sábado, 24 de janeiro de 2015

AS ESCOLAS SIMPÁTICAS

"Há escolas que, de forma repetida, apresentam diferenças mais altas do que a média do país entre as notas dadas aos alunos e as que eles têm nos exames nacionais."

"Escolha da escola pode valer “2 (ou até 4) valores” na nota interna"

A imprensa retoma a inflação das notas internas que algumas escolas, sobretudo particulares, atribuem aos seus alunos. Esta situação é amplamente conhecida e agora comprovada, mais uma vez, por um estudo da Universidade do Porto
Aliás, é também reconhecido que em muitas zonas as escolas, privadas, sobretudo, mas também algumas públicas são "escolhidas" pelas famílias também em função deste conhecimento.
Deve ser a isto que se chama liberdade da educação. Aliás, curiosamente, segundo a investigação, é justamente nos colégios sem contratos de associação, os que recebem “apenas” os alunos que entendem, que as notas internas são mais “inflaccionadas”, por assim dizer.
Os responsáveis pelas escolas em que o “fenómeno” é mais evidente tentam explicá-lo de formas diferentes e em alguns aspectos até bastante curiosas, projecto pedagógico ou educativo da instituição, entendimento diferenciado sobre o próprio papel da avaliação interna, etc. No mesmo sentido, o Director da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo, sempre criativo, apresenta no Público uma justificação em torno de "estratégias pedagógicas" que é uma peça de antologia.
No entanto, do meu ponto de vista, ainda há dias o escrevi aqui e tenho-o afirmado frequentemente, a questão central radica numa questão central, a conclusão e certificação de conclusão do ensino secundário e a candidatura ao ensino superior deveriam ser processos separados.
Os exames nacionais destinam-se, conjugados com a avaliação realizada nas escolas, a avaliar e certificar o trabalho escolar produzido pelos alunos do ensino secundário e que, obviamente, está sediado no ensino secundário. Neste cenário caberiam também as outras modalidades que permitem a equivalência ao ensino secundário, como é o caso do ensino artístico especializado ou recorrente em que também se verificam algumas "especificidades", por assim dizer.
O acesso ao ensino superior é um outro processo que deveria ser da responsabilidade do ensino superior e estar sob a sua tutela.
A situação existente, não permite qualquer intervenção consistente do ensino superior na admissão dos seus alunos, a não ser a pouco frequente definição de requisitos em alguns cursos, o que até torna estranha a passividade aparente por parte das universidades e politécnicos, instituições sempre tão ciosas da sua autonomia. Parece-me claro que o ensino superior fazendo o discurso da necessidade de intervir na selecção de quem o frequenta não está interessado na dimensão logística e processual envolvida.
Os resultados escolares do ensino secundário deveriam constituir apenas um factor de ponderação a contemplar com outros critérios nos processos de admissão organizados pelas instituições de ensino superior como, aliás, acontece em muitos países.
Sediar no ensino superior o processo de admissão minimizaria muitos dos problemas conhecidos decorrentes do facto da média  de conclusão do ensino secundário ser o único critério utilizado para ordenar os alunos no acesso e eliminaria o “peso” das notas inflacionadas em diversas circunstâncias. A investigação da Universidade do Porto mostrou como um ou dois valores a mais podem “valer” a entrada na universidade ou no curso que se quer. 
Enquanto não se verificar a separação da conclusão do secundário da entrada no superior corremos o risco de lidar com situações desta natureza.

2 comentários:

Ana disse...

Vou ter um enormíssimo ataque de vaidade de mãe, para ilustrar o reverso do apresentado no post:
tenho um filho médico, que sempre estudou em escolas públicas, como um anónimo (onde a mãe professora nunca trabalhou), em turmas muito diversificadas (sem a selecção das elites da terra) e que terminou o ensino secundário com oito classificações de 19 valores e seis classificações de 20 valores (mais um reles 14 a Educação Física).
O rapaz teve várias classificações em exame nacional superiores à classificação interna, pois também há muito disto: pudor em atribuir determinadas classificações elevadas (19 e 20, sobretudo).

(espero que a minha vaidade seja perdoada!)

Zé Morgado disse...

Olá Ana, cá por casa a história é semelhante, o rapaz fez do pré-escolar ao doutoramento na escola pública sempre com notas bastante altas. Aliás, existe um estudo, também da Univ. do Porto que na altura divulguei que mostra que os alunos das escolas públicas têm, em média, melhores e mais curtos trajectos no ensino superior. No entanto, os maus tratos que a escola pública vai sofrendo começam a ter efeitos