É com muita frequência que na imprensa surgem referências a “escutas”. Quase sempre estas referências produzem-se no âmbito de investigações no âmbito da justiça. É também frequente a discussão em torno do excesso de utilização, ou, pelo contrário, da necessidade da sua utilização como meio de investigação.
Na área em que me movo, a psicologia e mais em particular no
universo da educação, a “escuta” é percebida como um elemento central na intervenção
em diferentes contextos e com os diferentes intervenientes nos processos
educativos familiares e escolares.
Nesta perspectiva, continuo a entender que, por diversas
razões, se escuta de menos. Diria mesmo que enquanto sociedade e considerando
sobretudo os tempos actuais, apresentamos um sério problema de "surdez", não
escutamos. Aliás, poderemos até considerar que frequentemente revelamos o que
se chama uma surdez selectiva, só escutamos o que queremos. Vejamos alguns, só
alguns, dos nossos problemas de escuta.
Existem muitas pessoas cuja voz que ninguém escuta. Os
últimos tempos têm sido bem elucidativos sobre o não escutar da voz das
pessoas. É certo que muitas nem voz têm.
Escuta-se pouco os velhos sós, que vivem isolados e que
sobrevivem com pensões de miséria.
Continuo a achar que existem demasiados miúdos, adolescentes
ou jovens que, por mais alto que gritem, ninguém os escuta.
Sabemos dos milhares de crianças maltratadas e de mulheres
vítimas de violência a que damos pouca escuta.
É preciso escutar milhares de desempregados sem acesso a
subsídios de desemprego ou a outras formas de apoio.
E que dizer de milhares de jovens com dificuldades enormes
para entrar no mercado de trabalho e que vêem comprometida a possibilidade de
um projecto de vida.
A insensível e delinquente incapacidade de escuta dos
responsáveis por múltiplas áreas das políticas públicas, saúde, justiça, educação,
trabalho, etc.
De facto, contrariamente, às vozes que clamam contra a
existência ou o excesso de escutas, mantenho a convicção de que se escuta bem menos
do que devíamos.
Sem comentários:
Enviar um comentário