A propósito de uma conversa que há dias tive com o meu neto
Simão (ele chama-lhes conversetas) sobre os desenhos que faz e dos discursos
que vou ouvindo sobre diversidade, criatividade, inovação, etc. e da forma como
muitas vezes ainda se aprecia o que as crianças pequenas realizam, lembrei-me
de Almada Negreiros num texto que, aliás, já por aqui passou.
“Pede-se a uma criança. Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel
e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais
ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas
numa direcção, outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas
mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas
que o papel quase que não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já
era demais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: Uma
flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma
flor!
Contudo a palavra flor andou por dentro da criança, da
cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que
se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas.
Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas, são aquelas as linhas com
que Deus faz uma flor!”
Obras Completas, 4, Poesia
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