Com alguma perplexidade encontro no Público o seguinte título, “Gulbenkian e Ministério da Educação vão ensinar emoções aos professores”. Com base no trabalho desenvolvido pelas Academias Gulbenkian nas escolas desde há quatro anos, a Gulbenkian desenvolveu um programa de formação envolvendo a Universidade de Lisboa que se iniciará a partir de Janeiro com a formação de 200 formadores que, posteriormente, formarão professores e psicólogos que trabalham nas escolas com base na rede de centros de formação de professores.
Algumas notas sublinhando que não
está em causa a robustez científica da iniciativa da qual não quero duvidar.
Como sabe quem anda por estas
lidas, para além dos rigores do Inverno, as escolas são também geladas
emocionalmente, a generalidade dos professores não sabe lidar com emoções, tal
como alunos, os psicólogos e técnicos que estão nas escolas incluindo os
funcionários. Dito da maneira actual, não estão capacitados.
Percebe-se, assim, que nos
últimos tempos se tenha desencadeado uma onda de promoção, perdão, capacitação,
nas escolas através de imensos projectos e iniciativas de escala variável
visando o desenvolvimento da inteligência emocional, da empatia, da
Social-Emotional Learning (SEL) e outras designações.
É sempre importante registar o
esforço no âmbito da formação, aliás, capacitação, dos profissionais da
educação, mas, certamente por incompetência ou desconhecimento, vou sentindo
algumas reservas face a esta onda, quer pela visão mágica com que parece ser
informada, quer pela regular apresentação de um receituário ou programa que
garante que se vai aprender a fazer o que nunca foi feito nas escolas “lidar
com as emoções” independentemente da formulação. Dito isto, sublinho e não tenho
dúvidas que em muitas circunstâncias nos confrontamos com dificuldades neste
domínio que solicitam aapoio e ajuda.
As alterações nos estilos de
vida, nos valores sociais, culturais, económicos, etc., nos modelos de
desenvolvimento económico e consequente visão política, o risco associado às consequências de algumas políticas educativas parecem ter criado um tempo em que emerge a
necessidade de “trabalhar” as emoções nos contextos educativos.
Os climas sociais e de
aprendizagem em diferentes escolas e salas de aula nem sempre são
particularmente amigáveis para todos os alunos, como também não são para professores
como múltiplos estudos evidenciam.
Talvez tenhamos de reflectir
sobre isto e retomar coisas velhas, nada “inovadoras”, nada
"revolucionárias", nenhum “novo paradigma”. A educação escolar é
estruturada e alimentada pela relação e comunicação que, para que existam e sejam positivas, têm como ingrediente … a emoção. Nas minhas conversas por aí sobre
estas coisas da educação desafio muitas vezes pais ou professores a recordarem
muito brevemente professores de quem guardam boas memórias. Quando lhes
pergunto porquê, as justificações remetem muito significativamente para a
relação que com eles tiveram, para além do que com eles aprenderam das “coisas
da escola”. Por estranho que possa parecer há professores, muitos professores, que sabem lidar com as emoções, mas … aprender sempre.
Como dizia em cima, a educação
escolar, a acção do professor, tem esse princípio fundador, assenta na relação
que se operacionaliza na comunicação e se tempera com a emoção. Também por isso
são também preocupantes os tempos que vivemos em que os professores têm pouco
tempo para comunicar, para conversar com os alunos e as emoções, por vezes,
entram em turbulência e descontrolo.
Também a pressão para os
resultados, a natureza dos conteúdos e gestão curriculares ou o número de
alunos por turma por exemplo, dificultam essa relação. O professor “fala com o
programa”, a maioria dos alunos entende, outros não e com esses é preciso
falar, mas … para os mandar calar ou até sair. Há pouco tempo para conversar.
Por isso, tantas vezes afirmo que
os professores, tanto ou mais do que ensinar o que sabem, ensinam o que são. Como
disse acima, quando nos lembramos com ternura e admiração de alguns professores
é pelo que eles eram e nem sempre pelo que nos ensinaram apesar da importância
que tenha tido.
O Mestre João dos Santos quando
afirmava que alguém tinha sido seu professor justificava, "porque foi meu
amigo", traduzindo para uma linguagem mais actual, "estava capacitado
para gerir as minhas emoções, tinha empatia". São assim os professores que
nos marcaram de forma positiva.
Sendo certo que precisamos de
ajustamentos regulares no que fazemos, no como fazemos e para que fazemos, não
“inovemos” tanto, não queiramos tantos “novos paradigmas”, não
"mudemos" tudo pela ilusão mágica da mudança.
Criemos, apenas, o tempo e o modo
para que nas salas de aula os professores e os alunos, todos os alunos, tenham
o tempo e a circunstância que lhes permita comunicar, entre si, com a razão e
com a emoção. Irão aprender e ser.
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