Foram divulgados os resultados do PISA 2022 (Programme for International Student Assessment), estando Portugal no 29.º lugar do ranking dos 81 participantes no estudo. Os resultados dos alunos portugueses baixaram, tal como se verificou em boa parte dos países envolvidos, no entanto, em Matemática a descida foi superior à média de descida da OCDE. Os nossos alunos obtiveram uma média de 472 pontos, menos 21 do que em 2018 e menos 15 pontos do que em 2012.
Considerando a área de Ciências
os resultados desceram 7 pontos face a 2018 (diferença não significativa) e 17 pontos
face a 2015, uma diferença significativa.
No terceiro domínio, literacia em Leitura, verifica-se uma descida significativa de 18 pontos relativamente a
2018. Também nestes domínios a descida foi superior à média da OCDE. Sem
surpresa, mantém-se a diferença de resultados face ao contexto familiar.
Como é natural e considerando a Matemática, o domínio com mais escrutínio, surgem sempre algumas leituras. No
Público encontram-se duas peças mostrando as análises da Sociedade Portuguesa de Matemática e da Associação dos Professores de Matemática que, mais uma vez,
divergem no discurso produzido.
A SPM sobrevaloriza a questão da
alteração curricular, a passagem das “metas curriculares” para as “aprendizagens
essenciais” e a ausência de exames finais em todos os ciclos do básico e a APM
aponta para a formação de professores e medidas de atracção para a carreira
docente em Matemática e para o reforço de dispositivos de apoio a escolas e
alunos.
Não sou especialista em questões
curriculares, mas parece-me curiosos que a Sociedade Portuguesa de Matemática e
a Associação dos Professores de Matemática, não sei com que dimensão
representativa dos professores de matemática têm habitualmente entendimentos
diferentes com um argumentário que em alguns aspectos que me são mais
familiares, o funcionamento dos alunos, me levantam dúvidas e, por vezes, me
parecem fruto de agendas para além da Matemática. Lembro-me, por exemplo, de
Nuno Crato, sempre ligado à SPM e sempre com “base na evidência” ter, enquanto ministro, proclamado a existência de professores a mais e a “inevitabilidade da
redução”. Sabemos o que se tem verificado.
Continuo a entender que estruturas
curriculares demasiado extensas, normativas e prescritivas são pouco amigáveis
para o bom desempenho da generalidade dos alunos, pouco amigáveis para acomodar
a diversidade.
Por outro lado, e como aqui tenho
escrito, o desempenho a Matemática pode ainda ser influenciado, não numa
relação de causa-efeito, por múltiplas variáveis como número de alunos por
turma, tipologia das turmas e das escolas e dos contextos, dispositivos de
apoio às dificuldades de alunos e professores ou questões de natureza didáctica
e pedagógica.
Acresce a esta complexidade um
conjunto de outras variáveis menos consideradas por vezes, mas que a
experiência e a evidência mostram ter também algum impacto.
São variáveis de natureza mais
psicológica como a percepção que os alunos têm de si próprios como capazes de
ter sucesso associada a contextos familiares de natureza diversa, por exemplo.
É também conhecido e os
resultados do PISA sublinham, que os pais com mais qualificação e de mais
elevado estatuto económico têm expectativas mais elevadas sobre o desempenho
escolar dos filhos o que se repercute na acção educativa e nos resultados
escolares e, naturalmente, mais facilmente mobilizam formas de ajuda para
eventuais dificuldades, seja nos TPC, seja através de ajuda externa.
Finalmente uma outra variável
neste âmbito, a representação sobre a própria Matemática. Creio que ainda hoje
existe uma percepção passada nos discursos de muita gente com diferentes níveis
de qualificação de que a Matemática é uma “coisa difícil” e ainda de que só os
mais “inteligentes” têm “jeito” para a Matemática. Esta ideia é tão presente
que não é raro ouvir figuras públicas afirmar sem qualquer sobressalto e até
com bonomia que “nunca tiveram jeito para a Matemática, para os números”. É
claro que ninguém se atreve a confessar uma eventual “falta de jeito” para a
Língua Portuguesa e, por vezes, bem que parece. A mudança deste cenário é uma
tarefa para todos nós e não apenas para os professores e seria importante que
acontecesse.
De facto, este tipo de discursos
não pode deixar de contaminar os alunos logo desde o 1º ciclo convencendo-se
alguns que a Matemática vai ser difícil, não vão conseguir ser “bons” e a
desmotivar-se.
Não fica fácil a tarefa dos
professores, mas no limite e como sempre será a escola o braço operacional da
comunidade que quer fazer a diferença a fazer a diferença.
Parece ainda claro e é uma
questão central claro que para promover mais sucesso e não empurrar os alunos
para os anos seguintes sem nenhuma melhoria nas suas competências ou saberes é
essencial criar e tornar acessíveis a alunos, professores e famílias apoios e
recursos adequados e competentes de forma a evitar a última e genericamente
ineficaz medida do chumbo.
Sabemos também que a escola pode
e deve fazer a diferença, em muitas escolas isso acontece. Mas para que isto
seja consistente e não localizado também sabemos que o sucesso se constrói
identificando e prevenindo dificuldades de forma precoce, com a definição de
currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio eficazes,
competentes e suficientes a alunos e professores, com a definição de políticas
educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos
adequados e reais de autonomia, organização e funcionamento desburocratizado
das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, com a
valorização do trabalho dos professores, com práticas de diferenciação que não
sejam "grelhodependentes", com expectativas positivas face ao
trabalho e face aos alunos, com melhores níveis de trabalho cooperativo e
tutorial, quer para professores quer para alunos, etc.
Uma nota final para a importância
da avaliação externa como forma imprescindível de regulação. No entanto, não
entendo que só por existirem e serem muitos, os exames finais, só por si,
insisto, só por si, melhorem a qualidade. É como esperar que só por medir
muitas vezes a febre irá baixar. A qualidade é promovida considerando o que
escrevi em cima e regulada em termos globais pela avaliação externa que permite
análises necessárias, nacionais ou internacionais como, por exemplo, o TIMSS.
É com a escola, por dentro da
escola e integrado em sólidos projectos de autonomia e responsabilidade e com
recursos adequados que o caminho se constrói.
Sabemos tudo isto. Nada é novo.
Só falta um pequeno passo.
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