Não é nada de novo, mas é preciso insistir. De acordo com dados relativos a 19/20 agora divulgados pela Direcção Geral de Estatísticas da Educação a retenção dos alunos não tem impacto significativo no seu sucesso.
Considerando o desempenho dos alunos que entraram em
2017/2018 nos cursos científico-humanísticos e no ensino profissional, verifica-se
que a idade de entrada no secundário está associada ao trajecto futuro. Nos cursos
científico-humanísticos, 75% dos alunos que ingressaram com 15 anos ou menos (trajectos
sem retenções) concluíram o secundário no prazo esperado, três anos. Dos que
entraram com 16 anos (uma retenção), apenas 44% concluíram em três anos e dos
que entraram com 18 ou mais apenas 20% concluíram sendo que destes 38%
desistiram de estudar.
No ensino profissional o quadro é semelhante. Dos alunos que
entraram nos cursos com 15 anos ou menos, 80% concluíram em três anos, com 16
anos concluíram 66% e com 18anos ou mais concluíram 37%.
Como tantas vezes aqui tenho escrito e bordado em contextos
profissionais, a questão da retenção dos alunos, o chumbo, está permanentemente
em discussão e sujeita a uma imensidade de opiniões, visões e equívocos, quase
sempre esquecendo a evidência conhecida.
Em 2018 o CNE divulgou o Relatório “Estado da Educação,
2017” com indicadores analisados em parceria com a Fundação Francisco Manuel
dos Santos no âmbito do Projecto aQeduto incluindo numa vertente económica. Em
termos económicos e recorrendo aos estudos já desenvolvidos o impacto económico
da retenção era estimado em cerca de 6000€ por aluno em cada ano.
Adaptando o modelo desenvolvido pela Education Endowment Foundation, o Projecto aQeduto identificou o grau de eficácia e custo económico de um elenco de medidas de combate ao insucesso. Das medidas analisadas, a retenção tem o custo mais elevado e a eficiência é negativa, promove um atraso de 4 meses. Ensinar a estudar é a medida mais económica, 87€, e mais eficiente, promove um ganho de 8 meses de aprendizagem.
Estes dados são importantes, mas a sua substância não é nova.
Recordo que no Relatório “Low-Performing Students - Why They
FallBehind and How To Help Them Succeed” divulgado pela OCDE em 2017 se
evidencia que o “chumbo”, a retenção, é para os alunos portugueses o principal
factor de risco para os resultados na avaliação posterior, dito de outra
maneira, os alunos chumbam … mas não melhoram.
De facto, definitivamente, não adianta discutir se o chumbo
transforma o insucesso em sucesso. Não transforma, repetir só por repetir não
produz sucesso, aliás gera mais insucesso conforme os estudos mostram.
Confesso sempre alguma surpresa e dificuldade em compreender
quando ao discutir-se os efeitos pouco positivos da retenção algumas vozes,
mesmo dentro do universo da educação, clamam que se está a promover o
"facilitismo" ou a defender que "então passam sem saber". A
leitura das caixas de comentários às notícias sobre estas questões é
elucidativa.
Nesta conformidade e do meu ponto de vista, a questão
central não é o chumba, não chumba, e quais os critérios ou o número de exames,
mas sim que tipo de apoios, que medidas e recursos devem estar disponíveis para
alunos, professores e famílias desde o início da percepção de dificuldades com
o objectivo de evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo.
Este discurso não tem rigorosamente a ver com
"facilitismo" e, muito menos, com melhoria "administrativa"
das estatísticas da educação, uma tentação a que nem sempre se resiste. Pelo
contrário, “facilitismo” é acreditar que a retenção resolve o problema do
insucesso. Por outro lado, a eventual “passagem sem saber” apenas adia o
insucesso que fica mais difícil de porque acumula dificuldades.
É essencial promover e tornar acessíveis a alunos,
professores e famílias apoios e recursos adequados e competentes de forma a
evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo. É fundamental não
esquecer que o insucesso continua a atingir fundamentalmente os alunos oriundos
de famílias com pior condição económica e social pelo que inibe o objectivo da
mobilidade social. A associação entre o insucesso e a pobreza em Portugal é,
aliás, a mais forte entre os países europeus. Em Portugal os bons alunos são os
que mais trabalham em casa, TPC e explicações, dado a que, evidentemente, não é
alheio ao nível de escolaridade dos pais e ao estatuto económico. É necessário
também diversificar percursos de formação com diferentes modelos curriculares e
carga lectiva finalizando sempre com algum tipo formação profissional. Esta
diferenciação não deve acontecer em idades precoces criando percursos
irreversíveis de "segunda" para os "sem jeito para a
escola" e "preguiçosos".
A qualidade promove-se, é certo e deve sublinhar-se, com a
avaliação rigorosa e regular das aprendizagens, sim, naturalmente, mas também
com a avaliação do trabalho dos professores, com a definição de currículos
adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores
eficazes e suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem
um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados e reais de
autonomia, organização e funcionamento desburocratizado das escolas, com a
definição de objectivos de curto e médio prazo, etc.
É o que acontece, genericamente, nos países com mais baixas
taxas de retenção escolar.
É o que tarda em acontecer de forma consistente em Portugal.
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