O Público tem em desenvolvimento um conjunto de iniciativas envolvendo alunos e professores de diferentes escolas com o objectivo global de promover a literacia mediática, considerando e bem a importância que a informação e o seu consumo criterioso e auto-regulado têm nas sociedades actuais.
No entanto, esta iniciativa que, reafirmo, me parece
positiva, leva-me a algumas notas.
De há uns anos para cá tem vindo a engordar, a engordar, e regularmente continuam a surgir iniciativas para desenvolver, claro, na escola.
É verdade que os alunos, passam, muitos deles, oito, dez horas,
por vezes mais, na escola cumprindo o equívoco de uma Escola a Tempo Inteiro. Em resposta às necessidades das famílias de guarda das crianças em horário
laboral parece mais fácil alongar o tempo escolar.
Não está, evidentemente, em discussão a importância de que a
educação de crianças e jovens envolva as diversas questões presentes na vida das
comunidades, agora exemplificadas pela mobilidade autónoma e sustentável, antes
pelo contrário. A questão é que haver uma tendência que suscita reservas de que
a escola resolve. Não, não a escola não resolve tudo.
Por diversas ocasiões tenho manifestado a minha reserva face
ao entendimento de que tudo o que de alguma forma possa envolver os mais novos
e a sua formação deva ser ensinado/trabalhado na escola. Esta visão obesa da
escola não funciona, nem tudo pode ou deve ser transformado em disciplinas,
conteúdos escolares, projectos, … para além de que a escola tem um conjunto de
funções incontornáveis que tornam finita a sua capacidade de responder. Sabemos,
aliás, as dificuldades que a escolas e os professores sentem no cumprimento
dessas funções.
Sabemos que, independentemente das opções e visões
ideológicas, uma das questões que no universo da educação estarão sempre em
aberto é a que envolve os conteúdos e organização curricular. De facto, a
velocidade de produção e acesso ao conhecimento e ao desenvolvimento, as
mudanças nos sistemas e no quadro de valores das comunidades determinam a
regular reflexão e ajustamento sobre o que a escola deve ensinar e trabalhar,
sobretudo durante a escolaridade obrigatória.
Por outro lado, o tempo da escola e a competência da escola
são finitos, isto é, a escola não tem tempo nem pode ou deve ensinar tudo.
Lembram-se certamente das discussões sobre se matérias como educação sexual,
educação cívica, literacia financeira, educação para a saúde, para citar apenas
alguns exemplos, deverão, ou não, constituir-se como "disciplinas",
conteúdos ou mesmo se devem integrar os currículos escolares.
E acontece que perdemos a conta de planos, projectos,
programas, experiências inovadoras que chegam às escolas para a educação
científica, aprendizagem emocional, promover a expressão artística e a
criatividade, promover comportamentos saudáveis e actividades desportivas,
literacia financeira e também a mediática, promover a inovação e as novas
tecnologias, aprender a andar de bicicleta, para não falar de iniciativas mais
"alternativas", por assim dizer, e que têm poderes mágicos, parece. A
lista enunciada é apenas exemplificativa.
Em princípio, independentemente dos conteúdos poderem ser
mais ou menos pertinentes, vejo sempre com alguma reserva as propostas de
introdução de mais uma disciplina, mais conteúdos, mais um manual, mais umas
orientações, mais um programa de formação, perdão, de capacitação, de
professores, como se a escola, o currículo escolar, os conteúdos, as suas
competências, pudessem continuar a engordar indefinidamente. E não se trata de
um problema de recursos ainda que seja de considerar.
Como é evidente, pode dizer-se sempre que muitas destas
questões podem integrar o trabalho escolar considerando até que os alunos
passam um tempo imenso, diria excessivo, nas escolas. Aliás, tal acontece em
muitas escolas e agrupamentos.
A questão central, do meu ponto de vista, é que as
competências da escola, os conteúdos que nela são trabalhados, integrando ou
não formalmente os currículos, não podem mesmo aumentar continuamente. Urge uma
reflexão serena, participada e com tempo sobre o ajustamento dos conteúdos, a
sua integração e organização, a forma como podem acomodar a diversidade dos
alunos e a necessidade de diferenciação dos professores, a formação global dos
alunos e não exclusivamente a promoção de competências instrumentais, etc.
Somar conteúdos e competências à escola sem ajustamento dos
conteúdos e organização existentes, pode promover problemas e não soluções, de
tanto que lhe exigem corre risco de não providenciar o que lhe compete.
Na verdade, nem tudo o que pode ser interessante ou
importante saber ou conhecer terá de caber numa disciplina ou num conteúdo
escolar e nem tudo o que se pode saber e conhecer se aprende na escola.
Tenho uma visão da escola centrada no TODO do aluno, mas não
no "ensino" do TUDO que o aluno deve saber ou conhecer.
A questão é que os alunos estão muito tempo na escola e
a tentação é óbvia e grande, a escola que faça.
Sem comentários:
Enviar um comentário