Estas notas têm como tema o frio, ou melhor, a falta de calor. Estamos no tempo, a vaga de frio está aí e entramos no regime de alertas coloridos.
Sempre que tal acontece, e acontece quase todos os anos com maior ou menor intensidade, surgem as notícias, os alertas e as referências às mortes associadas ao frio. Sem surpresa, estas situações trágicas atingem fundamentalmente os excluídos e pobres, designadamente, os sem abrigo. São então frequentes as peças na comunicação social em que se mostram as medidas acrescidas de apoio a alguns grupos que se consideram mais vulneráveis ao frio ou reportagens patéticas com perguntas sobre ... frio no Inverno. Confesso que algumas delas são mesmo embaraçantes pela forma como mediatizam matérias como o sofrimento.
O problema é que muita gente não corre riscos sério por causa do frio, corre riscos por causa da falta de calor. Não, não estou a fazer alguma espécie de humor de mau gosto e desadequado. É mesmo isso e nas circunstâncias actuais o risco é maior.
Algumas pessoas vivem numa condição inaceitável e na grande maioria das vezes não é uma escolha sua. Faltou-lhes a partir de certa altura, ou nunca tiveram, o calor de uma casa, de uma família, de um trabalho que lhes desse sustento e dignidade que não mais conseguiram recuperar ou alcançar. O frio ou qualquer outro episódio extremo vai ser o gatilho que os tombará e constará na certidão de óbito. Mas não, não morrem de frio, morrem de falta de calor e às vezes de “sozinhismo”, o frio da solidão. Quando não se tem falta de calor, não se morre de frio.
Se assim não entendermos, e não me parece que queiramos entender, vamos continuar apenas atentos à meteorologia e a comunidade, no seu todo, é importante sublinhar que alguns esforçam-se para que assim não seja, nessa altura lembra-se dessa gente e do frio que estão a sentir. Vai-se embora a vaga de frio e tudo volta à normalidade meteorológica e a uma outra estranha e intolerável normalidade.
Os do costume e novos do costume que os tempos difíceis vão produzindo, continuarão a sentir a falta de calor até que o frio volte.
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