qualquer outro produto para fumar ou consumir e também
aos seus pais que estão tão perdidos quanto eles.
Para além da legislação de natureza proibicionista,
parecem-me imprescindíveis, evidentemente, a adequada fiscalização e, sobretudo
a criação de programas destinados a pais e aos adolescentes que minimizem o
risco do consumo excessivo das diferentes substâncias.
É mais uma das áreas, comportamentos e saúde, que podem ser abordadas
nas escolas com todos os alunos e sem que tenham de se constituir como “disciplinas”
apesar de manifestos e discursos insustentáveis face a indicadores desta
natureza.
Acresce que a proibição, como sempre, não basta e se
prevenir e cuidar é caro que se façam as contas aos resultados do descuidar.
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