quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

EDUCAÇÃO E EMOÇÃO (take 2)

 Com alguma perplexidade encontro no Público o seguinte título, “Gulbenkian e Ministério da Educação vão ensinar emoções aos professores”. Com base no trabalho desenvolvido pelas Academias Gulbenkian nas escolas desde há quatro anos, a Gulbenkian desenvolveu um programa de formação envolvendo a Universidade de Lisboa que se iniciará a partir de Janeiro com a formação de 200 formadores que, posteriormente, formarão professores e psicólogos que trabalham nas escolas com base na rede de centros de formação de professores.

Algumas notas sublinhando que não está em causa a robustez científica da iniciativa da qual não quero duvidar.

Como sabe quem anda por estas lidas, para além dos rigores do Inverno, as escolas são também geladas emocionalmente, a generalidade dos professores não sabe lidar com emoções, tal como alunos, os psicólogos e técnicos que estão nas escolas incluindo os funcionários. Dito da maneira actual, não estão capacitados.

Percebe-se, assim, que nos últimos tempos se tenha desencadeado uma onda de promoção, perdão, capacitação, nas escolas através de imensos projectos e iniciativas de escala variável visando o desenvolvimento da inteligência emocional, da empatia, da Social-Emotional Learning (SEL) e outras designações.

É sempre importante registar o esforço no âmbito da formação, aliás, capacitação, dos profissionais da educação, mas, certamente por incompetência ou desconhecimento, vou sentindo algumas reservas face a esta onda, quer pela visão mágica com que parece ser informada, quer pela regular apresentação de um receituário ou programa que garante que se vai aprender a fazer o que nunca foi feito nas escolas “lidar com as emoções” independentemente da formulação. Dito isto, sublinho e não tenho dúvidas que em muitas circunstâncias nos confrontamos com dificuldades neste domínio que solicitam aapoio e ajuda.

As alterações nos estilos de vida, nos valores sociais, culturais, económicos, etc., nos modelos de desenvolvimento económico e consequente visão política, o risco associado às consequências de algumas políticas educativas parecem ter criado um tempo em que emerge a necessidade de “trabalhar” as emoções nos contextos educativos.

Os climas sociais e de aprendizagem em diferentes escolas e salas de aula nem sempre são particularmente amigáveis para todos os alunos, como também não são para professores como múltiplos estudos evidenciam.

Talvez tenhamos de reflectir sobre isto e retomar coisas velhas, nada “inovadoras”, nada "revolucionárias", nenhum “novo paradigma”. A educação escolar é estruturada e alimentada pela relação e comunicação que, para que existam e sejam positivas, têm como ingrediente … a emoção. Nas minhas conversas por aí sobre estas coisas da educação desafio muitas vezes pais ou professores a recordarem muito brevemente professores de quem guardam boas memórias. Quando lhes pergunto porquê, as justificações remetem muito significativamente para a relação que com eles tiveram, para além do que com eles aprenderam das “coisas da escola”. Por estranho que possa parecer há professores, muitos professores, que sabem lidar com as emoções, mas … aprender sempre.

Como dizia em cima, a educação escolar, a acção do professor, tem esse princípio fundador, assenta na relação que se operacionaliza na comunicação e se tempera com a emoção. Também por isso são também preocupantes os tempos que vivemos em que os professores têm pouco tempo para comunicar, para conversar com os alunos e as emoções, por vezes, entram em turbulência e descontrolo.

Também a pressão para os resultados, a natureza dos conteúdos e gestão curriculares ou o número de alunos por turma por exemplo, dificultam essa relação. O professor “fala com o programa”, a maioria dos alunos entende, outros não e com esses é preciso falar, mas … para os mandar calar ou até sair. Há pouco tempo para conversar.

Por isso, tantas vezes afirmo que os professores, tanto ou mais do que ensinar o que sabem, ensinam o que são. Como disse acima, quando nos lembramos com ternura e admiração de alguns professores é pelo que eles eram e nem sempre pelo que nos ensinaram apesar da importância que tenha tido.

O Mestre João dos Santos quando afirmava que alguém tinha sido seu professor justificava, "porque foi meu amigo", traduzindo para uma linguagem mais actual, "estava capacitado para gerir as minhas emoções, tinha empatia". São assim os professores que nos marcaram de forma positiva.

Sendo certo que precisamos de ajustamentos regulares no que fazemos, no como fazemos e para que fazemos, não “inovemos” tanto, não queiramos tantos “novos paradigmas”, não "mudemos" tudo pela ilusão mágica da mudança.

Criemos, apenas, o tempo e o modo para que nas salas de aula os professores e os alunos, todos os alunos, tenham o tempo e a circunstância que lhes permita comunicar, entre si, com a razão e com a emoção. Irão aprender e ser.

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