Na imprensa de hoje encontram-se duas referências ao ensino superior e de sinal contrário. Comecemos pela notícia mais positiva, com base em dados do Infocursos relativo a 2024, a Renascença divulga a existência de 45 cursos de Ensino Superior com taxa de desemprego zero. Neste grupo estão, entre outros, cursos de Enfermagem, Medicina, Química, Educação Básica e Segurança Informática em Redes de Computadores. É ainda relevante saber que existem 132 cursos superiores com desemprego abaixo do 1% sendo 107 ministrados em escolas públicas.
Do outro lado e, naturalmente, com
preocupação lemos no Eco, também de acordo com o Infocursos de 2024, que está a
subir a taxa desistência dos alunos do superior no final do primeiro ano. Em
22/23 á cada vez mais alunos a desistirem do ensino superior, após o primeiro
ano de curso. Em 2022/2023, a taxa de desistência dos estudantes de
licenciatura nestas circunstâncias era de 11,10% considerando a oferta de mais
de 6 mil cursos de 282 instituições de ensino superior. É o número mais elevado
dos últimos 8 anos e está a subir há quatro anos consecutivos
Lamentavelmente, a mesma
trajectória de desistência no final do primeiro ano
Verifica-se com os alunos de cursos
técnicos superiores profissionais revelando uma taxa de desistência de 26,9% em
2022/2023.
A estes indicadores não serão certamente
alheios os custos da frequência do ensino superior ou o “desencanto” com a
escolha.
Sabendo que a qualificação é um bem
de primeira necessidade e um forte contributo para projectos de vida
bem-sucedidos o abandono é sempre preocupante.
Temos assistido um aumento do
número de candidatos a bolsa, tal como em aumentado o número de estudantes que
entra no ensino superior. Também é reconhecido que se tem verificado perda de
rendimento de muitas famílias em consequência do impacto económico e social da
pandemia e dos tempso qua também agora se vivem.
No entanto, apesar destas dimensões
poderem constituir alguma justificação creio que importa não esquecer uma
questão de natureza estrutural, estudar no ensino superior é muito caro em
Portugal. Também a recente alteração do regulamento de atribuição de bolsas não
minimizou esta situação.
Algumas notas começando por alguns
dados que já aqui tenho citado.
De acordo com Relatório do CNE,
"Estado da Educação 2019", a percentagem de alunos que em Portugal
acede a bolsas de estudo para o 1º ciclo do superior está no segundo escalão
mais baixo da análise, entre 10 e 24,9%. Para comparação, Irlanda, Países
Baixos estão no intervalo entre 25% e 49,9% e a Suécia no superior a 75%.
Países como Espanha, França, Reino Unido e muitos outros têm percentagens de
alunos com apoio superiores a nós e, sem estranheza, também maior nível de
qualificação.
Em 2018 foi divulgado um estudo já
aqui citado, “O Custo dos Estudantes no Ensino Superior Português” da
responsabilidade do Instituto de Educação da U. de Lisboa, relativo ao ano
lectivo de 2015/2016 mostrando que cada estudante universitário gastou em média
6445€ em despesas como propinas, material escolar, alojamento ou alimentação.
Os alunos de instituições universitárias privadas têm uma despesa perto dos
10000€ e nos politécnicos privados o custo será de 8296€. De facto, sendo a
qualificação superior um bem de primeira necessidade para os cidadãos e para o
país, é um bem muito caro, demasiado caro para muitas famílias e indivíduos.
Estudos comparativos
internacionais, “Social and Economic Conditions of Student Life in Europe”, por
exemplo, também mostram que as famílias portuguesas são das que suportam uma
fatia maior dos custos de frequência do superior sendo que ainda se verifica
uma forte associação entre a frequência do ensino superior e nível de
escolarização e estatuto económico das famílias.
Apesar de um abaixamento do valor
as propinas no ensino público, as dificuldades sentidas por muitos estudantes
do ensino superior e respectivas famílias, quer no sistema público, quer no
sistema privado com valores bem mais altos de propinas, são, do meu ponto de
vista, consideradas frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas.
Tal entendimento parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é
um luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
A qualificação é a melhor forma de
promover desenvolvimento e cidadania de qualidade pelo que apesar de ser um bem
caro é imprescindível.
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